Acórdão nº 1869/03-1 de Tribunal da Relação de Évora, 02 de Março de 2004
Magistrado Responsável | SÉNIO ALVES |
Data da Resolução | 02 de Março de 2004 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
ACORDAM, EM AUDIÊNCIA, OS JUÍZES QUE INTEGRAM A SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA: I. No Proc. Comum Colectivo 318/00.2PBFAR do 1º Juízo Criminal de Faro, os arguidos A e B, ambos com os demais sinais dos autos, foram submetidos a julgamento, acusados: - o arguido A , pela prática de dois crimes de furto qualificado, um na forma consumada e outro na forma tentada, p.p. pelos artºs 203º, nº 1 e 204º, nº 2, al. e), do Cod. Penal e de um crime de condução ilegal, p.p. pelo artº 3º, nº 2 do DL 2/98, de 3/1; - o arguido B , pela prática de um crime de condução ilegal, p.p. pelo artº 3º, nº 2 do DL 2/98, de 3/1.
A final, viria o arguido A a ser absolvido dos crimes e dos pedidos cíveis contra si formulados e o arguido B, por seu turno, condenado, pela prática do crime por cuja autoria vinha acusado, na pena de 90 dias de multa, à razão diária de € 5, no montante global de € 450.
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Inconformado com o acórdão respectivo, na parte em que foi determinada a absolvição do arguido A, recorreu o Digno Procurador da República, extraindo da sua motivação as seguintes conclusões: 1ª O acórdão recorrido enferma dos vícios previstos no artº 410º, nº 2, als. a) e c) do CPP, de insuficiência da matéria de facto para a decisão da causa e de erro notório na apreciação da prova, por não ter valorado a informação fornecida pela P.J. relativamente à identificação das impressões digitais do arguido no veículo de matrícula ... , não tendo solicitado o envio do relatório pericial, apesar de o considerar essencial à descoberta da verdade, nos termos do artº 340º do CPP.
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Tal relatório, junto com a motivação, confirma a identificação das impressões digitais do arguido já constante do documento "informação de serviço" apresentado em audiência.
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Verifica-se igualmente erro notório na apreciação da prova pela não valoração do depoimento de uma testemunha, depoimento que não pode considerar-se como indirecto, nos termos do artº 129º do CPP, dado que a pessoa "a quem se ouviu dizer" esteve presente em audiência, usando, como arguido, o direito de não falar.
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O depoimento da testemunha, que recuperou o veículo por indicações do arguido, que o acompanhou ao local onde havia deixado o carro, não é nesta parte um depoimento indirecto, por se basear em diligências de investigação efectivamente realizadas.
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Assim, nos termos do artº 412º, nº 3 do CPP, mostram-se incorrectamente julgados os pontos constantes do ponto 2.1. do acórdão, impondo decisão diversa os documentos dos autos, bem como o depoimento da testemunha C, o qual se encontra gravado na única cassete de gravação, Lado A (artº 412º, nº 4 do CPP).
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O acórdão recorrido violou o disposto nos artºs 164º, 165º, 129 e 340º do CPP.
Pede, a concluir, a revogação do acórdão recorrido e a sua substituição por outro que condene o arguido A por todos os crimes de que se encontrava acusado.
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Admitido o recurso, o arguido não respondeu.
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Nesta Relação, o Exmº Procurador-Geral Adjunto é de parecer que o recurso merece provimento e que a decisão recorrida padece de erro notório na apreciação da prova, devendo determinar-se o reenvio do processo para novo julgamento.
Cumprido o disposto no artº 417º, nº 2 do CPP, não houve resposta.
Colhidos os vistos, teve lugar a audiência.
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É a seguinte a matéria de facto apurada em 1ª instância: 1. No dia... de... de ..., durante a noite, os arguidos, acompanhados de D, e do menor E, fizeram-se transportar de ... para ..., no veículo de matrícula... , que haviam subtraído alguns dias antes em ...
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Esse veículo foi conduzido pelo B no referido percurso, sem que possuísse carta de condução que o habilitasse a conduzir aquele tipo de veículos na via pública.
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Sabia ele que para o poder fazer era necessário submeter-se às respectivas provas.
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Em toda a conduta descrita agiu o arguido deliberada, livre e conscientemente, sabendo que a mesma era proibida por lei penal.
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Cerca das ... horas e ... minutos, ao perceberem que estavam a ser perseguidos por agentes da PSP de ..., os arguidos e companheiros abandonaram o referido veículo, pondo-se em fuga.
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Foram causados estragos em todas as fechaduras do veículo de matrícula ..., que se encontrava estacionado na rua de..., pertencente a F, cuja reparação custou a quantia de 39.759$00.
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Foi estragada a fechadura da porta da frente, do lado esquerdo, do veículo de matrícula..., que estava estacionado na mesma rua, pertencente a G.
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Para pôr o motor do mesmo a funcionar, foi feita uma ligação directa ao motor, causando estragos no canhão da ignição e na tranca da direcção, de valor não apurado.
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Para reparar os estragos com que ficou, gastou G a quantia de 153.080$00 (cento e cinquenta e três mil e oitenta escudos).
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Ficou o mesmo privado de o usar durante uma semana e durante esse período andou de autocarro nas suas deslocações.
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Tudo isto fez com que andasse entristecido, aborrecido e mal dormido.
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O veículo tinha o valor de 1.500.000$00.
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O A tem o 7.° ano do ensino unificado. É vendedor ambulante, em... . Aufere o rendimento médio mensal de 600 € (seiscentos euros). Vive em casa dos pais e não tem qualquer pessoa que seja dele economicamente dependente. É primário.
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O B tem o 11.° ano do ensino unificado. É pintor da construção civil. Aufere o rendimento médio mensal de 500 €. Vive em casa dos pais e não tem qualquer pessoa que seja dele economicamente dependente. É primário. Admitiu espontaneamente a prática dos factos.
E o tribunal recorrido deu como não provado que: - Após ter percorrido algumas ruas desta cidade, o A decidiu apoderar-se do veículo de matrícula..., que se encontrava estacionado na rua de ..., pertencente a F; - Então, com uma chave de fendas que possuía, tentou abrir a porta daquele veículo, para nele entrar, não conseguindo, tendo, no entanto causado estragos em todas as fechaduras; - Agiu o arguido com intenção de se apoderar de referido veículo, no valor de 1.200.000$00, e de integrá-lo no seu património, não conseguindo por motivos alheios à sua vontade; - Sabia o arguido que o mesmo não lhe pertencia e que agia sem conhecimento e contra a vontade da sua proprietária; - Como não conseguisse concretizar o seu propósito em relação a esse veículo, o A abeirou-se então do veículo de matrícula..., que estava estacionado na mesma rua, pertencente a G, tendo com a referida chave de fendas estragado a fechadura da porta da frente, do lado esquerdo, e por aí entrado no veículo; - Para pôr o motor do mesmo a funcionar o arguido fez uma ligação directa ao motor, causando estragos no canhão da ignição e na tranca da direcção, de valor não apurado; - Depois de ter conseguido pôr o veículo a trabalhar, o A conduziu-o até ...; - Agiu o arguido com o intuito de fazer seu o dito veículo, bem sabendo que o mesmo não lhe pertencia e que agia sem conhecimento e contra a vontade do seu legítimo proprietário; - O A não possuía carta de condução que lhe permitisse a condução desse veículo na via pública, bem sabendo que tal era necessário; - Em todas as condutas descritas agiu o arguido A deliberada, livre e conscientemente, sabendo que as mesmas eram proibidas por lei penal.
E fundamentou o tribunal colectivo a sua convicção, desta forma: "Foram relevantes para a decisão da matéria de facto dada como assente os documentos juntos ao processo, os certificados do registo criminal dos arguidos e os depoimentos dos arguidos, das partes civis e das testemunhas.
A análise crítica das provas.
Os certificados do registo criminal de cada um dos arguidos serviram para se decidir dos seus antecedentes criminais; Os documentos juntos ao processo para se apurar a extensão dos estragos causados nos veículos.
Os depoimentos dos arguidos prestados no decurso da audiência, para se apurar das suas situações pessoais e económicas e, quanto ao B, da prática dos factos de que vinha acusado. O A optou por não prestar declarações acerca da matéria da acusação mas também não estava obrigado a tal e por isso não poderá ser prejudicado pela sua opção.
Os depoimentos das partes civis e da testemunha H para se apurar a extensão dos estragos causados nos veículos e as demais consequências decorrentes dos mesmos.
O depoimento das testemunhas I e J para se apurar da situação pessoal e económica do...
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