Acórdão nº 6557/2005-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 10 de Novembro de 2005 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelFÁTIMA GALANTE
Data da Resolução10 de Novembro de 2005
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

ACORDAM NA 6ª SECÇÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA I - RELATÓRIO João intentou acção declarativa, com processo ordinário, contra Luís e José, alegando, em síntese que: - o A. era sócio da sociedade R que se dedicava à pré-impressão; - os RR. eram sócios da sociedade Astória que se dedicava à impressão e acabamento; - em 1998, A. e RR., resolveram reunir-se numa nova sociedade, da qual todos seriam sócios e gerentes, que teria por objecto quer a pré-impressão, quer a impressão e acabamento, ficando a nova sociedade com o nome de Rubigráfica; - arrendaram novas instalações e começaram a laborar; - nunca foi formalizada a escritura de constituição da nova sociedade, mas a mesma laborou de facto até meados de 1999. Termina pedindo que a acção seja julgada provada e procedente e, em consequência, declarada a existência de uma sociedade comercial de facto, entre Maio de 1998 e Junho de 1999, tendo como sócios A. e RR., sob a denominação R, Lda., e sede na Rua ..., 94, 1º esq., 1900 Lisboa.

Em sede de contestação, os RR. alegam, resumidamente, que: - entre Dezembro de 1997 e Março de 1998, o A. e sua mulher, ambos sócios da "R", propuseram aos RR. a entrada para a sociedade, sendo a quota da mulher do A. cedida e a quota do A. dividida e parcialmente cedida aos RR.; - como contrapartida, cada um dos RR. entraria com 15.000.000$00, sendo a parte de José é preenchida através da entrega de maquinaria; - o R. Luís entregou à R para pagamento da sua futura quota a quantia de 13.803.577$00; - e o R. José entregou maquinaria no valor global de 15.800.000$00; - o R. Luís entrou com 2.650.000$00 para o pagamento destas máquinas; - o R. José entrou ainda com 1.250.000$00 para a aquisição de uma outra máquina e com 1.320.000$00 em dinheiro; - entretanto, tinham sido contratados dois contabilistas para fazer o levantamento contabilístico da sociedade de forma a não haver dúvidas sobre a saúde financeira que o A. e mulher tinham prometido; - chegou-se à conclusão que, em Dezembro de 1998, o passivo da sociedade era de 18.000.000$00; - alarmados com a situação, os RR. quiseram reaver o dinheiro e maquinaria que tinham entregue, mas o A. e mulher começaram a não aparecer na empresa, e a deixar de pagar salários; - desde então, o A. e mulher têm delapidado o património da sociedade.

Terminam pedindo que a acção seja julgada não provada e improcedente, com a sua consequente absolvição do pedido e que o A. seja condenado como litigante de má fé em multa e indemnização.

O A. replicou terminando como na petição inicial.

Após o saneamento do processo, procedeu-se a julgamento.

Foi proferida sentença que julgou a acção procedente, declarando que esteve em actividade na Rua ..., nº 94, 1º esq., 1900 Lisboa, uma sociedade irregular, entre Maio de 1998 e Junho de 1999, tendo como sócios A. e RR., sob a denominação de R Lda. Mais condenou o A. como litigante de má fé em 5 UC de multa e igual quantia de indemnização aos RR., por ter alterado a verdade dos factos.

Inconformados, os RR apelaram, tendo, no essencial, apresentado as seguintes conclusões: 1. O recorrido e sua mulher são os únicos sócios da sociedade R Lda.

2. A presente acção deu entrada em Juízo em 13 de Março de 2003 e foi julgada em Novembro desse ano.

3. A causa de pedir e o pedido, na presente acção, dirigem-se a obter decisão que reconheça que entre recorrentes e recorrido se estabeleceu "uma sociedade comercial de facto entre Maio de 1998 e Junho de 1999, tendo como sócios o requerente e os dois requeridos e sob a denominação de R Ldª, tendo como sede a Rua do Vale Formoso, 94, 1° Esq., 1900 Lisboa".

4. Por outro lado, o recorrente José intentara já, em 14 de Julho de 1999, contra a sociedade R, Ldª, acção cível de indemnização, que corre termos pela 3ª Secção da 5ª Vara Cível de Lisboa com o n° 540/99, tendo-se designado para a realização da audiência de julgamento a data de 18 de Abril de 2005.

5. Nessa acção 540/99, a ré "R Ldª" confessou que os pagamentos efectuados e os bens entregues pelo ora recorrente José, no âmbito do negócio a que se reporta a presente acção, o foram no quadro de um acordo que tinha por objecto a entrada deste último, e do recorrente Luís, para sócios daquela sociedade, por meio de cessão de quotas, e não no quadro de um negócio de constituição de uma nova sociedade a formar entre o recorrido e os recorrentes com base na "R Lda", como se veio a decidir na sentença recorrida.

  1. Nos termos do disposto no art. 279°, n° 1, do CPC, é motivo justificado a susceptibilidade de a decisão final que vier a ser proferida no proc. 540/99, da 5ª Vara Cível desta comarca, seguir por entendimento diverso do da sentença aqui em crise, quanto à relação jurídica que se estabeleceu entre os recorrentes, por um lado, e o recorrido e mulher, e a sociedade "R Ldª", por outro lado.

  2. Donde pareça ser de suspender a presente instância até que transite em julgado a decisão final a proferir no identificado processo n° 540/99, da 3ª Secção da 5ª Vara Cível de Lisboa.

  3. Para o caso de assim se não entender, parece certo que se verificam contradições flagrantes entre os factos dados por provados, e entre estes e a decisão recorrida.

  4. A contradição dos factos entre si e com a decisão acarreta a nulidade da sentença, nos termos do disposto no art. 668°, al. c), do CPC, sem prejuízo de este tribunal ad quem modificar a decisão de facto e de direito, nos termos do disposto no art. 712°, n° 1, do mesmo diploma legal.

  5. Noutro passo, a sentença recorrida incorreu na nulidade prevista no art. 668°, aI. d), do CPC, por omissão de pronúncia sobre os factos constantes da decisão laboral cuja certidão se encontra a fls. 393 e ss. dos autos, e violou o disposto no art. 677° do mesmo diploma legal, por ofensa dessa sentença laboral, transitada em julgado, na parte em que deu por provados factos contrários aos fixados neste último decreto judicial, tudo, uma vez mais, sem prejuízo de este tribunal ad quem modificar a decisão de facto e de direito, nos termos do disposto no art. 712°, n° 1, do mesmo diploma legal.

  6. Acresce, que não basta dar-se por provado, no sentido de firmar o entendimento de que foi constituída uma sociedade irregular, que recorrentes e recorrido entraram com bens visando a constituição de uma nova sociedade. Era necessário provar-se, e a prova incumbia ao recorrido, que a não fez, que tais bens se destinavam a operações lucrativas e que todos eles tinham participação nos lucros e nas perdas resultantes dessa operações.

  7. Daqui que a sentença recorrida violou o disposto no art. 980° do CC, ex-vi do art. 36°, n° 2, do CSCom.

  8. Não é possível conceber que recorrentes e recorrido visassem a constituição, entre si, de uma nova sociedade se a entrada dos primeiros para a Rubigráfica, Artes Gráficas, Ldª dependia de cessão de quotas, se está provado que o recorrente José era empregado da Rubigráfica, Artes Gráficas, Ldª, e se nada se provou quanto a qualquer outra relação, que não a decorrente da promessa de cessão de quotas, entre o Luís , por um lado, e o recorrido e mulher, e (ou) a Rubigráfica, Artes Gráficas, Ldª, por outro.

  9. Dúvidas não sobram de que nenhuma sociedade de facto existiu entre os recorrentes e o recorrido, nos termos plasmados na sentença.

  10. Por isso que a sentença recorrida haja violado, flagrantemente, o disposto no supracitados art. 980° do Código Civil, ex-vi do art° 36°, n° 2, do Código das Sociedades Comerciais.

    Contra-alegou o A., que no essencial, concluiu: 1. Parece contra natura que um tribunal de recurso suspenda no tempo a sua apreciação sobre a legalidade da sentença objecto, com fundamento numa outra eventual decisão, quiçá a produzir no futuro, referente a um outro processo, onde as partes, o pedido e a causa de pedir não são nem podem ser os mesmos.

  11. Não há qualquer prejudicialidade daquele processo em relação a este, mas o contrário.

  12. Requerer que o Tribunal de Recurso suspenda a sua apreciação sobre a decisão da Primeira Instância, não suspende os efeitos desta, não tendo essa pretensão qualquer cobertura legal, dado não ser esse o propósito do legislador com o art. 279°, n° 1 do CPC.

  13. Decorre da lógica da promessa de um contrato, ainda por cima não formalizado, que uma promessa tem como contrapartida outra promessa. A promessa de uma cessão de quotas só poderia dar lugar, como contraprestação, outra promessa de entradas em dinheiro e, ou, em equipamento.

  14. A cessão de quotas obriga a escritura pública (cfr art. 228° do CSC e 80°, alínea h) do CN), devendo a promessa respeitante à celebração daquele contrato ser feita por documento escrito (cfr. art. 410°, n° 2 do CC).

  15. Os recorrentes, misturam factos dados como provados com argumentos por si produzidos, como é o caso da conclusão 5: o que o recorrido reconheceu sempre, porque é verdade, é o que consta do artigo 21 dos factos provados, isto é, que o negócio seria legalizado através de uma cessão de quotas a realizar nos termos ali constantes.

  16. O recorrido não recebeu dinheiro e equipamento a título de sinal ou começo de pagamento em relação a um negócio futuro, situação que não se põe de todo numa cessão de quotas, mas estes, bem como a sua participação, composta de equipamento, a firma e carteira de clientes, funcionaram como entradas para uma sociedade que começou imediatamente a funcionar.

  17. Como resulta da factualidade dada como provada e que em momento algum é posta em crise pelos recorrentes, a realização da cessão de quotas nos termos acordados seria um negócio simulado: aqueles valores não correspondiam ao preço das quotas nem ao valor encontrado para a sociedade, artigos 21 e 22 da matéria provada.

    9. Como resulta da matéria dado como provada, a sociedade R Lda era uma sociedade por quotas com dois únicos sócios, marido e mulher, e apenas o marido estava ligado à actividade, conforme artigos 1, 2, 3 e 7 da matéria provada.

    10. Esta sociedade fáctica funcionou, utilizando a firma, o equipamento e os clientes da R Lda., sem oposição daquela sócia...

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