Acórdão nº 02P473 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Março de 2002 (caso NULL)
Magistrado Responsável | SIMAS SANTOS |
Data da Resolução | 14 de Março de 2002 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:I1.1. A 8.ª Vara Criminal de Lisboa condenou, por acórdão de 18.10.2001, cada um dos arguidos A, B e C, todos com os sinais nos autos, pela prática, em co-autoria material, de 1 crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo art. 21.º, n.º 1 do DL n.º 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 5 anos de prisão e ainda o arguido B, pela prática de 2 crimes de falsas declarações, nas penas de 10 meses de prisão e 15 meses de prisão e, em cúmulo jurídico, na pena unitária de 5 anos e 9 meses de prisão. 1.2. Inconformada a arguida A , recorreu para este Supremo Tribunal de Justiça, concluindo na sua motivação: 1.º - A recorrente deveria ter sido condenada pela prática do tipo de crime traficante-consumidor, 2.º - Pois segurava a bolsa que continha os estupefacientes sem papel activo nas transacções que eram levadas a efeito, 3.º - Era fortemente dependente do consumo de estupefacientes 4.º - E segurava a bolsa que continha os estupefacientes por conta de um terceiro, de quem recebia, no final de cada dia, entre quatro a seis "quartas" de "heroína" e "cocaína", para consumo próprio. 5.º - A recorrente não segurava a bolsa com uma finalidade económica. 6.º - Ora, tais factos integram a prática de um crime previsto e punido pelo art. 26.º, n.º 1, 1.ª parte do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22/01, 7.º - E não a prática de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelo art.º 21.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22/01, 8.º - Pelo que existiu um erro na determinação da norma aplicável, o que deve ser objecto da necessária correcção. 9.º - Por outro lado, a recorrente considera que a pena de prisão de 5 anos é manifestamente desproporcionada. 10.º - Confrontando os factos, a intervenção e posição dos arguidos, as penas aplicadas, e as condições pessoais da recorrente não existiu a adequada ponderação e distinção dos diversos factores influentes na medida da pena. 11.º - A recorrente confessou os factos, 12.º - Era grande consumidora de estupefacientes, 13.º - Teve um papel passivo, 14.º - Era "paga" em estupefacientes para consumo, 15.º - Não tem antecedentes criminais, 16.º - É portadora do vírus H.I.V. 17.º - E tem tido bom comportamento no estabelecimento prisional. 18.º - Ora, todos estes factos deveriam ter levado o Meritíssimo Tribunal "a quo" a condenar a recorrente pelo limite mínimo, previsto no art.º 21.º, n.º 1. do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22/01, mostrando-se assim ajustada a pena de prisão de 4 anos. 19.º - Porém, idêntico raciocínio deverá ser aplicado se se considerar que a recorrente praticou o tipo de crime previsto no art.º 26.º, n.º 1, 1.ª parte do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22/01. 20.º - Existe assim uma discordância em relação à valoração dos factos que influenciaram a determinação da medida da pena, pelo que não houve violação de qualquer norma. 21.º - Ainda assim e em relação à recorrente, o douto Acórdão recorrido deveria ter considerado existirem circunstâncias que justificariam a atenuação especial da pena, 22.º - Pois, além dos factos expostos, a dependência de estupefacientes da arguida era desesperante, 23.º - Encontra-se actualmente em franca recuperação, 24.º - Demonstrou forte arrependimento 25.º - E forte determinação em levar uma vida sã e trabalhadora. 26.º - Estavam assim reunidos os necessários requisitos para atenuar especialmente a pena aplicável à ora recorrente, por diminuição acentuada da sua culpa e da necessidade da pena, o que não aconteceu. 27.º - Idêntico raciocínio deve ser aplicado se os factos praticados pela recorrente foram enquadráveis no art.º 26.º, n.º 1, 1.‘ parte do Decreto-Lei n.º 15/93. de 22/01. 28.º - Ao não ter atenuado especialmente a pena, o douto Acórdão recorrido violou o disposto nos art.ºs 72.º e 73.º do Código Penal. 1.3. Respondeu o Ex.mo Procurador da República, que concluiu: 1 - Improcede o recurso quanto à qualificação jurídico-criminal pretendida ( art. 26º n.º l DL 15/93), devendo manter-se o acórdão na parte em que subsume os factos ao art.21º n.º l do diploma, visto que a arguida recebia algum dinheiro, em contrapartida; 2 - Não se configuram os requisitos da atenuação especial da pena, pelo que não se mostram violados os arts. 72º e 73º CP; 3 - Deve ser dado provimento ao recurso, quanto à medida da pena, não repugnando a diminuição para quatro (4) anos de prisão, face à confissão e colaboração da arguida, em contraste com a atitude dos co-arguidos (condenados em idêntica pena de cinco anos). 1.4. Também o arguido C inconformado com a decisão condenatória recorreu para este Tribunal, concluindo na sua motivação: 1. A pena de prisão de 5 (cinco) anos é manifestamente desproporcionada; 2. Confrontando os factos com a perra aplicada e as condições pessoais do recorrente não existiu a adequada ponderação e distinção dos vários factores influentes na determinação da medida da pena; 3. O recorrente era tóxico-dependente profundo, consumindo grande quantidade da estupefacientes; 4. Era pago em estupefacientes para consumo próprio; 5. Não tem antecedentes criminais e 6.Tem tido bom comportamento no estabelecimento prisional. 7. Ora todos estes factos deveriam ter levado o Meritíssimo Tribunal a quo a condenar o recorrente no limite mínimo, previsto no art. 21.º, n.º l, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22/01, nos termos do art. 71º do C. P., mostrando-se assim ajustada a pena de prisão de quatro anos. 1.5. Respondeu novamente o Ex.mo Procurador da República, que concluiu: 1 - O recurso deve ser rejeitado nos termos do art. 420.º n.º 1 CPP, pois versando matéria de direito - medida da pena - não obedece ao disposto no art.412º nº2 do mesmo diploma; 2 - A não se considerar assim, e porque a toxicodependência, só por si, não diminui a ilicitude do facto, a pena de cinco anos de prisão cominada, dentro da moldura penal do crime em apreço (quatro a doze anos) afigura-se justa e adequada; 3 - Deve ser negado provimento ao recurso e manter-se a decisão.IINeste Supremo Tribunal de Justiça, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto promoveu a realização de audiência. Colhidos os vistos legais teve lugar audiência em que foram produzidas alegações orais nas quais o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto, sustentou, em síntese, que a situação retractada nos autos, no domínio da culpa dos agentes, não fica muito longe da situação prevista no art. 26.º do DL n.º 15/93, o que deve encontrar reflexo na medida da pena. Em nome da punição do flagelo da droga, numa situação em que o «flagelador» permaneceu por identificar, não pode aquela punição exemplar recair sobre agentes como os recorrentes que mais se apresentam como «flagelados». Daí que se aceite a atenuação especial na pena quanto à recorrente e na diminuição da pena quanto ao recorrente. A defesa manteve as posições assumidas em sede de motivação de recurso. Cumpre, pois, conhecer e decidir.IIIE conhecendo. 3.1.1. Suscita a recorrente A duas questões: A questão da qualificação jurídica da sua conduta, pois deveria ter sido condenada pela prática do tipo de crime traficante-consumidor do art. 26.º, n.º 1, 1.ª parte do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22/01 (conclusões 1.ª e 6.ª), com erro na determinação da norma aplicável (conclusão 8.ª) pois segurava a bolsa dos estupefacientes, sem finalidade económica (conclusão 5.ª) por conta de um terceiro, de quem recebia, no final de cada dia, entre quatro a seis "quartas" de "heroína" e "cocaína", para consumo próprio (conclusão 4.ª) mas não tinha papel activo nas respectivas transacções (conclusão 2.ª), sendo fortemente dependente do consumo de estupefacientes (conclusão 3.ª). E a questão da medida...
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