Acórdão nº 03A592 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Março de 2003 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelAFONSO CORREIA
Data da Resolução18 de Março de 2003
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça "A", com sede em Cova do Sapo, freguesia de Carragosela, concelho de Seia, instaurou acção declarativa de condenação, com processo ordinário contra: B , com sede na Rua ..., 52 - 1259 Lisboa, pedindo a condenação da Ré a pagar-lhe a) - a quantia de Esc. 28 530 000$00 a título de dano emergente, b) - acrescida de juros à taxa comercial desde 31 de Dezembro de 1998, somando os vencidos à data da propositura da acção a quantia de 3.625.687$00, e vincendos, até efectivo pagamento e c) - a quantia de 15000000$00 a título de lucros cessantes, também acrescida de juros desde a citação até efectivo pagamento. Alegou para tanto, em síntese, que: A Ré celebrou com C um contrato de seguro do "Ramo ... Líder Industrial. Nos termos do contrato, a Ré assumiu e aceitou transferir para si o risco dos danos no edifício fabril do segurado, no seu conteúdo e nos bens refrigerados, até ao capital de 170.500. 000$00. Sucede que no dia 16 de Outubro de 1998, em virtude do disparo do disjuntor de controle de fornecimento de energia à câmara frigorífica, aquele fornecimento foi interrompido. Em consequência da interrupção do fornecimento de frio à câmara, a elevação da temperatura no seu interior levou à deterioração de todo o queijo em regime de cura, aí conservado e armazenado. Desse facto resultaram prejuízos para a Autora, dos quais se pretende ver ressarcida pela Ré, nos termos do contrato de seguro. A Ré demorou mais que o necessário a mandar desocupar a câmara frigorífica dos queijos avariados. Com tal comportamento impediu a A. de utilizar a dita câmara e fabricar trinta mil quilos de queijo, o que significa um prejuízo de quinze mil contos, à razão de quinhentos escudos de lucro por quilo. Citada, a Ré contestou, invocando desde logo a nulidade do contrato de seguro por ter havido falsas declarações, por parte do tomador de seguro. Na verdade, da proposta de seguro resulta que a manutenção da instalação de refrigeração é assegurada por um engenheiro técnico particular e que a mesma se encontra equipada com um sistema automático ou, pelo menos, manual de registo de temperaturas, bem como a periodicidade de controlos das temperaturas é diária. Veio a verificar-se que tal não corresponde à verdade. Mais refere a Ré que se o sinistro tivesse sido detectado num efectivo controlo diário, o produto acondicionado não teria ficado deteriorado, como aconteceu. Termina, pedindo a improcedência da acção mediante a declaração de nulidade do próprio contrato de seguro, nos termos do art. 11º das Condições Gerais da Apólice, além de que da petição não constaria qualquer suporte documental dos lucros cessantes reclamados. Replicou a A. para afirmar que a Ré só aceitou a proposta de contrato depois de mandar um técnico seu analisar o risco e vistoriar todas as infraestruturas da fábrica; que a Ré continuou a cobrar o prémio referente a anuidades posteriores, o que equivale a renúncia de arguição de quaisquer nulidades, vícios ou omissões e à sua sanação. Além de que caducou o direito de pedir a anulação do contrato decorrido mais de um ano depois do conhecimento, pela Ré, do sinistro. Saneado e condensado o processo, sem reparos, foi mandado aditar à matéria assente o facto vertido na al. X (fs. 113 - cobrança de novo prémio entretanto vencido), procedendo-se em devido tempo a julgamento com decisão da matéria perguntada no questionário, ainda sem reclamações. Após alegações de direito pela Autora, proferiu o Ex.mo Juiz sentença que condenou a Ré a pagar à A. a quantia de 28.530.000$00, valor da mercadoria deteriorada, com juros desde 12.11.98 até integral pagamento, à taxa aplicável por força do art. 559º do CC, mas absolveu-a do pedido de indemnização por lucros cessantes. Apelaram ambas as Partes: - A Autora a insistir na condenação nos juros comerciais, como pedido, e não à taxa dos juros civis, como sentenciado, bem como na indemnização por lucros cessantes de que a Ré fora absolvida; - A Ré a arguir a sentença de nula por falta de fundamentação de facto e de direito, mas sempre pugnando pela total improcedência da acção por falta de prova do sinistro e por culpa da A. na verificação do evento que, por isso, deixou, praticamente, de ser aleatório. Como se vê da alegação que coroaram com as seguintes Conclusões A - Da Ré 1. A sentença recorrida eximiu-se de fundamentar os pressupostos da responsabilidade civil transferida para a ora apelante por via do contrato de seguro, abstendo-se de nomear, a esse respeito, qualquer norma e de aplicar sequer as normas jurídicas correspondentes à subsunção dos factos; 2. Violou, assim, a M.ma Juiz a quo o disposto nos arts. 659°, nos. 2 e 3 do C.P.C., o que faz que a sentença seja nula, nos termos do art. 668°, n.º 1, al. b) do C.P.C. 3. Foi a própria recorrida, enquanto lesada, que alegou as causas do evento danoso verificado e que correspondem aos quesitos 2° e 3°, os quais foram dados como não provados; 4. A ora recorrida não logrou provar assim a causa que permitiu que uma das câmaras da cave tivesse deixado de funcionar, referindo a própria resposta aos quesitos, na sua fundamentação, que não foi possível apurar com certeza qual a causa do disparo do disjuntor, 5. Não tendo a ora recorrida provado a causa do evento, não pode a douta sentença presumir que a causa do evento foi uma avaria ou colapso súbito e inesperado da instalação de refrigeração, para aplicar a alínea a) do n.º 1 do Risco 22 das Condições Gerais, na medida em que isso não está provado em lado algum; 6. O facto de uma câmara de frio se desligar, sem se saber quando se desligou e porque se desligou, viola a própria verificação dos pressupostos da responsabilidade civil, tanto mais que, neste caso, a seguradora não garante a responsabilidade civil por actos ilícitos, mas sim uma responsabilidade puramente objectiva ou seja pelo risco; 7. Os casos previstos nas diversas alíneas do Risco 22 são hipóteses de responsabilidade objectiva só verificáveis se não houver culpa do lesado e não independentemente de culpa; 8. As condições deficientes em que a própria lesada laborava, constantes das respostas aos quesitos 5° a 10°, demonstram a inequívoca culpa da ora apelada na verificação do evento, o que afasta, só por si, a responsabilidade da ora apelante; 9. Deste modo, a douta sentença violou o disposto nos arts. 483°, n.º 2 e 499° do Código Civil, bem como violou o disposto no art. 516° do C.P.C., já que a dúvida sobre a realidade dum facto e sobre a repartição do ónus da prova resolve-se contra a parte a quem o facto aproveita, ou seja, contra a ora recorrida. 10. Da matéria de facto dada como provada resulta que houve um evento danoso, mas não um sinistro. 11. Nas condições em que a ora recorrida apelada tinha as suas instalações, à data do sinistro, nomeadamente as suas câmaras de frio, como resulta dos factos provados sob as alíneas Z) a D'), era por demais previsível que o evento danoso tivesse lugar; 12. O contrato de seguro tem por objecto garantir riscos seguráveis porque aleatórios, futuros, incertos, imprevisíveis e acidentais e não garantir riscos cuja previsibilidade é mais do que certa e verificável; 13. A ora recorrida ao ter, na data do sinistro, propiciado a ocorrência do...

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