Acórdão nº 348/04-1 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 27 de Abril de 2004 (caso None)
Magistrado Responsável | SÉNIO ALVES |
Data da Resolução | 27 de Abril de 2004 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES QUE COMPÕEM A SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA: I. No Proc. 253/02.0TALGS-A do 2º Juízo do Tribunal Judicial de Lagos, onde se investiga a eventual prática, pelos arguidos A e outros, de um crime de abuso de confiança em relação à Segurança Social, o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social (IGFSS) veio requerer a sua constituição como assistente.
Sobre tal pedido recaiu o seguinte despacho: "(...) De harmonia com o disposto no art. 68 °, n.° 1, al. a), do Código de Processo Penal, podem constituir-se assistentes no processo penal, além das pessoas e entidades a quem leis especiais conferirem esse direito, os ofendidos, considerando-se como tais os titulares dos interesses que a lei especialmente quis proteger com a incriminação e bem assim, acrescenta-se, os respectivos representantes.
Neste processo, os arguidos foram acusados da prática de um crime de abuso de confiança em relação à segurança social.
Ora, tal ilícito, em meu entender, tutela directa e imediatamente o interesse do Estado quer na defesa das respectivas receitas quer na defesa de critérios que devem nortear as relações entre o Estado-Administração e administrados.
Sem descurar outros interesses que acabam por indirectamente ser tutelados - trabalhadores, organização da segurança social - não é possível concluir que tais interesses se situem na primeira linha da garantia penal.
É certo que o art. 46.° do RJIFNA previa a intervenção da Segurança Social. Hoje, por via das alterações introduzidas pela Lei n.° 15/2001, de 5 de Junho, que aprovou o regime jurídico das infracções tributárias, tal previsão desapareceu, admitindo-se apenas a assistência técnica ao Ministério Público - representante do Estado - por parte das instituições - art. 50.° do mencionado diploma.
Assim sendo, por nem à luz da lei geral nem de lei especial se admitir a intervenção do IGFSS nos moldes requeridos, indefiro o requerimento de constituição de assistente do referido instituto, por ausência de legitimidade - vide no mesmo sentido o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 25 de Fevereiro de 2003, in http://www.dgsi.pt.
Notifique".
Inconformado, recorreu o IGFSS, extraindo da sua motivação as seguintes conclusões (a seguir transcritas): 1. O douto despacho de que se recorre conclui pela não admissão do IGFSS a intervir como assistente no processo em virtude de, depois da entrada em vigor da Lei n° 15/2001, de 5 de Junho, não existir uma disposição equivalente ao artº 46º do RJIFNA, que expressamente preveja essa possibilidade.
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Ora, não pode ser esta a interpretação que se deve acolher relativamente a esta evolução legislativa.
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O artº 46º do RJIFNA, tanto na sua letra como no seu espírito, visava tão somente possibilitar à administração fiscal a intervenção como assistente, funcionando como uma das leis especiais referidas no artº 68º, nº 1 do CPP; 4. Uma vez que, de outra forma, a possibilidade de constituição de assistente estaria vedada à administração fiscal por falta de personalidade jurídica distinta do Estado.
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Ora essa situação nunca se colocou relativamente à Segurança Social, que sendo representada por Institutos Públicos dotados de autonomia administrativa e financeira, com personalidade jurídica, e enquanto titular de interesses que a lei quis especialmente proteger com a incriminação - Abuso de Confiança à Segurança Social -, sempre teve legitimidade para intervir nos processos na qualidade de assistente, ao abrigo do artº 68º, nº 1, alínea a) do CPP.
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Os interesses especialmente (particularmente) protegidos no crime de Abuso de Confiança em relação à Segurança Social, reconduzem-se ao próprio património da Segurança Social, concretizado na arrecadação das contribuições que lhe são devidas, cuja protecção está confiada ao IGFSS (Cfr. Estatutos do IGFSS).
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E relativamente ao facto de o art° 50° do RGIT prever a possibilidade de o Ministério Público ser assistido tecnicamente por um agente da Segurança Social, isso não invalida outras formas de intervenção no processo por parte da Segurança Social.
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Ou seja, o art° 50° do RGIT não deve ser interpretado como uma norma restritiva à intervenção do IGFSS no processo.
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Este art° 50°...
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