Acórdão nº 9914/2002-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 07 de Outubro de 2003 (caso NULL)
Magistrado Responsável | VASQUES DINIS |
Data da Resolução | 07 de Outubro de 2003 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Lisboa:IA assistente ENTIDADE REGULADORA DO SECTOR ELÉCTRICO apresentou queixa contra (L) imputando-lhe a prática um crime de abuso de cartão de garantia ou de crédito, p. e p. pelo artigo 225.º, n.º 1, do Código Penal.
Realizado o inquérito, o Ministério Público proferiu despacho em que determinou o arquivamento dos autos, por considerar não se encontrar suficientemente indiciada a prática do crime, nomeadamente no que diz respeito à intencionalidade volitivamente assumida por parte do arguido, no sentido de abusar da possibilidade que o cartão de crédito lhe conferia e desse modo prejudicar a denunciante.
Requerida a abertura de instrução, pela assistente, veio, após o debate instrutório, a ser proferido despacho de não pronúncia.
De tal decisão, traz a assistente o presente recurso, terminando a motivação com as conclusões que se transcrevem: 1.
A Assistente entregou ao Arguido o cartão de crédito com o n.º 491212000000496, do Banco Mello, S.A.
-
O Arguido adquiriu, mediante a utilização do referido cartão de crédito, para si e para terceiro, bens de carácter pessoal gastando, no mês de Janeiro de 1999, a quantia de Esc. 479.238$00, que a Assistente viu-se obrigada a pagar ao Banco Mello.
-
O Arguido rubricou uma lista dirigida aos detentores dos cartões de crédito que estava anexa a uma informação datada de 19.03.1997, contendo regras quanto à utilização dos cartões de crédito e na qual constava que todos os cartões têm um valor anual correspondente a 12 vezes o valor mensal indicado e que as despesas permitidas pelo cartão respeitam a hotelaria, e gastos de transportes.
-
O Arguido tinha pleno conhecimento e consciência das regras de utilização dos cartões de crédito, no entanto ultrapassou o limite mensal permitido (Esc. 40.000$00) e ignorou o carácter pessoal e funcional da utilização do cartão de crédito.
-
No plano da tipicidade objectiva, o crime de abuso de cartão de garantia ou de crédito supõe que o Agente, abusando da possibilidade, conferida pela posse de cartão de garantia ou de crédito, leve o emitente a fazer um pagamento que cause prejuízo ao emitente ou a terceiro.
-
Nos autos constam elementos que provam a existência do cartão de crédito, que o cartão se encontrava na posse do Arguido, que o Arguido não cumpriu as normas de utilização do cartão e que o emitente efectuou um pagamento que causou prejuízos à Assistente.
-
No entanto, o Excelentíssimo Juiz do Tribunal de Instrução considerou que "...
o agente, enquanto titular do cartão, tem de violar as regras estabelecidas com a entidade emitente." (o itálico é nosso).
-
A Assistente é a titular do cartão de crédito e não o Arguido, pois, o contrato aderente foi celebrado entre o Banco Mello (que é a entidade emitente nos presentes autos) e a Entidade Reguladora do Sector Eléctrico (que é a Assistente nos presentes autos).
-
Na relação do contrato aderente o Arguido é terceiro, mero possuidor/utilizador e beneficiário de um cartão de crédito posto à sua disposição pela sua entidade patronal para fazer face a despesas que possam surgir no âmbito do seu trabalho.
-
No que diz respeito ao cartão de crédito, o Arguido tem obrigações, que desrespeitou, com a Assistente, sua entidade patronal e titular do referido cartão de crédito, e não com o Banco Mello.
-
O desrespeito pelas regras de utilização do cartão de crédito prescritas pela entidade patronal constitui o abuso a que se refere o n.º 1 do art. 225.º do C.P.
-
Aliás, a formulação do n.º 1 do art. 225.º do C.P. não exige que o abuso se consubstancie na violação de regras do contrato aderente, ao contrário da sua fonte próxima o § 266b do C.P. alemão.
-
Se o Meritíssimo Juiz do Tribunal de Instrução tinha dúvidas quanto ao preenchimento do tipo neste especifico circunstancialismo, devia ter proferido um despacho de pronúncia, deixando o fundo da questão e a dissipação dessas dúvidas para julgamento.
-
A instrução visa comprovar a existência de indícios de facto e elementos de direito suficientes para justificar a submissão do Arguido a julgamento.
-
Nos autos de inquérito e instrução existem indícios de facto e elementos de direito suficientes para a aplicação ao Arguido de uma pena ou de uma medida de segurança.
-
No plano da...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO