Acórdão nº 00303/04.5BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 10 de Março de 2005 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelDr. Carlos Lu
Data da Resolução10 de Março de 2005
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO C…, residente em Alfândega da Fé, inconformado veio interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF de Mirandela, datada de 11/11/2004, que indeferiu o pedido cautelar de intimação para um comportamento que o mesmo havia deduzido nos termos do art. 112º, n.º 2, al. f) do CPTA contra a “CÂMARA MUNICIPAL DE ALFÂNDEGA DA FÉ” e o “Sr. PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL DE ALFÂNDEGA DA FÉ”, ambos sediados na Praça do Município, Alfândega da Fé, e no qual peticionava que estes fossem condenados a atribuir ao requerente o exercício efectivo de funções correspondentes à sua carreira e categoria profissional e a pagarem uma sanção pecuniária compulsória, por cada dias que não seja cumprida a ordem ou sentença judicial decretada num valor nunca inferior a € 100,00. Formula, nas respectivas alegações (cfr. fls. 93 e segs.

), as seguintes conclusões que se reproduzem: “(...) A) O douto despacho recorrido é ilegal, pois viola o disposto no artigo 112, n.º 1 e 120, n.º 1 do CPTA, devendo ser revogado; B) Nem o requerente precisaria de invocar porque só agora é que a sentença a proferir no processo principal perderia a sua utilidade.

  1. Já que tal ilação decorre dos factos alegados pelo requerente; D) Isto é, a utilidade da sentença nestes autos, ressalta do facto de após o seu decretamento (urgente) a mesma ter utilidade de imediato e para o futuro após a sua prolação; E) E quanto mais tarde ela for decretada, mais prejuízos o requerente tem de suportar; F) É certo que o requerente alegou, que não lhe estão distribuídas funções desde Janeiro de 2002, tendo também alegado que tentou resolver a sua situação extrajudicialmente conforme se conclui inclusive dos documentos (acta) junto pelos requeridos; G) Isto é só agora o requerente pretende cautelarmente reivindicar o seu direito, nem se vislumbra onde isso contende com o facto da utilidade da sentença -( para o futuro); H) Ou seja, se o requerente não intentasse a presente providência e só avançasse com a acção declarativa iria continuar: I) A cumprir o seu horário de trabalho, sentando-se no dito armazém, ou ali deambulando inactivo, durante dias a fio, sem ninguém lhe dirigir a palavra, ou ordenar o exercício de quaisquer funções; J) A andar irritado, abatido, nervoso, desorientado, devido ao esvaziamento completo e sem justificação do seu conteúdo funcional; L) Continuando tudo a ser conhecido dos restantes funcionários e utilizadores dos serviços da C M Alfândega da Fé, M) Continuando pois a sofrer tais danos à espera (anos) de uma sentença que lhe reconhecesse o seu direito à ocupação efectiva, e de que não lhe serviria relativamente ao lapso de tempo entretanto decorrido, quanto a esse direito; N) A execução da sentença declarativa se procedente, não reconstituiria a sua situação de violação da ocupação efectiva de modo retroactivo, traduzindo-se em prejuízo de difícil reparação - cfr art. 120, n.º 1, alín. b) do CPTA; O) Aliás e depois do presente requerimento o mesmo meteu baixa médico, devido ao agravamento da sua situação onde se constata que sofre de depressão; P) O requerente pretende pois garantir e assegurar a utilidade da sentença a proferir – cfr. art. 112º n.º 1 do CPTA - evitando assim a continuação dos danos que alega; (…).” Conclui no sentido da revogação da sentença.

Os entes públicos demandados, ora recorridos, não apresentaram contra-alegações (cfr. fls. 79 e segs.

).

O Ministério Público (MºPº) junto deste Tribunal notificado nos termos e para efeitos do disposto nos arts.146º e 147º ambos do CPTA veio apresentar parecer no sentido da improcedência do recurso jurisdicional (cfr. fls. 101 e segs.

).

Notificadas as partes daquele posicionamento do MºPº as mesmas nada vieram requerer ou declarar (cfr. fls. 106 e segs.

).

Sem vistos, dado o disposto no art. 36º, n.ºs 1, al. e) e 2 do CPTA, foi o processo submetido à Conferência para julgamento.

*2.

DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo recorrente, sendo certo que, pese embora por um lado, o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos arts. 660º, n.º 2, 664º, 684º, n.ºs 3 e 4 e 690º, n.º 1 todos do Código de Processo Civil (CPC) “ex vi” art. 140º do CPTA, temos, todavia, que, por outro lado, nos termos do art. 149º do CPTA o tribunal de recurso em sede de recurso de apelação não se limita a cassar a sentença recorrida, porquanto ainda que declare nula a sentença decide “sempre o objecto da causa, conhecendo de facto e de direito”, pelo que os recursos jurisdicionais são “recursos de ‘reexame’ e não meros recurso de ‘revisão’” (cfr. Prof. J. C. Vieira de Andrade in: “A Justiça Administrativa (Lições)”, 4ª edição, pág. 391).

As questões suscitadas pelo recorrente resumem-se, em suma, a determinar se na situação vertente a decisão recorrida ao indeferir o pedido cautelar de intimação para um comportamento deduzido nos termos do art. 112º, n.º 2, al. f) do CPTA violou ou não os arts. 112º, n.º 1 e 120º, n.º 1 ambos do CPTA [cfr. alegações e conclusões supra reproduzidas].

*3.

FUNDAMENTOS Considerada na decisão recorrida, como condição lógica para efeitos decisórios, assente a factualidade alegada pelo requerente no seu articulado inicial importa, agora, entrar na análise dos fundamentos do presente recurso jurisdicional fazendo um prévio enquadramento jurídico quanto ao actual regime de contencioso administrativo, em especial, em matéria dos procedimentos cautelares, mormente, dos seus critérios de decisão, dos seus pressupostos ou requisitos para a sua decretação.

Os procedimentos cautelares vêm regulados, com autonomia, no Título V do CPTA (cfr. arts. 112º e segs.

), nele estando abrangidos os processos cautelares de natureza antecipatória, como se nos afigura estarmos em presença nestes autos.

Note-se, no entanto, que a distinção entre providências antecipatórias e conservatórias não é questão isenta de alguma dificuldade.

Como doutamente se sustentou no Ac. STA de 24/11/2004 - Proc. n.º 1011/04 (in: «www.dgsi.pt/jsta») “(…) tomando como exemplo a suspensão de eficácia de um acto administrativo e sendo inquestionável que, quer o Legislador (vide, a “Exposição de Motivos” do CPTA) quer a doutrina (…), a qualificam como conservatória, não é menos certo que, porém, tal providência, se concedida, não deixa de se consubstanciar, de alguma maneira, numa antecipação provisional de certos efeitos da decisão definitiva a proferir no processo principal.

(…) O já exposto leva-nos a relativizar a classificação das providências cautelares entre conservatórias de antecipatórias, tanto mais que, por vezes, se verifica uma sobreposição entre as funções conservatória e antecipatória.

(…) De qualquer maneira, o que importa aqui assinalar é que não é pela simples circunstância de uma determinada providência cautelar antecipar certos efeitos da decisão definitiva que, sem mais, se deva concluir que nos encontramos perante uma providência antecipatória.

(…) Ora, temos para nós que a providência será conservatória quando o interessado pretenda manter ou conservar um direito, ou seja, aqui o que se almeja é manter o statu quo, procurando que ele se não altere.

Por sua vez, a providência será antecipatória quando o interessado vise “alterar o statu quo”, mediante a antecipação de uma situação que não existia anteriormente.

(…).” [cfr. ainda Ac. do STA de 13/01/2005 - Proc. n.º 1273/04 in: «www.dgsi.pt/jsta»; vide ainda sobre esta temática Dr.ª Isabel Celeste M. Fonseca in: “Dos Novos Processos Urgentes no Contencioso Administrativo (função e estrutura)”, págs. 66 a 68 e in: “Introdução ao Estudo Sistemático da Tutela Cautelar”, págs. 120 e segs.

].

Daí que à luz destes ensinamentos e analisada a pretensão em presença temos que concluir pela natureza antecipatória da providência requerida pelo ora recorrente.

Para além disto, sendo uma providência cautelar entre as outras previstas no CPTA a mesma depende da verificação dos requisitos gerais previstos e enunciados no art. 120º do CPTA.

Nesta sede, importa distinguir e escalpelizar os critérios de ponderação da necessidade, adequação e equilíbrio das providências cautelares cujo decretamento se requer.

Como é sustentado pela doutrina que sobre o normativo já se foi produzindo [cfr. entre outros, Prof. J. C. Vieira de Andrade, in: ob. cit., págs. 299 e segs.

; Prof. Mário Aroso de Almeida in: “O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos”, 3ª edição revista e actualizada, págs. 293 e segs., em especial, págs. 298 a 303; Prof. João Caupers in: “Introdução ao Direito Administrativo”, 7ª edição, págs. 372 e segs.

; Prof. Colaço Antunes em “Brevíssimas notas sobre a fixação duma summa gravaminis no processo administrativo” in: Revista da Faculdade de Direito da Universidade do Porto, Ano I, 2004, págs. 91 e 92; Dra. Isabel Celeste M. Fonseca in: “Dos Novos Processos …”, págs. 65 e segs.

; Dra. Carla Amado Gomes em “O Regresso de Ulisses: um olhar sobre a reforma da justiça cautelar administrativa” in: “Cadernos Justiça Administrativa” n.º 39, págs. 04 e segs.

], importa autonomizar, desde logo, as situações em que se trate de providências dirigidas contra actos manifestamente ilegais, por si ou por referência a actos idênticos já anteriormente anulados, declarados nulos ou inexistentes e contra actos de aplicação de normas já anulados [cfr. art. 120º, n.º 1, al. a) do CPTA].

Neste tipo de situações o seu decretamento é quase automático na medida em que assente em requisitos objectivos, baseando-se num critério de...

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