Acórdão nº 02P4418 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 20 de Fevereiro de 2003 (caso NULL)
Magistrado Responsável | DINIS ALVES |
Data da Resolução | 20 de Fevereiro de 2003 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na 5.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça: I - No Tribunal Judicial da comarca de Vila Flor foram submetidos a julgamento, por tribunal colectivo: 1) A, casado, aposentado, filho de ... e de ..., nascido em 3/11/1940, na freguesia de Vilas Boas, daquela Comarca e residente na Rua ..., em Vila Flor, e 2) B, casado, aposentado, filho de ... e de ..., nascido em 6/5/1933, na freguesia de Vilas Boas, daquela Comarca e residente na Rua ..., Vilas Boas, Vila Flor, acusados pelo Ministério Público da seguinte forma: - o primeiro, A, da prática, em autoria material e concurso real, de um crime de dano e de um crime de ofensa à integridade física qualificada, ps. e ps., respectivamente, pelos artigos 212º, n.º 1, 143º n.º 1 e 146º, todos do Código Penal. - o segundo, B, da prática, em autoria material e concurso real, de dois crimes de ameaça, ps. e ps. pelo artigo 153º n.º 2, com referência ao n.º 1, do Código Penal. Pelo demandante C, que se constituiu assistente, foi deduzido contra aqueles arguidos pedido de indemnização civil, tendente a obter a condenação dos mesmos pelos danos alegadamente sofridos em consequência dos crimes de dano, ofensa à integridade física qualificada e ameaça. Por douto acórdão proferido em 31 de Janeiro de 2002, foi decidido, entre o mais, julgar a acusação parcialmente provada e procedente e o pedido cível parcialmente provado e procedente. E, em consequência: a) - absolver o arguido B da prática dos dois crimes de ameaça, p. e p. pelo art. 153º, n.º 2 do Código Penal por que vinha acusado. b) - absolver o arguido A da prática do crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelos arts. 143º, n.º 1 e 146º do Código Penal por que vinha acusado. c) - condenar o arguido A, pela prática, em autoria material, de um crime de dano p. e p. pelo art. 212º do C.P., na pena de cento e vinte (120) dias de multa, à taxa diária de cinco Euros (€5), o que perfaz a quantia global de seiscentos Euros (€600) e a que corresponde a prisão subsidiária de 80 dias. d) - absolver o arguido B do pedido de indemnização cível contra si formulado. e) - condenar o arguido A a pagar ao demandante cível a quantia de Esc. 128.700$00 (cento e vinte e oito mil e setecentos Escudos), acrescida de juros de mora à taxa legal contados desde 02-06-2001 até integral pagamento, a título de indemnização pelos danos patrimoniais sofridos em consequência do crime de dano de que foi vítima. II - 1) Inconformado com o assim decidido, recorreu o assistente C, que ao terminar a sua motivação, deixou exaradas as seguintes conclusões: A - OFENSA À INTEGRIDADE FÍSICA, QUALIFICADA OU SIMPLES? 1.º - A matéria de facto dada por provada no douto acórdão "a quo" consubstancia um crime de ofensa à integridade física qualificada p. e p. pelos arts. 146º, n.ºs 1 e 2, e 143º, n.º 1, do actual CP, e não apenas um crime de ofensa à integridade física simples p. e p. pelo art. 143º, n.º 1, do CP; 2.º - A navalha utilizada pelo arguido A constitui meio particularmente perigoso, porque dificultou significativamente a defesa do assistente e porque cria ou é susceptível de criar perigo de lesão de outros bens jurídicos importantes, designadamente a própria vida (cfr. Comentário Conimbricence, F. Dias, anotação ao art. 132º; Homicídio Qualificado, Teresa Serra, págs. 63 a 70; Ac. STJ, de 13DEZ00, CJ, Acs. STJ, Tomo III, 2000, págs. 241 e ss.); 3.º - As circunstâncias previstas no art. 132º, n.º 2, do CP (para que remete o art. 146º, n.º 2, do CP) não são de funcionamento automático. É necessário ainda que delas resulte uma especial censurabilidade ou perversidade; 4.º - No caso dos autos, a utilização de meio particularmente perigoso revelou especial censurabilidade; 5.º - Ao não entender assim, o douto acórdão recorrido violou o disposto nos arts. 146º, n.º 1 e 2, 143º, n.º 1, e 132º, n.º 2, al. g), do CP, por errada interpretação e aplicação; B - LEGÍTIMA DEFESA 6.º - Os factos dados como provados no douto acórdão recorrido não consubstanciam uma situação de legítima defesa por parte do arguido A; 7.º - A contenda entre arguido e assistente configura uma "participação em rixa" do art. 151º, n.º 1, do CP - cfr. Ac. STJ, de 13DEZ01, ainda não publicado, recurso n.º 3433/01, 5.ª Secção; 8.º - Porque aí cada um dos participantes é, simultaneamente, agressor e agredido, nunca poderá um participante na rixa exercer qualquer direito de legítima defesa, enquanto não abandonar, manifestamente, a rixa (Comentário Conimbricence, I - 324); 9.º - O arguido A não agiu, pois, em legítima defesa; 10.º - O arguido A preencheu, assim, com a sua conduta, os crimes de ofensa à integridade física qualificada (art. 146º, n.ºs 1 e 2, e 143º, n.º 1, do CP), e de participação em rixa (art. 151º, n.º 1, CP), em concurso aparente, numa relação de consumpção, devendo aplicar-se, naturalmente, o art. 146º, do CP (por prever a pena mais elevada) - Comentário, I - 327, §§ 43 e 45; 11.º - Ao não entender assim, o douto acórdão "a quo" violou o disposto no art. 32º, do CP - por errónea aplicação - e o art. 151º., n.º 1, CP, por não ter aplicado este dispositivo legal. C - Subsidiariamente, excesso de legítima defesa 12.º - Discordando do supra exposto, e considerando-se que o arguido A agiu em legítima defesa, sempre deverá entender-se que ocorreu excesso de legítima defesa (art. 33º, do CP); 13.º - O uso da navalha foi desproporcionado, desnecessário e excessivo para repelir a agressão do opositor que se encontrava desarmado; 14.º - O arguido deverá, por isso, ser punido em conformidade; 15.º - Assim não tendo entendido, o douto Acórdão "a quo" violou o disposto nos arts. 32º e 33º, do CP, por errada aplicação; 16.º - Impunha-se, pois, a condenação do arguido A pela prática do crime de ofensa à integridade física qualificada p. e p. pelo art. 146º, n.ºs 1 e 2, por referência ao art. 132º, n.º 2, todos do CP, ou, pelo menos, do crime de ofensa à integridade física simples (art. 143º, n.º 1, CP) e, em consequência, a condenação no pedido de indemnização civil deduzido nos autos. TERMOS EM QUE, E NOS QUE VOSSAS EXCELÊNCIAS SUPERIORMENTE SUPRIRÃO, DEVE CONCEDER-SE PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO E, EM CONSEQUÊNCIA, REVOGAR-SE O DOUTO ACÓRDÃO RECORRIDO NA PARTE EM QUE CONSIDEROU QUE O ARGUIDO A, PRATICANDO UM CRIME DE OFENSA À INTEGRIDADE FÍSICA SIMPLES, AGIU EM LEGÍTIMA DEFESA, DEVENDO, POR ISSO, SER O MESMO CONDENADO NOS PRECISOS TERMOS QUE SUPRA SE EXPUSERAM, EM PREITO À JUSTIÇA II - 2) Na sua resposta, o Ministério Público, concluiu por seu turno, pela forma que se transcreve: 1- Uma navalha com lâmina de 7 cm e cabo de 8 cm, não constitui meio particularmente perigoso para efeito do disposto nos art.s 146º, n.ºs 1 e 2, e 132º, n.º 2, al. g), ambos do Cód. Penal, por não possuir de forma superior à normal, a potencialidade para, segundo a experiência comum, causar lesão corporal susceptível de pôr em risco, de forma significativa a integridade física ou a vida. 2- Ademais quando a perigosidade dos instrumentos utilizados, a sua idoneidade ou potencialidade para causar lesões graves, não pode ser determinada apenas pelo instrumento em si mesmo, mas também, além do...
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