Acórdão nº 02P851 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Maio de 2002 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelDINIS ALVES
Data da Resolução02 de Maio de 2002
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇAI1. Por acórdão da 4ª Vara Criminal do Porto, de 21 do Dezembro de 2000, o arguido A, casado, agente da PSP aposentado, nascido a 17/03/1936, foi condenado pela prática, em autoria material, de um crime de homicídio, na forma tentada, prevista e punido pelo artº. 131º, com referência aos artºs. 22º, 23º e 73º, todos do Cód. Penal, na pena de quatro (4) anos de prisão. 2. Mais foi condenado a pagar ao demandante B a importância de 3500000 escudos, acrescidos de juros à taxa legal, a contabilizar desde 29 de Dezembro de 1999 e até integral pagamento. 3. Inconformado, o arguido interpôs recurso para o Tribunal da Relação do Porto, onde impugnou a matéria de facto provada, invocando designadamente a ocorrência de erro notório na apreciação da prova (artº 410º nº 2 al. c) do Cod. Proc. Penal; impetrou uma dupla atenuação especial da pena e a sua fixação em limite possibilitante da suspensão da respectiva execução; considerou ainda desproporcionado o montante da indemnização atribuída ao ofendido/demandante. 4. Este Venerando Tribunal, por douto acórdão de 24 de Outubro de 2001 (fls. 321 - 326) decidiu: a) - Rejeitar o recurso relativo à matéria de facto; b) julgar improcedente o recurso relativo à matéria de direito; c) Julgar improcedente o recurso interposto da parte cível do acórdão.II A. Ainda inconformado, o arguido interpôs o presente recurso em cuja motivação extraiu as seguintes conclusões:1°Foi o ora recorrente condenado, pela prática, em autoria material, dum crime de homicídio, na forma tentada, na pena de 4 anos de prisão;2°Contudo, entende-se que se verificou uma incorrecta determinação da moldura penal;3°De facto, a moldura penal abstracta para o crime de homicídio tentado é de 1 ano, 7 meses e 6 dias a 10 anos e 8 meses de prisão;4°Ao determinar-se a pena para o caso concreto, essa deverá ser especialmente atenuada, nos termos do artigo 72° e 73° do Código Penal;5°O Tribunal ao determinar a medida concreta da pena, não valorou nenhuma destas circunstâncias plasmadas no artigo 72º, do Código Penal, e ao não fazê-lo violou os princípios ínsitos nos artigos 70º, 71º, 72° e 73°, todos do Código Penal.6°O tribunal deu como provado que o ora recorrente se envolveu numa disputa verbal com um grupo de jovens, do qual fazia parte o ofendido, tendo aquele sido injuriado com o impropério "ó corno anda cá abaixo", predicado que na zona em apreço e segundo as regras da experiência constitui insulto de elevado vulto;7°Mais se provou em sede de determinação da medida da pena que os motivos que estiveram na base do ilícito praticado pelo ora recorrente se prendem com o barulho que o ofendido e seus acompanhantes então faziam, o que gerou a subsequente disputa verbal, com alguma "provocação"ao arguido por parte destes;8ºDesta forma, pode concluir-se que agiu o arguido movido por "provocação injusta ou imerecida" nos termos e para os fins do disposto na alínea b), do n.º 2, do artigo 72°, do C. P.;9°O Acórdão do STJ de 13/11/91, publicado no BMJ 411-231, mostra-se paradigmático ao condicionar o funcionamento daquele inciso, à coexistência de alguns pressupostos;10º-No caso dos autos, os impropérios dirigidos ao arguido, nomeadamente apelidando-o de "corno"- predicado que na zona em apreço, constitui segundo as regras da experiência, insulto de elevado vulto - constituem, sem dúvida alguma, uma situação provocatória. E o - certo é que a matéria dada como provada espelha que o arguido actuou em estado de ira, dor ou exaltação e que tais sentimentos foram o motor da sua conduta.11°De referir que o arguido tinha à data da prática dos factos 59 anos de idade, é casado, pai e avô, cresceu e foi educado num contexto sócio - cultural austero / autoritário, pelo que, ser apelidado de "corno" constitui para uma pessoa com estas características uma afronta à sua dignidade pessoal e moral, daí que tenha ficado, após semelhante insulto, num estado de ira, exaltação.12ºPara além da supra referida circunstância atenuativa, o Tribunal a quo deveria ter valorado, em sede de determinação da medida concreta da pena, a circunstância prevista na alínea d), do n.º 2, do artigo 72°, do Código Penal.13°Como fundamento da atenuação especial, exige-se nesta alínea, cumulativamente, o decurso de muito tempo sobre a prática do crime e a manutenção de boa conduta por parte do agente.14°Deste modo, no presente caso, deve-se atenuar especialmente a pena, nos termos dos artigo 72°, n.ºs 1 e 2, alíneas b) e d), e 73º, n.º 1, do CP, e, tendo em conta o critério circunstâncias mencionados no artigo 71° do mesmo diploma, deve-se aplicar ao arguido uma pena não superior a três anos;15°O Tribunal, ao determinar a medida concreta da pena, deveria ter atenuado especialmente pena, tendo em atenção as circunstâncias acima elencadas;16°Na verdade, o Tribunal deveria, antes da determinação da medida concreta da pena, ter procedido a uma dupla atenuação especial, pois tal situação não viola o Princípio da Proibição da Dupla Valoração, que se encontra consagrado no artigo 72°, n.º 3, do Código Penal;17°Efectivamente, se o Tribunal tivesse procedido a uma dupla atenuação especial da medida da pena, tal implicaria uma alteração dos limites da pena aplicável, nos termos do artigo 73° n.º 1, alíneas a) e b), do Código Penal, pelo que a medida da pena teria como limite máximo 7 anos, 1 mês e 10 dias, e limite mínimo 1 mês;18°Desta forma, tendo em linha de conta esta moldura penal abstracta, entende o ora recorrente que a pena concreta deveria ter sido fixada em medida igual ou inferior a três anos;19°Ao ter decidido em contrário, ignorando todas as circunstâncias que militavam em favor do arguido, inclusive, a que se procedesse à suspensão da execução da pena, violou o douto Acórdão recorrido o disposto no artigo 50°, do Código Penal;20°Considerando o consignado no artigo 71º do Código Penal, se ao recorrente tivesse sido aplicada uma pena não superior a três anos, estariam verificados os dois pressupostos cumulativos e necessários, para, in casu, se suspender a execução da pena de prisão;21°Porém. atendendo ao muito tempo decorrido após a prática da infracção - quase 6 anos - e à boa conduta do - recorrente, não faz sentido nesta altura, o cumprimento efectivo da pena, sendo suficiente a simples censura do facto e a ameaça da pena para afastar o delinquente da criminalidade e satisfazer as necessidades de reprovação e prevenção do crime;22°Assim, e atendendo ao supra alegado, deverá ser aplicada ao arguido uma pena não superior a três anos, suspensa na sua execução por igual período;23°Por sua vez, entendeu, o douto acórdão recorrido, que a indemnização atribuída ao demandante lesado mostra-se equilibrada e ajustada;24°Porém, o Tribunal não valorou devidamente os danos sofridos pelo demandante;25°Na verdade, tendo como ponto de referência os quesitos formulados pelo demandante e o relatório elaborado pelo Instituto de Medicina Legal do Porto, temos que: o quantum doloris foi qualificável no grau 4 e o demandante não ficou com qualquer sequela que lhe determine incapacidade permanente para o trabalho;26°Não ficou provado que o demandante, em virtude da ofensa física que lhe foi infligida, pelo disparo de uma arma de fogo, tenha ficado com o seu crescimento e desenvolvimento normais seriamente afectados;27°Que as lesões que lhe foram infligidas lhe deixaram sequelas graves que se reflectem na sua saúde e o impedem de usufruir de uma vida normal; que a segmentação do seu intestino delgado tem consequências ao nível do regular funcionamento do aparelho digestivo e que tenha ficado com alguma incapacidade funcional permanente;28°Efectivamente, o demandante, um jovem de 21 anos de idade, não padece de nenhuma incapacidade permanente para o trabalho, nem tem nenhuma sequela funcional, pelo que pode levar uma vida normal, sem qualquer tipo de restrições;29°Porém, esqueceu-se o Tribunal de referir que o demandante disse em audiência de discussão e julgamento que gostava de andar de mota, ver filmes de acção, nomeadamente de luta, sai com os amigos, ir ao café, demonstrando dessa forma, que a sua vida é tão normal como de qualquer outro jovem;30°Apesar de tais factos não serem alegados em sede de motivação para determinação do quantum indemnizatório, rapidamente se extrai da expressão "algo afectados" que demandante leva uma vida perfeitamente normal e igual à de um jovem da mesma idade;31°Assim, atendendo a que estamos perante uma ofensa à...

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