Acórdão nº 2207/2005-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 28 de Abril de 2005 (caso NULL)
Magistrado Responsável | FRANCISCO CARAMELO |
Data da Resolução | 28 de Abril de 2005 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Acordam, em conferência, na 9.' Secção Criminal de Lisboa: I - RELATÓRIO No processo de instrução n.° 71/98.8MALSB do 3° Juízo do Tribunal Judicial de Almada, os arguidos, (J); (S); (L) e (D), inconformados com o despacho de fls. 496 a 508, que os pronunciou pela prática de um crime de homicídio por negligência grosseira, p.p. pelo are 137 n° 2 do C.Penal, vêm, nos termos dos artigos 399° e 400° a contrario, ambos do Código de Processo Penal, dele interpor o presente recurso, concluindo na sua motivação pela não pronúncia dos arguidos, com o consequente arquivamento dos autos, o que fazem de acordo com o teor das ( transcritas ) conclusões: 1.0 douto despacho de pronúncia ora recorrido deve ser revogado e processo arquivado porquanto os ora recorrentes não incorreram na prática do crime p. e p. pelo art.°137°, n.°2 do C.P.; 2.Com efeito, e contrariamente ao lavrado no despacho recorrido, os ora recorrentes procederam com o cuidado devido que é exigido quando se pratica a actividade de canoagem junto à praia de Olho de Boi, no rio Tejo; 3. Para tanto os alunos só embarcavam nas canoas após verificadas as condições de navegabilidade no rio; se soubessem nadar, e envergando os adequados coletes de salvação os quais eram colocados sob a supervisão dos professores; 4.Contrariamente ao inscrito no douto despacho de pronúncia estes procedimentos eram os que, atendendo às circunstâncias e ao local onde decorria a actividade de canoagem, os necessários e suficientes para minimizar os riscos dessa actividade.
-
Não há norma legal, nem regra de prudência que aconselhasse a colocação de uma embarcação de apoio, quando se desenvolve aquela actividade com duas canoas junto A. praia de Olho de Boi.
-
A comunicação da actividade de canoagem à Capitania do Porto de Lisboa não é legalmente exigível, nem se justificava naquelas circunstâncias; 7.Por assim ser, o douto despacho recorrido viola a al. b) do n.°3, do art.°3° do Decreto-lei n.°329/95 de 9 de Dezembro e o .°2°, n.°4°, al. b) do Decreto-lei n.°96/97 de 24 de Abril; 8. â, também, erro sobre a apreciação da matéria de facto, porque contrariamente ao inscrito no despacho de pronúncia, os professores, ora arguidos, verificaram se as condições de navegabilidade eram adequadas para a prática de canoagem; 9.0 acidente que vitimou a malograda (T) aconteceu por causa de força maior e, por isso, os arguidos não poderiam ter contrariado, impedido ou previsto o evento, que é absolutamente estranho às suas vontades; 10.Não foi por qualquer conduta omissiva por parte dos arguidos que aconteceu a morte da infeliz (T); 11.Foi em virtude de estar atracado junto ao cais do Clube Náutico, na praia de Olho de Boi, um batelão, que conjugado com a maré de enchente arrastou a canoa onde seguia a (T) para debaixo da proa do batelão e, apesar desta ter envergado o colete de salvação e, ainda, ter nadado, foi "sugada" para debaixo dessa embarcação; I2.Nos seis anos em que aconteceu a actividade de canoagem, complementar à limpeza da praia de Olho de Boi, nunca tinha estado atracado naquele cais uma embarcação daquelas características, sendo absolutamente imprevisível que a conjugação da corrente de enchente como o formato do batelão desse origem à sucção da infeliz (T); 13 Após a queda na água dos três menores que seguiam na canoa foram adoptados todos os procedimentos de socorro que o caso impunha e só por motivo de força maior é que não se conseguiu salvar a (T); 14.Face ao que antecede por erro de direito e dos pressupostos de facto, o douto despacho de pronúncia deve ser revogado por violação do art. 317°, n°2 do CP.
O M. P., respondendo ao recurso, acompanhou a motivação apresentada pelos recorrentes, pugnando nas suas conclusões pela revogação do despacho recorrido. (a não pronúncia dos arguidos ). - fls. 547 a 560 Neste Tribunal a Ex.ma Procuradora ® geral Adjunta, contrariamente, emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
Cumprido o art° 417 n° 2 do C.P.P., os recorrentes em resposta - fls. 583 a 593 - pugnaram pela revogação do despacho recorrido.
Foram colhidos os vistos legais.
11 FUNDAMENTAÇÃO.
Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente - art°so 403 e 412 do CPP e, por todos, Ao. STJ de 24.03.1999, CJ VII - 1° 247 ) a única questão a decidir é da suficiência e / ou insuficiência da prova indiciaria para sujeição (ou não ) dos recorridos a julgamento.
A Sra. Juiz de Instrução fundamentou da seguinte forma a sua decisão de pronúncia ( ao que agora interessa ): O assistente, no requerimento de abertura da instrução, pede a pronúncia dos arguidos, em primeira mão, pela prática de um crime de exposição ou abandono, p. e p. pelo art. 138°, n.° 1, al. b) e n.° 3, al b) do C.P..
Vejamos.
Este tipo legal de crime só se preenche com dolo, em alguma das suas modalidades, conforme art. 14° do C.P..
Este dolo tem evidentemente que abranger a criação de perigo para a vida da vítima, bem como a ausência de capacidade para se defender por parte da vítima.
Ora, no caso dos autos, é manifesto que de toda a prova produzida em inquérito e em instrução resulta, sem margem para quaisquer dúvidas, que nenhum dos arguidos agiu com dolo.
Na verdade, da prova produzida resulta que os arguidos não chegaram sequer a representar a realização do facto, confiaram que tudo correria bem, como já tinha acontecido noutras situações idênticas, não tendo sido, em momento algum, equacionada a possibilidade da ocorrência da morte de alguma das crianças que participaram na actividade.
Todavia, já quanto ao crime de homicídio por negligência afigura-se-nos que a conclusão deverá ser diversa.
Nos termos do art. 137°, n.° 1 do C.P. " Quem matar outra pessoa por negligência é punido com pena de prisão até 3 anos...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO