Acórdão nº 00991/04.2BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 30 de Junho de 2005 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelDr. Carlos Lu
Data da Resolução30 de Junho de 2005
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO J…, casado, técnica superior da Câmara Municipal de Lamego, residente na Quinta de S. Vicente, Lote … …, R/c - …., Lamego, inconformado veio interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF de Viseu, datada de 08/03/2005, que indeferiu a providência cautelar deduzida contra o “MUNICÍPIO DE LAMEGO”, na qual era peticionada a suspensão de eficácia da deliberação da Câmara Municipal de Lamego de 12/07/2004 que na sequência de processo disciplinar aplicou ao mesmo a pena disciplinar de demissão.

Formula, nas respectivas alegações (cfr. fls. 450 e segs.

), as seguintes conclusões que se reproduzem: “(...) I - A sentença recorrida dá como verificado o requisito positivo do periculum in mora e o requisito negativo da ausência de manifesta ilegalidade na interposição do recurso.

II - A existência desses dois requisitos justifica que seja concedida, em princípio, a suspensão da eficácia.

III - Já que o direito a uma tutela cautelar efectiva, susceptível de afastar os efeitos irreparáveis da decisão tardia do processo principal, tem natureza garantística de dignidade constitucional.

IV - Só podendo ser recusada a providência se se lhe opuserem relevantes valores de interesse público, também de natureza constitucional.

V - Neste processo cautelar, são irrelevantes as posições das partes quanto aos factos do fundo da causa e quanto à ilegalidade do acto impugnado.

VI - Não é da natureza da sanção disciplinar de demissão a improcedência do pedido de suspensão de eficácia, dependendo a procedência deste apenas da prova relevante produzida no processo cautelar.

VII - A sanção expulsiva e os factos que lhe estão na base conduzem ao prognóstico de que os rendimentos residuais do Recorrente como profissional liberal e formador diminuirão de forma drástica, dada a sua conexão com as funções autárquicas que o mesmo exercia.

VIII - Ao considerar que tais rendimentos, ao invés de baixarem, têm possibilidade de crescer, a douta sentença faz errada interpretação da matéria de facto, violando o art. 120º, 1. b), 1ª parte do C.P.T.A.

IX - Disposição que é igualmente violada pela sentença ao relativizar a irreparabilidade dos danos, no pressuposto de que o facto de o processo principal se encontrar na fase final dos articulados prenuncia a sua rápida decisão final.

X - Quando é do conhecimento geral que, dado o referido estado do processo, um prazo de um ano até essa decisão é uma perspectiva excessivamente optimista.

XI - O reembolso efectuado pelo Recorrente dos valores apurados pela Câmara como objecto de apropriação, além dos juros pela mesma Recorrida calculados, eliminando qualquer prejuízo para a autarquia como efeito da acção do Recorrente, atenua de forma significativa a censurabilidade da sua conduta e os eventuais efeitos em terceiros do seu regresso à Câmara Recorrida.

XII - Produzindo por si o efeito de prevenção geral associado à decisão punitiva.

XIII - A difusão pública dos factos objecto do processo disciplinar foi promovida pela autarquia, não sendo legítimo, como o fez a sentença, penalizar objectivamente o Recorrente por facto desnecessário e imputável à Recorrida.

XIV - A sentença violou, assim, por erro de aplicação, o art. 120º, 2 do C.P.T.A. .

XV - Por outro lado, o facto de os funcionários da Recorrida evitarem encontrar-se com o Recorrente quando este, legitimamente, se apresentou ao serviço, não releva de interesse público contra o Recorrente, mas contra os funcionários.

XVI - Que não podem deixar de se relacionar, por razões de serviço, com todos os demais funcionários, incluindo o Recorrente.

XVII - Ao valorar contra o Recorrente essa conduta, a sentença violou, por erro de aplicação, o referido art. 120º, 2 do C.P.T.A. .

XVIII - A medida de coacção determinada ao Recorrente pelo tribunal criminal deve ser interpretada em conexão com a possibilidade de o mesmo poder reproduzir os factos constantes do processo disciplinar quanto à apropriação de valores, e para prevenir esse risco.

XIX - O que não impede o Recorrente de exercer em plenitude as funções correspondentes à sua categoria de técnico superior.

XX - O que fez, aliás, na vigência da medida de coação, e até à decisão expulsiva.

XXI - O periculum in mora dado como existente no presente processo traduz-se ao nível da própria subsistência física do Recorrente e sua família.

XXII - Pelo que, ao considerar prevalecente o interesse público de manutenção provisória da decisão expulsiva, a sentença operou nova violação do art. 120º, 2 do C.P.T.A., bem como dos artºs 20º, 5 e 268º, 4 da Constituição.

(…).” Termina concluindo no sentido de que deve “(…) o presente recurso jurisdicional merecer provimento, revogando-se a decisão de 1ª instância e ordenando-se desde já a suspensão da eficácia da decisão disciplinar de demissão do Recorrente (…).” O ente público demandado, ora recorrido, apresentou contra-alegações (cfr. fls. 467 e segs.

) nas quais sustenta a total improcedência das conclusões e argumentação do recorrente, pugnando, em suma, pela manutenção ou confirmação do julgado.

O Ministério Público (MºPº) junto deste Tribunal notificado nos termos e para efeitos do disposto nos arts.146º e 147º ambos do CPTA veio a apresentar parecer no qual sustenta a improcedência do recurso jurisdicional (cfr. fls. 498 e 499), parecer este que notificado às partes não foi objecto de qualquer tomada de posição.

Sem vistos, dado o disposto no art. 36º, n.ºs 1, al. e) e 2 do CPTA, foi o processo submetido à Conferência para julgamento.

*2.

DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo recorrente, sendo certo que, pese embora por um lado, o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos arts. 660º, n.º 2, 664º, 684º, n.ºs 3 e 4 e 690º, n.º 1 todos do Código de Processo Civil (CPC) “ex vi” art. 140º do CPTA, temos, todavia, que, por outro lado, nos termos do art. 149º do CPTA o tribunal de recurso em sede de recurso de apelação não se limita a cassar a sentença recorrida, porquanto ainda que declare nula a sentença decide “sempre o objecto da causa, conhecendo de facto e de direito”, pelo que os recursos jurisdicionais são “recursos de ‘reexame’ e não meros recursos de ‘revisão’” (cfr. Prof. J. C. Vieira de Andrade in: “A Justiça Administrativa (Lições)”, 6ª edição, págs. 420 e segs.; Prof. M. Aroso de Almeida e Dr. C. A. Fernandes Cadilha in: “Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos”, pág. 737, nota 1).

As questões suscitadas resumem-se, em suma, em determinar se na situação vertente a decisão recorrida ao indeferir a providência cautelar peticionada violou ou não o disposto nos arts. 120º, n.ºs 1, al. b) 1ª parte e 2 do CPTA, 20º, n.º 5 e 268º, n.º 4 da CRP [cfr. conclusões supra reproduzidas].

*3.

FUNDAMENTOS 3.1.

DE FACTO Resulta da decisão recorrida como assente a seguinte factualidade: I) O Requerente é licenciado em Economia; II) Pertence à carreira de técnico superior, tendo, sido provido, em regime de nomeação definitiva, no lugar de Técnico Superior Principal – Área Financeira, na Câmara Municipal de Vila Pouca de Aguiar; III) Em 02/12/02, é nomeado, em regime de substituição, Director do Departamento Administrativo Câmara Municipal de Lamego; IV) Desde há anos que exerce, a tempo parcial, a profissão liberal de liquidatário judicial, dando formação profissional; V) Na sequência de Processo Disciplinar instaurado com base na participação efectuada em 13/02/04 pela Chefe de Repartição de Finanças e Património da Câmara Municipal de Lamego, em 12 de Julho de 2004, a Câmara Municipal de Lamego, em reunião ordinária, deliberou por unanimidade aplicar ao Requerente a pena disciplinar de demissão com os fundamentos constantes do doc. n.° 1 junto com a p.i.; VI) Em 13/07/2004, o Requerente foi notificado da referida deliberação; VII) Consta do ponto VII.8 da acusação que “O esquema montado pelo arguido exigia um exercício quotidiano, que escrupulosamente cumpria, como... o demonstram os procedimentos que mantinha em curso, em vários níveis de desenvolvimento....e quando já havia subtraído aos cofres da Câmara a quantia de 225.459,39 para adicionar à sua conta pessoal” – cfr. doc. n.º 3 junto com a p.i; VIII) Consta do ponto II.88 do Relatório Final do processo disciplinar identificado supra que: “... o arguido servia-se a si próprio com os dinheiros municipais à custa de procedimentos de despesa que ficcionava e aos quais conferia uma aparência legal em prejuízo de terceiros, verdadeiros credores (fornecedores, prestadores de serviços e empreiteiros), forçados a aguardar prolongadamente os pagamentos a que tinham pleno direito, convertidos, por conseguinte, em vítimas reais da parcialidade com que aquele pautava a sua conduta” – cfr. doc. n.º 1 junto com a oposição; IX) Consta do ponto II.89 do referido Relatório Final que: “Não pode, pois, desvincular-se a actuação seguida pelo arguido de uma relação extra-administração, porquanto a mesma interagiu directamente com terceiros, administrados, cujos legítimos direitos eram sistematicamente sobrepujados pelos interesses de que aquele facciosamente se investira”; X) O Requerente efectuou o reembolso integral da quantia apropriada de 225.459,39, acrescida dos respectivos juros; XI) O Requerente é arguido no processo criminal n.° 83/04.4TALMG, do Tribunal de Lamego que se encontra em fase de inquérito; XII) No referido processo, o Requerente foi sujeito à medida de coacção de proibição de quaisquer funções na área da economia, decorrente dos factos que foram objecto do processo disciplinar; XIII) O Requerente deduziu o incidente de suspeição do instrutor do processo disciplinar com o fundamento geral de, ao ler a acusação ter verificado, com surpresa, “existir uma profunda e indisfarçada hostilidade do instrutor em relação ''a si próprio....” “quer pelo estilo...

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