Acórdão nº 02P4628 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Abril de 2003 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelBORGES DE PINHO
Data da Resolução09 de Abril de 2003
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam os Juízes da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça: I 1. "A", devidamente identificado nos autos, por acórdão de 3.4.2002 (fls. 620 a 642) do Tribunal Colectivo do Círculo Judicial de Loulé (fls. 620 a 642 - proc. 205/98.2 - 1º Juízo Criminal) foi condenado, além do mais, pela prática de 3 crimes de abuso sexual de menor na forma continuada, p. p. pelos arts. 172, nº 1, 30 e 79 do C.P. nas penas de 3 anos de prisão, 1 ano e seis meses de prisão e 1 ano e seis meses de prisão, e, em cúmulo jurídico, na pena única de 4 anos e 6 meses de prisão, tendo-lhe sido declarado perdoado um ano da pena de prisão nos termos do art. 1, nº 1, da Lei 29/99, de 12 de Maio, ficando tal pena reduzida a 3 anos e 6 meses de prisão. O arguido foi absolvido dos pedidos cíveis. 2. Inconformado, interpôs o arguido recurso para este Supremo Tribunal de Justiça, tendo oferecido as motivações que se estendem de fls. 644 a 661, que concluiu: 1ª - Os crimes a que se refere o artº 178º,1 têm natureza semi-pública; no entanto, quando o interesse da vítima o impuser o M.P. poderá dar início ao procedimento criminal. 2ª - Esta faculdade concedida ao M.P. apenas terá lugar quando o direito de queixa não puder ser exercido porque a sua titularidade caberia apenas, no caso, ao agente do crime (cfr. 113º,5 C.P.). 3ª - Quando o M.P. usar desta faculdade deverá fundamentar a sua decisão especificando os respectivos motivos de facto que, em concreto, suportam a conclusão de que o interesse da vítima objectivamente impõe o procedimento criminal. 4ª - O artº 113º,3 do C.P. quando dispõe que o direito de queixa pode ser exercido pelo representante legal do menor de dezasseis anos, remete para o direito civil a determinação de quem é o representante e do modo como a representação é exercida. 5ª - Os progenitores de um menor não podem desempenhar individualmente a representação, a não ser quando a lei o permite; fora desses casos têm de agir de comum acordo e, se este faltar em questões de particular importância, como é o caso do exercício do direito de queixa, qualquer deles pode recorrer ao tribunal para resolução do desacordo dos pais (cfr. artº 1901º C.Civil). 6ª - No caso dos autos, pelas certidões de nascimento que se encontram juntas, todas as menores têm pai, não estando, em nenhuma delas o poder paternal atribuído a apenas um deles; por conseguinte, a representação das menores pertence a ambos os progenitores que tinham de agir de comum acordo, pelo que o exercício do direito de queixa relativamente aos crimes de que as menores foram vítimas tinha de ser exercido conjuntamente por ambos. 7ª - Nos presentes autos só as mães das menores exerceram o direito de queixa, sendo certo que nenhum pai se queixou (com, antes ou depois da mãe) como jamais exerceu, no decurso dos autos (nomeadamente, no prazo de 6 meses a contar da data em que teve conhecimento do facto e dos autos) o seu direito de queixa. 8ª - E sendo o direito de queixa exercido apenas por um dos progenitores, quando o devia ter sido por ambos, o M.P. não tem legitimidade para promover o respectivo procedimento criminal. 9ª - Não tendo sido exercido por cada um dos progenitores pais das menores o direito de queixa no prazo de 6 meses sobre a data do conhecimento dos factos, tal direito encontra-se prescrito o que arrasta consigo a prescrição do procedimento criminal pelos crimes de que o arguido vem acusado. 10ª - Tendo somente o arguido recorrido de decisão que o condenou e se na sequência desse recurso a audiência de prova vier a ser anulada, na nova audiência a que se proceda o arguido não poderá ser condenado em pena mais grave do que aquela que anteriormente lhe havia sido aplicada, sob pena de violação dos direitos e garantias fundamentais do arguido, consagrados no artº 32º,1 da Constituição da República e artº 61,1 h) do C.P.Penal, e ofensa do princípio da reformatio in pejus. 11ª - O princípio da reformatio in pejus constitui uma excepção ao regime dos efeitos das nulidades; isto é, em caso algum a sua declaração poderá conduzir a um agravamento da pena que haja sido aplicada ao arguido em julgamento anterior anulado. 12ª - A não se entender que não são procedentes a invocada ilegitimidade do M.P. e consequente prescrição do procedimento criminal e a invocada inconstitucionalidade por violação dos direitos e garantias do arguido e ofensa do princípio da reformatio in pejus, é entendimento do arguido que a pena que ora lhe foi aplicada é exagerada, uma vez que nesta 2ª audiência de produção de prova provaram-se menos factos e menos crimes do que naquela que foi anulada, sendo certo que nesta o arguido havia sido condenado em três anos de prisão suspensa na sua execução por igual período, pelo que a haver punição do arguido a pena deve manter-se naqueles limites. 13ª - O douto acórdão recorrido violou o disposto no artº 32º, nº 1 da Constituição da República, artº 178º nº 1 e 2, artº 113º nº 3, 5 e 6 do C. Penal e artºs 49º nº 1, 61º nº 1, al. h), 409º nº 1 do C.P.Penal. 14ª - O tribunal recorrido entendeu que o artº 178º nº 2 e artº 113º nº 6 do C.P. conferem legitimidade ao M.P. para promover o processo pelos crimes referidos no nº 1 deste mesmo preceito, quando tal factualidade só lhe é conferida quando a vítima não tenha representantes legais que devam em conjunto e por acordo exercer o direito de queixa, ou os representantes legais (ou apenas um deles) seja agente do crime (cfr. artº 113º nº 5 do C.P.). O tribunal recorrido interpretou ainda o disposto nos artºs 32º, nº 1 da Constituição da República e artºs 61, nº 1, al. h) e 409º nº 1 do C.P.Penal no sentido de que tais disposições não serão violadas quando em novo julgamento na sequência de anterior anulado, o arguido é punido em pena mais grave do que no primeiro, quando, na verdade, a proceder-se deste modo estar-se-á a violar o disposto no artº 32º nº 1 da Constituição da República e artº 61º nº 1, h) do C.P.Penal. 15ª - O tribunal recorrido deveria aplicar o disposto no artº 113º, nº 3 do C.P. no sentido de que é necessária a queixa do representante legal do menor de 16 anos, para que o M.P. promova o procedimento criminal e, no caso de serem ambos os progenitores os representantes do menor, deveria conjugá-lo com o disposto no artº 1901º do C. Civil no sentido de que se um dos progenitores - representante legal do menor - não estiver de acordo quanto ao exercício do direito de queixa a resolução de tal acordo é deixada aos tribunais. Termos em que deve ser dado provimento ao presente recurso e consequentemente revogado o acórdão recorrido, proferindo este Venerando Supremo Tribunal de Justiça acórdão em que seja declarada a ilegitimidade do M.P. para promover o procedimento criminal, conhecendo-se sequentemente da prescrição do procedimento criminal. Caso assim se não entenda deve conhecer-se da inconstitucionalidade resultante de terem sido violados os direitos e garantias do arguido consagrados nos artºs 32 nº 1 da Constituição e 61º, nº 1 al. h) do C.P.P. e ainda conhecer-se da violação do princípio da reformatio in pejus. Para o caso de tais entendimentos não procederem deve a pena que foi aplicada ao arguido ser limitada à que lhe foi aplicada no anterior julgamento (anulado), como, aliás, é de Direito e Justiça. 3. O MP junto da 1ª instância respondeu nos termos constantes de fls. 675 a 680, concluindo no sentido de ser negado provimento ao recurso, e confirmado o acórdão recorrido. 4. Neste STJ. foram os autos com vista ao Ex.mo Procurador Geral Adjunto no quadro do disposto no art. 416 do CPP, que se posicionou nos termos do exarado a fls. 707, não se opondo à produção de alegações escritas. Produzidas estas, o MP defendeu a manutenção do decidido (fls. 710 e 711), enquanto que o recorrente, reiterando o posicionamento por si já assumido nas motivações de recurso, e para a hipótese de não vingar o ponto de vista que exara, pugna pela aplicação da pena que havia sido aplicada no 1.º julgamento, e suspensa na sua execução (fls. 712 a 719). Colhidos os vistos legais, seguiu-se conferência para apreciação e decisão, pelo que importa agora apreciar e decidir. Apreciando.II 1. De acordo com...

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