Acórdão nº 7569/2003-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 11 de Dezembro de 2003
Magistrado Responsável | ALMEIDA CABRAL |
Data da Resolução | 11 de Dezembro de 2003 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Acordam, em audiência, os Juízes da 9.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: 1 - No 1.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Sintra, em que é arguida (M), e recorrente o Ministério Público, foi aquela acusada de haver praticado um crime de "coacção grave", p. p. nos termos do art.º 155.º, n.º 1, al. a), do Cód. Penal.
Porém, realizado o julgamento, veio a arguída a ser absolvida do imputado crime, havendo, por outro lado, a factualidade que foi considerada provada sido subsumida na previsão do art.º 153.º, n.º 1, do Cód. Penal - "ameaça" - e, em consequência, homologada, a desistência de queixa apresentada nos autos pelo queixoso, (G) .
Porém, não conformado com a absolvição da arguída do imputado crime de "coacção", e da subsunção que veio a ser feita dos respectivos factos, desta decisão recorreu o Ministério Público, considerando ter sido violado o disposto no art.º 154.º, n.º 1, do Cód. Penal.
Da sua motivação extraiu as seguintes conclusões: (…) IV - A sentença violou o art.º 154º-1 do C.P Deve portanto substituir-se a douta decisão, por outra que revogue e condene a arguida, pela prática de um crime de coacção.
O recurso foi admitido, com subida imediata, nos próprios autos, e efeito meramente devolutivo.
*Notificado da interposição do mesmo recurso, respondeu a recorrida, a qual, por sua vez, formulou as seguintes "conclusões": (...) Neste Tribunal, o Exm.º Procurador-Geral Adjunto emitiu o seguinte "parecer": "(…) Como questão controvertida, afiguram-se as seguintes: - se os factos integram uma forma actual e imediata de violência, material ou moral para obrigar outrem a uma acção ou omissão ou a suportar uma actividade uma acção; - se existe dolo de intimidação e de constrangimento, a ser este exigível.
Ora, tal não se afigura exigível, bastando-se o tipo legal do art.º 153.°, n.º 1 do C. Penal com a prova da violência com consciência que esta é susceptível de constranger e com tal o agente se conforme, não sendo exigível o dolo específico de constrangimento.
Assim, o simples facto de causar medo, que faz o arguido desviar-se e depois correr 25 metros para se por a salvo, ainda que fosse meramente para o assustar, parece corresponder ao necessário elemento subjectivo integrador desse tipo legal, pois quem causa uma ameaça actual com um veículo sabe que a mesma é idónea para provocar tal medo - assim, semelhantemente se decidiu, em caso paralelo, no ac. da Relação de 19/10/94 na base de dados www.DGSI.pt, processo n.º 333543.
Assim, parece que o recurso, a ser julgado em audiência, é de proceder.
** Mantêm-se verificados e válidos todos os pressupostos processuais conducentes ao conhecimento do recurso, o qual, por isso, deve ser admitido, havendo-lhe, também, sido correctamente fixado o efeito.
Porque a questão foi suscitada pela recorrida, impõe-se referir, como os autos bem documentam, que a decisão ora impugnada foi lida e notificada às partes em 15/5/2003, e não, como aquela alega, em 08/5/2003. Daí que o recurso tenha sido interposto em tempo.
Não existe causa extintiva de todo o procedimento ou da responsabilidade criminal que aquí, e agora, ponha termo ao processo.
*2 - Cumpre, pois, apreciar e decidir: É o objecto do presente recurso, sem prejuízo do oficioso conhecimento dos eventuais vícios previstos no art.º 410.º, n.º 2, do C.P.P., a decisão proferida pelo tribunal "a quo", que absolveu a arguída da imputação que lhe havia sido feita, isto é, a prática de um crime de "coacção", p. p. nos termos do art.º 154.º, n.º 1, do Cód. Penal, e da subsunção feita da respectiva conduta na previsão do art.º 153.º, n.º 1, do mesmo diploma, isto é, "ameaça".
* Foi a seguinte a decisão impugnada, naquilo que aquí releva: "(…) 2.
Fundamentação 2.1. Discutida a causa, resultou provado que: 1. No dia 16 de Outubro de 1999, pelas 11.30 horas, dirigiu-se a arguida (M) ao estabelecimento comercial de (P), sito, em Janas, Sintra, onde ocorreu um desentendimento entre a mesma e o proprietário do estabelecimento.
-
Seguidamente, a arguida abandonou aquele estabelecimento, na sequência do que conduziu a sua viatura por forma demasiado chegada ao limite da estrada com a parede dos prédios aí existentes, e em direcção ao queixoso (G), pai do mencionado proprietário do estabelecimento comercial, que na ocasião ali caminhava.
-
Face a tal conduta, viu-se o queixoso (G) na iminência de ser atropelado pela viatura conduzida pela arguida, o que só não sucedeu graças aos seus rápidos reflexos, não obstante a sua já avançada idade, que o levaram a mudar de direcção e correr cerca de 25 metros até uma entrada de um parque de estacionamento próximo, só assim ficando a salvo.
-
Ao assim actuar quis a arguída intimidar o queixoso (G), o que conseguiu, nele provocando um sentimento de medo e receio pela sua integridade...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO