Acórdão nº 299/2006-8 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 23 de Fevereiro de 2006
Magistrado Responsável | ILÍDIO SACARRÃO MARTINS |
Data da Resolução | 23 de Fevereiro de 2006 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa I - RELATÓRIO Fernando ---, intentou acção ordinária contra a Câmara Municipal de Vila Franca de Xira, pedindo que a ré seja condenada a restituir ao autor a fracção autónoma correspondente ao R/C esq. sito no bloco C da Rua ---; a abster-se da prática de actos que ofendam a utilização da fracção autónoma pelo autor e no pagamento de indemnização a favor do autor no montante de 15.000 euros, por prejuízos morais causados.
Em síntese, alegou que tem a posse da referida fracção autónoma por força do contrato de arrendamento celebrado com a ex-Comissão Liquidatária do Fundo de Fomento de Habitação, passando a pagar, a partir daquela data a renda mensal de 9.270$00. No uso da fracção fez obras interiores e exteriores. Em 18.10.1997, a ré reconheceu o autor como arrendatário daquela fracção. Em 5 de Julho de 2002, trabalhadores da ré arrombaram o gradeamento da porta da fracção, penetraram no seu interior e colocaram nova fechadura por forma a impedir a entrada do autor.
O autor exerce advocacia a partir de Vialonga desde 1986, tendo granjeado muitos clientes entre os vizinhos, ficando a reputação profissional do autor abalada pelos actos praticados pela ré, causando-lhe um prejuízo moral no montante de 15.000 euros.
Contestou a ré, impugnando parcialmente os factos alegados na petição inicial, referindo que é proprietária da fracção desde 16 de Julho de 1996. A fracção integra-se num bairro social e o autor não vive na fracção desde há vários anos, tendo a mesma sido habitada em diferentes períodos por outras pessoas, vivendo o autor em casa própria.
Em princípios de Julho de 2002 a Câmara foi alertada por vizinhos da fracção que a mesma se encontrava vazia e abandonada, com o gradeamento da porta arrombado e a porta aberta. A Câmara mandou fechar o gradeamento e a porta. Em meados de Outubro de 2002, a Câmara, convicta de que o autor abandonou a fracção, tendo mesmo deixado de pagar a respectiva renda desde Abril de 1992, atribuiu, naquele mês de Outubro de 2002, o fogo a José ---, como uma família carenciada, mediante a renda mensal de € 11,92 e com quem mais tarde acordou a venda por € 12.685,68.
O autor não habita a casa dos autos desde há vários anos, vivendo em casa própria e, pelo menos desde Abril de 1992, não paga a renda da referida casa que se integra num bairro social.
O autor não é detentor dos direitos que se arroga e, mesmo que o fosse, o exercício de tais direitos excederiam manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes e pelo fim social e económico desses direitos.
O autor replicou, mantendo o alegado na petição inicial, não sendo aplicável a figura de abuso de direito, atendendo ao alegado na petição inicial.
Foi proferida sentença que julgou a acção improcedente e absolveu a ré do pedido.
Não se conformando com a douta sentença, dela recorreu o autor, tendo formulado as seguintes CONCLUSÕES: 1ª - O presente recurso de apelação é interposto da douta sentença de fls. 157-A a 167 que não determinou a restituição ao autor de fogo de índole social e não fixou qualquer indemnização ao autor; 2ª - Entendeu o tribunal a "quo" que a pretensão do autor e ora alegante enferma de manifesto e reprovável exercício abusivo de um direito; 3ª - A douta sentença considera, a partir da matéria provada sob os quesitos 13° a 17° - a fl. 161 - que em princípios de Julho de 2002 a fracção se encontrava vazia e abandonada, mas não precisa desde quando a fracção assim se encontrava; 4ª - O facto de a fracção ter a porta arrombada e não estar a ser utilizada não é o mesmo que abandono da fracção por parte do autor; 5ª - A iniciativa de pedir a resolução do contrato de arrendamento pertence à ré, pelo que a douta sentença, decidindo como decidiu, violou o disposto no artigo 51° do RAU; 6ª - A ré não podia ocupar licitamente a fracção sem propor acção de resolução; 7ª - Não ocorrem os requisitos de acção directa que dispensariam a ré de, eventualmente, pedir a resolução do contrato de arrendamento; 8ª - Não ocorreu a perda de posse do autor por abandono nos termos do artigo 1267º, n° 1, alínea a) do Código Civil; 9ª - Foram deficientemente valorados os depoimentos das testemunhas da ré Constança Alves Sustelo e Alberto José Pinto; 10ª - Não pode ser considerada a insinuação, feita na sentença recorrida, de o autor ter abandonado a fracção porque ao autor foi impedido o acesso à mesma fracção.
11ª - Por força de tal insinuação, a douta sentença ora recorrida incorreu em erro na qualificação jurídica dos factos, nos termos do artigo 669º nº 2 alíneas a ) e b ), isto é, partindo assim de pressuposto errado, a matéria de facto foi erradamente apreciada, produzindo uma decisão final em contrário daquela que teria sido proferida se a apreciação da matéria de facto houvesse sido convenientemente feita, de acordo com os depoimentos prestados pelas testemunhas da ré, o que se requer ao abrigo do disposto no n° 3 do artigo 669° do Código de Processo Civil; 12ª - Ocorreu erro na qualificação jurídica dos factos nos termos do artigo 669°, n° 2, alíneas a ) e b ) do Código de Processo Civil; 13ª - A falta de residência e o não pagamento de rendas foram os fundamentos para a improcedência do pedido do autor, sendo próprios de causa de pedir de acção de resolução de contrato de arrendamento, alterando-se na douta sentença recorrida o pedido e a causa de pedir; 14ª - Não ocorreram nos autos...
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