Acórdão nº 02P4197 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Janeiro de 2003 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelCARMONA DA MOTA
Data da Resolução23 de Janeiro de 2003
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: Condenado/requerente: "A" 1. OS FACTOS O arguido era sócio-gerente de "B, Lda." à data de 16/12/98, tendo sido adjudicada a esta sociedade a obra de construção de edifício sito na Rua ..., em Rio Tinto, Gondomar, no que se refere às artes de trolha e pintura. Na mencionada data, decorriam na obra trabalhos de colocação de tectos falsos, a cargo de C, que tinha contratado para trabalhar consigo D. No referido dia, cerca das 18 h, D, que se encontrava no 5º piso do edifício, ao terminar o trabalho, dirigiu-se para as escadas a fim de seguir para casa. Àquela hora já não havia luz do dia e a obra não tinha iluminação, pelo que não "acertou" com as escadas, indo em direcção à abertura destinada ao elevador, situada mesmo ao lado, onde caiu, vindo a estatelar-se na sub-cave do edifício. Com efeito, a referida abertura não possuía qualquer protecção contra quedas, designadamente, barreiras de protecção e/ou sinalização, contrariando assim o disposto na legislação aplicável, nomeadamente o Regulamento de Segurança no Trabalho da Construção Civil, aprovado pelo Dec. Lei 49.408, de 24/11/69, o Dec. Lei 441/91, de 14/11, o Dec. Lei 155/95, de 1/7 e a Portaria 101/96, de 3/4. Da dita queda resultaram para D as lesões descritas nos autos de exame de fls. 56, 57 e 66, tendo ficado curado com deformação da perna direita e sofrido 60 dias de incapacidade total e 90 dias de doença. O ofendido recorreu a tratamento hospitalar. Ao arguido, na qualidade de sócio-gerente da sociedade à qual havia sido adjudicada a obra em curso, incumbia o dever de observar as normas legais respeitantes à segurança dos trabalhadores. Não obstante estar consciente dessa obrigação, A não verificou, nem fez verificar, a existência de barreiras de protecção contra quedas junto das aberturas destinadas ao elevador, e também não providenciou pela iluminação no interior do edifício, confiando que os trabalhadores não permanecessem na obra após o pôr do sol. Admitiu a possibilidade de se verificar o sucedido, mas actuou sem se conformar com tal hipótese. 2. A CONDENAÇÃO Com base nestes factos, o 1.º Juízo Criminal de Gondomar (1), em 05Nov01 (2), condenou A, por crime de infracção negligente de regras de construção (artº. 277º.1.a e 3º do CP), em 120 dias de multa. E isso porque, tendo-lhe sido adjudicada, «no que se refere às artes de trolha e pintura», a obra de construção do edifício sito na Rua ..., em Rio Tinto (Gondomar), não providenciou pela iluminação do local da obra nem pela protecção, contra quedas, do fosso do elevador, daí resultando que, no dia 16Nov98 (3), pelas 18:10, o operário D tenha, ao descer as escadas, caído, por aquele fosso, do 5º. piso para a sub-cave, ferindo-se e só vindo a ter alta, com 17/28% de IPP, em 31Ago99: O arguido vem acusado da prática de um crime de um crime de infracção de regras de construção, por negligência consciente, p. e p. pelo artº. 277º, nº 1, al. a) e nº 3, do C. Penal. Segundo o disposto no nº. 1, al. a), do artº. 277º, do Cód. Penal, "quem no âmbito da sua actividade profissional infringir regras legais, regulamentares ou técnicas que devam ser observadas no planeamento, direcção ou execução de construção, demolição ou instalação, ou na sua modificação (...) e criar, deste modo perigo para a vida ou para a integridade física de outrem, ou para bens patrimoniais alheios de valor elevado, é punido com pena de prisão de 1 a 8 anos". Dispõe o nº. 3, do mesmo artº.: "se a conduta referida no nº. 1 for praticada por negligência, o agente é punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa". Ora, em face da factualidade apurada, cabe questionar se a conduta do arguido integra a prática de um crime de infracção de regras de construção, na forma negligente. A negligência encontra-se tratada no artº. 15º do CP, o qual estabelece que: "Age com negligência quem, por não proceder com o cuidado a que, segundo as circunstâncias, está obrigado e de que é capaz: a) Representar como possível a realização de um facto que preenche um tipo de crime mas actuar sem se conformar com essa realização; ou b) Não chegar sequer a representar a possibilidade de realização do facto". Segundo a doutrina e a jurisprudência, a negligência traduz-se na omissão de um dever objectivo de cuidado ou de diligência. Como refere o ac. da RE de 04-02-92, "O conceito de negligência compreende, não só as situações em que se não cumpre um determinado dever jurídico prescrito em lei ou regulamento, como aquelas em que se não procede com a diligência que é um dever geral do cidadão" in CJ, 1992, I, p. 291. Por outras palavras, a violação cuja negligência supõe, consiste antes de tudo, em o agente não ter usado aquela diligência exigida...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT