Acórdão nº 02S347 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 24 de Outubro de 2002 (caso NULL)

Data24 Outubro 2002
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1. Relatório A, B e C intentaram, no Tribunal do Trabalho de Lisboa, contra D (doravante designada por .....) e E (doravante designada por .......), a presente acção de condenação, com processo ordinário, pedindo que: (i) se declare que os autores têm direito a retribuição mensal constituída por vencimento base, acrescida das diuturnidades, bem como pela média mensal de 40908$00 a título de trabalho em dia de descanso; pela média mensal de 21300$00 a título de trabalho nocturno; pela média mensal de 23430$00 a título de trabalho suplementar; pela quantia mensal de 10000$00 a título de concessões de viagem por transporte de mercadorias; pela quantia mensal de 20000$00 por impossibilidade de viajar gratuitamente em autocarros substitutivos da circulação ferroviária; pela quantia de 100000$00 a título de concessões de viagens nacionais, dado a F, sua entidade patronal, estar legalmente proibida de ter comboios, o que determina a impossibilidade, decorrido um ano após a cessação da relação laboral, de circular gratuitamente nos comboios em território nacional; pela quantia de 30000$00 a título de concessões de viagens internacionais (nos países da UIC); pela quantia mensal de 50000$00 a título de casas de habitação; pelo subsídio de refeição no valor de 25650$00; pelo prémio de produtividade diário, no valor mensal de 32994$00, e anual no valor de 80652$00; e pela quantia mensal de 24300$00 a título de deslocações; até que se verifique a integral regularização, tudo acrescido das anuais e sucessivas actualizações decorrentes da contratação colectiva; (ii) as rés sejam condenadas solidariamente, além do peticionado no ponto anterior e por via do mesmo, a efectuar o pagamento, a título de prestações vencidas e não pagas, da quantia de 20859852$00 (6953284$00 para cada um dos autores), bem como 34,75% sobre o mesmo montante para efeitos de entrega à Segurança Social e ainda os juros legais vencidos e vincendos, contados da citação, até integral pagamento, acrescidos da taxa de 5% por se tratar de retribuições, sobre todas as quantias peticionadas; e (iii) as rés sejam solidariamente condenadas à manutenção das funções, no cumprimento do dever de ocupação efectiva, na manutenção de todos os benefícios sociais relativos a jardins de infância, colónias de férias, casas de habitação, concessões de viagens nacionais e internacionais, bem como na quantia de 40 000$00 a reverter para cada autor a título de sanção pecuniária compulsória, por cada dia em que, por qualquer forma, por acto ou omissão imputável a qualquer título a qualquer das rés, cada um dos autores seja impedido de exercer todos os direitos e usufruir de todos os benefícios adquiridos na D e garantidos através do Decreto-Lei n.º 104/97, de 29 de Abril, nomeadamente no seu artigo 16.°. Alegaram, em suma, que: (i) foram admitidos ao serviço da D em 1994, 1975 e 1988, respectivamente, para trabalharem sob as suas ordens, direcção e fiscalização, exercendo as funções de chefe de brigada (os 1.° e 3.° autores) e de contramestre (o 2.°); (ii) sucede que, com efeitos reportados a 1 de Janeiro de 1999, foram integrados na F, empresa pública entretanto criada pelo Decreto-Lei n.º 104/97, de 29 de Abril, para exploração da infraestrutura integrante da rede ferroviária nacional, anteriormente pertencente à D; (iii) desde a sua integração na F, e até já anteriormente, têm-lhes sido retirados alguns dos direitos e regalias que detinham enquanto trabalhadores da D. As rés contestaram (a D a fls. 55 a 72 e a F a fls. 100 a 128), por excepção e por impugnação: - a D alegou a sua ilegitimidade, por efeito automático da criação da F, na qual os autores foram integrados, desde 1 de Janeiro de 1999, com a manutenção dos direitos e regalias decorrentes da lei, de instrumentos de regulamentação colectiva ou dos contratos individuais, contando-se o tempo de serviço prestado anteriormente; ocorreu, assim, por via do referido Decreto-Lei, uma sucessão legal de empresas, deixando a D de ser entidade patronal dos autores e titular da relação material controvertida; - a F, por seu lado, alegou que, a partir de 1 de Janeiro de 1999, assumiu a posição jurídica da D, sucedendo a essa empresa na qualidade de entidade patronal dos autores, mas não assume a responsabilidade pelos créditos reclamados pelos autores que se tenham constituído e vencido anteriormente à sua integração na F, ou seja, na pendência da relação laboral que mantinham com a D, e cujos pedidos venham a proceder

Frustrada tentativa de conciliação (fls. 223 e 224), foi proferido despacho saneador e elaborada a especificação dos factos assentes e da base instrutória (fls. 270 a 285), tendo naquele despacho sido a D julgada parte ilegítima, com a seguinte fundamentação: "A legitimidade traduz-se no interesse directo da parte em demandar ou contradizer e resulta, para o autor, da utilidade derivada da procedência da acção, e, para a ré, do prejuízo que dessa procedência advenha (cfr. artigo 26, n.s 1 e 2, do Código de Processo Civil)

In casu, a discutida legitimidade da 1.ª ré - D - decorreria do interesse directo em contradizer inerente à qualidade que lhe é imputada e que a responsabilizaria pelas prestações reclamadas, nos termos em que pelos autores é configurada a relação controvertida, isto é, por respeitarem tais prestações ao período que decorreu desde a altura em que os mesmos ainda desempenhavam subordinadamente ao seu serviço as funções correspondentes às respectivas categorias profissionais, o que fizeram até 1 de Janeiro de 1999, data em que a 2.ª ré - E - assumiu, por sucessão estabelecida pelo Decreto-Lei n.º 104/97, de 29 de Abril, a posição jurídica que para ela (1.ª ré) decorria dos contratos de trabalho celebrados com esses trabalhadores

Vejamos: Como resulta do preâmbulo do citado Decreto-Lei n.º 104/97, de 29 de Abril, e do seu artigo 2, com intuitos de modernização da política e da estrutura de transportes ferroviários, de agilizar a realização e a gestão dos investimentos na infraestrutura ferroviária e de proceder à racionalização económica do funcionamento do sector de transportes, decidiu o Governo separar e distinguir as actividades de transporte ferroviário e as actividades de gestão da infraestrutura ferroviária

Foi, assim, criada a F, EP, com o objectivo principal de prestação do serviço público de gestão da infra-estrutura integrante da rede ferroviária nacional, dotando-a de património próprio e com personalidade colectiva de direito público

Quanto ao património e bens dominiais da nova empresa (F, EP), foi regulado pelo artigo 11 do Decreto-Lei n.º 104/97, de 29 de Abril, recebendo a universalidade dos bens, direitos e obrigações na titularidade ou de responsabilidade do Gabinete do Nó Ferroviário de Lisboa, do Gabinete do Nó Ferroviário do Porto e do Gabinete de Gestão das Obras de Instalação do Caminho de Ferro na Ponte sobre o Tejo em Lisboa, que foram extintos, sucedendo universalmente a F, EP, quanto aos bens, direitos e obrigações respectivos

Também as infraestruturas afectas à D, são transferidos para a F, EP, sem alteração de regime - cfr. artigo 11, n. 2, do Decreto-Lei n.º 104/97, de 29 de Abril

Rege o artigo 14.º daquele Decreto-Lei que a F, EP, sucede universalmente na posição jurídica, contratual ou não, dos referidos Gabinetes, nomeadamente no que respeita aos contratos por eles celebrados

E quanto à posição jurídica da D, também a F, EP, lhe sucede, quer essa posição jurídica seja contratual ou não, prevendo-se a celebração de protocolos a celebrar entre as referidas entidades, de acordo com o faseamento definido no artigo 10.º do mesmo diploma legal, os quais identificarão as posições jurídicas a transmitir

O pessoal da D, que à data da efectivação das transferências previstas no artigo 10.º se encontre afecto aos serviços e instalações transferidos é integrado na F, EP - cfr. artigo 16.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 104/97, de 29 de Abril

Os direitos e regalias dos trabalhadores serão acautelados, contando-se o tempo de serviço prestado anteriormente - cfr. artigo 16, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 104/97, de 29 de Abril

Nos termos do n.º 5 daquele normativo, «a F, EP, e a D - D, acordarão, por forma que não ponha em causa o cumprimento do disposto no número anterior, as eventuais contrapartidas que serão devidas por cada uma relativamente a obrigações a cumprir perante os respectivos trabalhadores ou a regalias a manter ou conceder aos mesmos, cujo exercício se efective total ou parcialmente perante a outra»

Da análise do referido decreto-lei, apesar das eventuais responsabilidades perante os autores poderem ter nascido antes da criação da F, EP, ou seja, na relação jurídica em que eram sujeitos a D, e os demandantes, ressalta que foi vontade e determinação da entidade instituidora (o Governo) que a nova empresa criada (a F, EP) assumisse direitos e obrigações, dentro do seu âmbito e objecto, ainda que nascidos antes da sua criação, pelo que, se tais direitos e obrigações entraram para a esfera jurídica da D, passaram, por sucessão, para a esfera jurídica da F, EP

Estamos perante o poder de heterotutela do Governo sobre as empresas públicas que cria para prossecução de fins...

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