Acórdão nº 00146/04.6BEPNF de Tribunal Central Administrativo Norte, 19 de Agosto de 2004 (caso NULL)
Magistrado Responsável | Dr. Carlos Lu |
Data da Resolução | 19 de Agosto de 2004 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.
RELATÓRIO …, advogado, com o n.º fiscal …., residente na Rua da Constituição n.º …, …º E, Porto, inconformado veio interpor recurso jurisdicional da sentença do TAF de Penafiel, datada de 25/05/2004, que indeferiu a providência cautelar de suspensão de eficácia relativa ao acto de declaração de utilidade pública ou pelo menos, se assim não for entendido, a suspensão da tomada de posse administrativa sobre a parcela de terreno nela inserta contida na Declaração n.º 39/2004, publicada no D.R. II Série, n.º 52, de 02/03/2004, da autoria de S.ª Ex.ª o Secretário de Estado da Administração Local e requerida pela Câmara Municipal de Lousada, que o mesmo havia instaurado contra os aqui recorridos “MINISTÉRIO DAS CIDADES, ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E AMBIENTE (M.C.O.T.A.)” – representado por “S.ª Ex.ª o SECRETÁRIO DE ESTADO DA ADMINISTRAÇÃO LOCAL” (S.E.A.L.) e “CÂMARA MUNICIPAL DE LOUSADA” (C.M.L.), sendo esta enquanto contra-interesssada.
Formula, nas respectivas alegações (cfr. fls. 170 e segs.), as seguintes conclusões: “(...) 1- A parcela expropriada foi objecto de um pleito judicial onde se considerou que «não tinha especial ou considerável relevância para a realização de interesses colectivos, pelo que não deve ser qualificada a utilidade proporcionada pelo referido caminho como verdadeira utilidade pública».
2 - A aquisição da dominialidade pública pode resultar de um acto administrativo quando se destine a satisfazer interesses colectivos de certo grau ou relevância.
3 - Considerou o Poder Judicial que a relevância da parcela ora expropriada «se traduzia num pequeno encurtamento de distâncias (cerca de 300 metros) entre a EN 207 e o Lugar do Souto, com a Rua Nova, a Escola, o Campo de Futebol e a Igreja, quando é facto que existe Estrada ou Rua a servir essas ligações».
4 - Considerou ainda o Poder Judicial que «seguindo o referido caminho pelo interior da Mata do Vassoural, não se vê que existisse nele qualquer vantagem para a sua travessia pelas crianças que, vindas do outro extremo do caminho, se destinavam à Escola, tendo de atravessar a referida propriedade, ficando assim muito mais expostos a perigos, e também não se consegue ver que especial relevância teria esse caminho para os adultos que nas suas deslocações para a Igreja ou Campo de Futebol dada a existência de via alternativa pública, a Poente da referida Mata, e quase que a circundando, que não fosse o simples encurtamento de uma distância facilmente vencível pela sua pequenez, no calcorreamento dos citados destinos, que normalmente só acontecem quando há cerimónias litúrgicas na Igreja ou jogo de futebol».
5 - Porque o Poder Judicial decidiu como decidiu a Câmara Municipal, sob proposta da Junta de Freguesia, logo poucos meses, após o trânsito em julgado do Acórdão do STJ, porque o tal caminho foi considerado «judicialmente um atravessadouro e não um caminho público», e porque entendeu que o caminho «constitui um rápido e fácil acesso a pontos nevrálgicos da Freguesia de Nogueira, como o Infantário, a Escola Primária, à Sede da Junta de Freguesia à Igreja e ao Parque de Jogos» (Deliberação Camarária de 02/07/01), que se encontravam justificados os parâmetros da utilidade pública».
6 - A deliberação expropriativa ofende o «caso julgado» pois os pressupostos da declaração expropriativa são exactamente os mesmos que o Poder Judicial considera irrelevantes para a realização de interesses colectivos. Esses pressupostos integram o caso julgado como é uniformemente reconhecido pelo Supremo Tribunal de Justiça, pelo que a Declaração de Utilidade Pública sofre do vício de desvio de poder.
7 - A sentença recorrida viola os arts. 500º e 673º do Código do Processo Civil e consequentemente a Constituição Portuguesa pelo que é inconstitucional.
8 - No procedimento administrativo as Informações Técnicas 49/DSJ de 09/06/2003 e 1/DSJ de 20/01/2004, que servem de fundamentação à Declaração de Utilidade Pública n.° 39/2004 (2ª S) estão em contradição com a I.T n.° 232/DSJ de 01/11/2001, pois enquanto esta propunha o indeferimento aquelas outras propunham o contrário, pelo que a autoridade decidente teria de explicar as razões porque concordava com uma e não com a outra das opiniões anteriormente expressas pelos serviços.
9 - Porque o Secretário de Estado da Administração Local se limitou a concordar com as informações 49/DSJ e 1/DSJ subsiste a dúvida acerca da existência de um pressuposto do acto pelo que este não pode considerar-se suficientemente fundamentado, como é doutrina do Tribunal Pleno.
10 - Assim o despacho do Secretário de Estado da Administração Local padece de vício de forma o que o torna anulável, por violação do n.°1 do art. 13º do Código das Expropriações.
11 - A devassa da vinha, resultante da abertura à circulação rodoviária da parcela de terreno expropriada, bem como o risco de furto da produção da vinha que são prejuízos hipoteticamente onerantes resultam evidentemente acrescidos pela demora do processo principal na medida em que a concretização da solução indemnizatória (v.g., a obrigação da entidade expropriante ter de construir vedações ao longo do caminho) está dependente da solução do pleito.” Conclui no sentido da revogação da decisão recorrida e deferimento das requeridas providências cautelares.
Os entes demandados, ora recorridos, apresentaram contra-alegações (cfr. fls. 215 e segs. e fls. 203 e segs.) nas quais formulam, respectivamente, as seguintes conclusões: A) O ente requerido “M.C.O.T.A.” representado por “S.ª Ex.ª o S.E.A.L.” nos termos seguintes: “(...) 1ª - Não há caso julgado anterior relevante; 2ª - A DUP encontra-se devidamente fundamentada e sem vícios, nomeadamente desvio de poder; 3ª - Contra o que se afirma na conclusão anterior, o Recorrente nada prova. (...).” B) A requerida contra-interessada “C.M.L.” nos termos seguintes: “(...) - As decisões judiciais não visaram, nem podiam, impediam uma futura expropriação.
(...) - Não se apreciou conforme resulta do extracto do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (doc. 1 em anexo), a utilidade pública, em causa, mas simplesmente se o referido caminho, configurava um caminho público ou um atravessadouro, discutindo-se assim, a dominialidade, público ou privado.
(...) - Pelo que, não se pode falar em violação de caso julgado.
(...) - A declaração de Utilidade Pública encontra-se nos termos anteriormente referenciados, e que aqui se dão por reproduzidos, devidamente fundamentada e sem vícios. (...).” Concluem ambos no sentido de que deve ser mantida a decisão sob recurso por improvimento deste.
O Ministério Público (MºPº) junto deste Tribunal notificado nos termos e para efeitos do disposto nos arts. 146º e 147º ambos do CPTA nada veio requerer ou declarar decorrido o prazo legal de que dispunha para o efeito.
Sem vistos, dado o disposto no art. 36º, n.ºs 1, al. e) e 2 do CPTA, foi o processo submetido à Conferência para julgamento.
*2.
DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo recorrente, sendo certo que, pese embora por um lado, o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos arts. 660º, n.º 2, 664º, 684º, n.ºs 3 e 4 e 690º, n.º 1 todos do Código de Processo Civil (CPC) “ex vi” art. 140º do CPTA, temos, todavia, que, por outro lado, nos termos do art. 149º do CPTA o tribunal de recurso em sede de recurso de apelação não se limita a cassar a sentença recorrida, porquanto ainda que declare nula a sentença decide “sempre o objecto da causa, conhecendo de facto e de direito”, pelo que os recursos jurisdicionais são “recursos de ‘reexame’ e não meros recurso de ‘revisão’” (cfr. Prof. J. C. Vieira de Andrade in: “A Justiça Administrativa (Lições)”, 4ª edição, pág. 391).
As questões suscitadas pelo recorrente resumem-se, em suma, a determinar se na situação vertente estão preenchidos os pressupostos ou requisitos enunciados no art. 120º do CPTA para o decretamento da providência e, nessa medida, ocorreu violação do n.º 1, als. a) e b) do citado normativo, bem como dos arts. 500º e 673º ambos do CPC e art. 13º, n.º 1 do C.E. [cfr. conclusões supra reproduzidas e alegações de recurso produzidas nos autos].
*3.
FUNDAMENTOS 3.1.
DE FACTO Da decisão recorrida, que nesta sede não foi objecto de qualquer impugnação pelas partes, mostra-se apurada a seguinte factualidade: --- I) O A. é dono e legítimo possuidor do prédio rústico denominado “Mata do Vassoural”, sito na freguesia de Nogueira, Lousada, descrito na matriz predial rústica sob o art. ….
II) Em 1994 o A., invocando violação do direito de propriedade, intentou acção declarativa ordinária contra a Junta de Freguesia de Nogueira pedindo o reconhecimento dos seus direitos de marcação, tapagem e vedação da sua propriedade, de plantar vides ou árvores onde entendesse e de impedir a entrada de terceiros.
III) A Ré deduziu reconvenção, onde pediu o reconhecimento da publicidade de caminho existente na parte em que se processa junto à Mata do Vassoural e a condenação do autor a abster-se da prática de actos que colocassem em causa a sua plena utilização pelo público.
IV) A acção foi, em 98/06/23, julgada parcialmente procedente quanto ao pedido inicial e inteiramente procedente quanto ao pedido reconvencional entendendo que o caminho existente era um caminho público.
-
O A. interpôs recurso para o Tribunal da Relação do Porto, discordando da natureza e regime jurídico da parte do caminho posto em crise na acção, isto é, da distinção entre caminhos públicos e atravessadouros.
VI) O Tribunal da Relação, revogando a decisão anterior quanto ao pedido reconvencional, considerou, por acórdão de 99/12/17, que o referido caminho deveria ser classificado como simples atalho ou atravessadouro.
VII) Dessa decisão interpôs a Junta de Freguesia de Nogueira recurso para o Supremo Tribunal de Justiça discordando da...
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