Acórdão nº 1516/04-1 de Tribunal da Relação de Évora, 09 de Novembro de 2004 (caso NULL)
Magistrado Responsável | ANTÓNIO PIRES HENRIQUES DA GRAÇA |
Data da Resolução | 09 de Novembro de 2004 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam, em audiência, na Relação de ÉvoraA - Nos autos de processo comum (tribunal singular) com o nº do 1º Juízo Criminal da comarca de …, foi proferida sentença em 28 de Março de 2003, que condenou o arguido A como autor de um crime de dano p. e p. pelo artigo 212º, nº 1 do Código Penal na pena de 180 dias de multa à taxa diária de 4 euros, no montante de 720 euros que, não sendo paga, poderá ser substituída por prisão subsidiária de 120 dias; Foi condenado nas custas criminais E, foi ainda condenado como demandado, o referido A a pagar ao demandante B,- (que se constituiu assistente, acompanhou a acusação pública e deduziu pedido de indemnização contra o arguido por danos patrimoniais no montante de 1 050 000$00/5 237.38 euros e por danos não patrimoniais no montante de 500 000$00/2 493.99 euros). - a título de indemnização, a quantia de 4 989.18 euros, absolvendo-se do restante que foi peticionado.
Custas cíveis foram suportadas por ambas as partes na proporção do respectivo decaimento.
B- Inconformado, recorreu o arguido, apresentando as seguintes conclusões: 1. A sentença recorrida não refere a distância a que os cães se encontravam da casa do arguido, nem a distância a que as galinhas estavam da capoeira, nem se no local era permitido exercer a actividade da caça, omite qual o número de galinhas que foi atacado pelos cães, bem como, qual a importância económica que a criação das galinhas tinha para o arguido, e ainda a evidência de que o assistente não cumpriu com o dever de vigilância dos animais que sobre ele recaia (art. 0493° do CC).
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Todas estas questões eram de importância decisiva para o correcto julgamento do caso em apreço.
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Verifica-se assim, que a matéria de facto provada é insuficiente para uma decisão de direito devidamente fundamentada e ponderada.
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Consequentemente, a sentença recorrida está viciada, sendo impossível com as omissões referidas proferir uma decisão justa.
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Pelo que se deve revogar a sentença recorrida, renovando-se a prova, repetindo-se o julgamento.
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De harmonia com o disposto no art. 336° do CC, "É lícito o recurso à força com o fim de realizar ou assegurar o próprio direito, quando a acção directa for indispensável, pela impossibilidade de recorrer em tempo útil aos meios coercivos normais, para evitar a inutilização prática desse direito, contanto que o agente não exceda o que for necessário para evitar o prejuízo".
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No caso em apreço verificam-se todos os pressupostos de uma actuação em exercício legítimo da acção directa.
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O arguido matou um cão (segundo a sentença teria morto três), após os cães terem corrido atrás de galinhas de sua propriedade e após troca de palavras com o dono da matilha.
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Era-Ihe impossível recorrer em tempo útil aos meios coercivos normais, para evitar a inutilização prática desse direito.
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O arguido não excedeu o que era necessário para evitar o prejuízo.
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A acção directa é, nos termos do disposto no art. 31° do CP, uma causa de exclusão da ilicitude.
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Pelo que, afastada a ilicitude da conduta do arguido, se impunha a sua absolvição.
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Assim, foram violados por omissão os art. s 336° do CC e 31 ° do CP .
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A sentença recorrida padece de erro notório na apreciação da prova, o que aliás resulta do texto da decisão recorrida, por si só e ainda da conjugação da mesma com as regras da experiência comum.
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A verdade é que, como na sua motivação a sentença recorrida assume, apenas um cão foi encontrado morto.
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O simples facto dos cães não terem voltado, não demonstra que o arguido os matou, antes pelo contrário.
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O que a experiência nos diz, é que, se três cães tivessem sido mortos a tiro teriam necessariamente de aparecer mortos.
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Sendo evidente que apenas um cão foi morto, mas ainda que assim não se entendesse, sempre subsistiria a dúvida e esta teria de beneficiar o arguido, à luz do principio in dubio pro reo, que se entende ter sido violado.
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Se a prova tivesse sido correctamente apreciada, a decisão seria necessariamente diferente e considerar-se-ia provado que o arguido apenas matou um cão, o único cão que apareceu morto, o que teria relevo decisivo ao nível da graduação da culpa.
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Sendo certo que nos temos do art. 40°, n.° 2 do CP, que se entende ter sido violado, a pena não pode ultrapassar a medida da culpa.
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Considerando assim que o arguido apenas matou um cão, então só por esse dano deverá indemnizar , pelo que, o montante indemnizatório fixado na sentença recorrida teria de ser reduzido, de modo a contemplar o prejuízo causado pela morte de um único animal, sendo este de valor muito inferior ao que a sentença refere.
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Foi assim violado o art. 483°, n. I do CC, pois o montante indemnizatório fixado excede manifestamente a medida do dano sofrido pelo lesado.
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O arguido tem 72 anos de idade, aufere uma pensão de reforma no valor aproximado de € 165,00, é pessoa de baixa condição económica, sem antecedentes criminais, a sua culpa, a existir, é diminuta, atenta a situação de aflição e desespero em que agiu, não necessita de reintegração na sociedade e não existem necessidades de prevenção geral.
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Dificilmente se encontrará caso mais manifesto de inadequação, entre a medida da pena e os critérios que devem presidir à sua determinação.
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Pelo que foram violados os artigos 40. e 71, n. 2, alíneas c) e d), do CP, que se tivessem sido correctamente aplicados conduziriam a uma pena de multa inferior, quer na sua duração temporal, quer na taxa diária.
TERMOS EM QUE REVOGANDO-SE A SENTENÇA RECORRIDA: A) Ordenando a renovação da prova, ou em alternativa; B) Substituindo a sentença recorrida por outra que absolva o arguido julgando justificada a acção directa, com base no direito de necessidade, ou em alternativa; C) Condenando o arguido pela prática de um crime de dano, pela morte de um único cão, reduzindo assim a sua culpa, a pena e também o montante da indemnização, ou ainda que; D) Determinando a aplicação de uma pena de multa de menor duração temporal e a uma taxa diária inferior .
C- Responderam à motivação de recurso: - O assistente, concluindo: 1- A matéria de facto apurada é farta e suficiente para fundamentar a sentença recorrida e foi aquela que apesar disso se conseguiu apurar, não obstante não ser aquela que o Recorrente gostaria que se provasse: 2- O dever de vigilância que se impunha ao Recorrido foi aquele que foi exercido contrariamente ao que se impunha ao Recorrente que deixou as galinhas a "pastar" como quaisquer animais selvagens; 3- Contrariamente ao que o Recorrente tenta fazer passar o que esteve e está em causa com este processo foi o morticínio bárbaro de três cães e o ferimento de outro.
4- A acção directa invocada pelo Recorrente é de todo injustificada pela importância dos bens em perigo - (perigo esse que não se consumou) - e pelo mal muito maior que injustificada e barbaramente provocou, 5- Na sentença recorrida não existe nenhum erro na apreciação da prova que efectivamente se produziu, antes pelo contrário, tratou-se de uma bem conseguida, ponderada e justa apreciação da prova; 6- A indemnização cível imposta pela sentença recorrida, tem como fundamento a prova que efectivamente se colheu das testemunhas C e D, não só quanto às óptimas qualidades de caça dos cães abatidos, mas também quanto ao valor comercial deles.
7- Por fim, a sentença que o Recorrente pretende atacar é inatacável, quanto à sua boa fundamentação e quanto à sua...
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