Acórdão nº 01P4454 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Março de 2002 (caso NULL)

Data13 Março 2002
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça: I 1. No P.º comum n° 242/01.1GCALM, do 3° Juízo Criminal de Almada, mediante acusação do Ministério Público, foi submetido a julgamento pelo Colectivo, o arguido: A, casado, pedreiro, nascido a 13.6.1962, filho de ... e de ..., natural de St.ª Maria Suaçui, Minas Gerais, Brasil, de nacionalidade brasileira, actualmente preso no EPR de Setúbal, sob imputação da prática de um crime de abuso sexual de crianças, na forma continuada, pp. pelos artigos 172º, n° 1, e 30, n° 2, do Código Penal. Após audiência, o Colectivo julgou o arguido autor de dois crimes de abuso sexual de crianças, pps. pelo citado artigo 172º, n° 1, condenando-o na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão por cada um deles; em cúmulo jurídico, condenou-o na pena de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão. 2. Não se conformou o arguido com a decisão, dela interpondo recurso, formulando as seguintes conclusões (transcrição): I - Tendo-se mantido inalterada a base factual, não tendo havido alteração dos factos, o recorrente acusado por um crime de abuso sexual de crianças, na forma continuada, (172°, nº1 e 30°, n° 2 do C. Penal), acabou condenado por 2 (dois) crimes de abuso sexual de crianças (172°, n° 1 ). II - É inquestionável a liberdade de qualificar juridicamente os factos, subsumidos, a montante e a jusante, à norma do artº 172°, n° 1 do C. Penal, com a diferença de que a jusante, o julgador "a quo", entendeu fundamentar, não haver crime continuado porque, não obstante estarem inequivocamente reunidos os requisitos da continuação criminosa, ter dúvidas quanto à persistência de uma situação exterior que facilitasse a execução e que diminuísse consideravelmente a culpa do agente. III - Depois de considerar ter havido plúrima violação do mesmo tipo legal, e tendo em conta que só pode dar como certas duas condutas criminosas do agente em 15 ( quinze) dias, considera o Douto Acórdão, o tempo curto e poucas as vezes para se poder falar em persistência de uma situação exterior que facilita a execução. IV - Ousamos discordar: Está em causa a repetição de uma conduta dentro do mesmo quadro; para o efeito, o recorrente coabitou com a vítima durante 15 dias que são uma eternidade; em todo o tempo persistiu o quadro de solicitação de uma mesma solicitação exterior, razão porque o Douto Acórdão não está em consonância com o n° 2 do art° 30° do C. Penal, nem com a Jurisprudência, entre outros os Acórdãos desse venerando STJ de 27 de Abril de 1983 e de 25 de Setembro de 1996, acima sumariados. V - Tal como discordamos da consideração, que no Douto Acórdão, leva o julgador a dizer que "a situação exterior que aqui se visualiza não diminui de modo considerável a culpa do agente" depois de, emocionalmente, considerar que o objecto do desejo sexual do arguido é uma criança de tão somente cinco anos de idade e que não se pode conceber um quadro de tentação carnal, de estimulação do desejo, quando estamos perante uma criança de tão tenra idade. VI - Aqui, não discordamos da emoção, discordamos, e não estamos sozinhos - de que havendo, como houve, uma persistente facilitação no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior - que não diminua de modo considerável a culpa do agente. A este propósito, vejam-se entre outros: M. Maia Gonçalves - C. Penal, anotado, 6ª ed. 1992, pág. 126; Ac. R.P de 6-7-88, BMJ, 379, 645; Ac. STJ de 17-10-96 - 3ª Secção, acima sumariados. VII - Para efeitos do 30° n° 2 do C. Penal, não parece relevante que o crime seja mais ou menos grave, e que, reunidos os pressupostos da continuação criminosa caiba ao julgador, pontualmente, considerar que diminuem ou não de modo considerável a culpa do agente. VIII - Por maior que seja o constrangimento, por muito que nos repugnem os actos e mesmo que a vítima seja uma criança de tenra idade, persistindo do primeiro ao décimo quinto dia o mesmo quadro de solicitação de uma mesma situação exterior, isso tem de diminuir a culpa do agente, não distinguindo a lei quadros de solicitação de uma mesma situação exterior, nem catalogando uns como legítimos e outros como ilegítimos. IX - Com o devido respeito, no caso sub-judice, estão reunidos os requisitos da crime continuado que diminuem consideravelmente a culpa do recorrente. X - Reunidos todos os requisitos da continuação criminosa e tendo o Tribunal "a quo", considerado que isso, no caso concreto não diminuía de modo considerável a culpa do agente, violou o disposto no n° 2 do arf 30° do C. Penal. XI - Se o recorrente tivesse sido condenado pelo crime de abuso sexual de crianças na forma continuada e não pelo duplo crime de abuso sexual de crianças, por certo, teria uma pena menos pesada. XII - Uma vez que já está concluído o seu processo de expulsão para o país de origem (Brasil) por permanência irregular no território nacional e que já cumpriu cerca de oito meses de prisão, uma pena menos pesada podia levar à eventual suspensão da execução e ao seu imediato repatriamento . XIII - O recorrente, pessoa humilde, confessou os factos, colaborou com a justiça na descoberta da verdade, e em rigor, em julgamento, mostrou profundo arrependimento dos actos praticados. Pelo exposto...deve ser dado provimento ao presente recurso,,,". Respondeu a Dig.ma Procuradora da República na comarca de Almada a discordar do recorrente, porquanto os factos praticados e as circunstâncias em que o foram, nomeadamente a idade da vítima, revelam uma tendência da sua personalidade não conciliável com a diminuição da culpa por causa exterior. Requeridas alegações escritas nelas o recorrente defende a tese do crime continuado, posto que com menor ênfase, admitindo também que, mesmo sem tal construção, a pena lhe seja diminuída e suspensa. Por seu lado, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto neste Supremo Tribunal foi de opinião que ao recorrente assistiria razão quanto à qualificação jurídica dos factos, mas não quanto à medida da pena, sintetizando assim as suas doutas alegações: I - Foi a oportunidade e proximidade do agente com a menor que, de fora, e de maneira considerável, facilitou a repetição da actividade criminosa, tornando cada vez menos exigível ao agente que se comportasse de acordo com o direito e que lhe permitiu ser bem sucedido na sua actuação, executada de forma essencialmente homogénea. II - Mostra-se preenchido o crime na forma continuada, face ao preceituado no art. 30.2 do Cód. Penal. III - A pena de 3 anos e 6 meses de prisão é adequada à culpa do agente, acatando integralmente os critérios determinantes da sua medida concreta, assegurando com justiça as finalidades das...

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