Acórdão nº 03P979 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Maio de 2003 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelFLORES RIBEIRO
Data da Resolução07 de Maio de 2003
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça : No Tribunal de Judicial da Comarca de Arcos de Valdevez responderam, em processo comum e perante o tribunal selectivo, os arguidos A, B e C. Todos devidamente identificados nos autos, avisados pelo Ministério Público da prática, em co-autoria material, de um crime de homicídio qualificado, p. e p. pelo auto 131º e 132º, nº1 e 2, als. b), c), d), g) e I) do Cód. Penal. A assistente D deduziu pedido de indemnização civil contra os arguidos por danos patrimoniais e não patrimoniais no montante de 30.266.000$00. Realizada a audiência de julgamento, vieram os arguidos A e B a ser condenados pela prática, em co-autoria, de um crime de ofensa à integridade simples, p. e p. pelo artº 143º, e nº1 do C.P., respectivamente nos prazos de 1 ano e 5 meses de prisão e 1 ano de prisão ; e o arguido C, como autor material de um crime de homicídio qualificado, p. e p. pelo artº 132º, nos. 1 e 2 al. c), do C.P. na pena de 16 anos de prisão. Quanto ao pedido da indemnização foram os demandados condenados a pagar à demandante a quantia de 16.266.000$00, sem juros de mora, sendo o demandado A solidariamente responsável até á quantia de 3000.000$00 e o demandado B solidariamente responsável até á quantia de 200.000$00 . Desta decisão interpuseram recurso a assistente D e o arguido C para o S.T.J.. Por acórdão de 18.11.02, o Tribunal da Relação de Guimarães negou provimento ao recurso do arguido e julgou parcialmente procedente o da assistente, condenando o arguido C a pagar á demandante a quantia de 96.098.40 Euro, sendo o arguido A e B solidários naquela condenação, com o C até ao montante de 12.469.90 Euro. Irresignado uma vez mais, o arguido C recorre de novo, para este Supremo Tribunal. Da motivação apresentada, extraí as seguintes conclusões: "1. O Tribunal a que condenou e o Tribunal da Relação confirmou a condenação do arguido pela prática do crime de homicídio qualificado p. e p. pelos arts. 131º e 132º al. c) do C. Penal . 2. Vem o presente recurso dessa decisão, porquanto dos factos dando como provados, que se aceitam, não decorre, em qualquer momento, a intenção ou sequer eventual informação do arguido de poder vir a ocorrer, como consequência possível das suas agressões, a morte da vítima, ou seja, deveria ter o douto Tribunal da Relação dando movimento ao recurso apresentado pelo recorrente, por forma a que a sua conduta fosse integrada na prática de um crime de ofensa á integridade física grave e qualificada, agravada pelo resultado, p. e p. nos termos do disposto nos artigos 144º, al. d), 145, nº1 al. b) e 146 tidos do Cód. Penal. 3. Em audiência de discussão e julgamento provou-se que o arguido pretendeu agredir as vítimas, pretendeu "dar-lhe uma sova"... Isto é, pretendeu feri-lo no seu corpo; ou, em terminologia jurídica, pretendeu ofender a integridade física da vítima. 4. A única intenção do arguido foi, sempre, a de infringir uma punição na vítima, que entendia merecida por um facto de que havia tomado recente conhecimento: "O "E" mantinha relações sexuais com a sua filha F, uma criança de 13 anos . 5. O resultado da "sova" que o arguido deu á vítima excedeu a sua intenção - a vítima morreu (crime preterintencional). 6. Porque absoluta a ausência de dolo de morte, não cometeu o arguido C o crime de homicídio por que foi condenado. 7. O delito que o arguido, ora recorrente, desejou e executou apenas pode ser judicialmente enquadrado no tipo legal as ofensas à integridade física grave». O resultado morete deveu-se às lesões traumáticas crânio-encefálicas (...), ou seja, O E morreu em virtude de uma hemorragia craniana interna, não constatável por ninguém. 8. Não se provou que: "O arguido C tivesse actuado sem a intenção de produzir a morte de E (dolo directo)", nem que "o mesmo arguido tivesse representado a morte do E como uma consequência possível da sua conduta e se tivesse conformado com tal resultado (dolo eventual)". 9. Esta premissa é determinante para o enquadramento jurídico dos factos praticados pelo arguido, afastando terminantemente o dolo de homicídio da conduta deste, razão pela qual jamais poderia a prática dos factos pelos quais foi condenado ser integrado no crime p. e p. no art. 132 do C. Penal. 10. Antes importando inequívoca imputação da morte de E a título do resultado, concretização de negligente, concretização do perigo abstracto indissociável ou inerente à prática de uma qualquer ofensa à integridade física. 11. Pelo exposto, mal andou o Tribunal a quo ao não integrar a conduta do ora recorrente na prática do crime de ofensa à integridade física grave e qualificada, agravada pelo resultado (negligente) morte, prevista e punida pelas disposições conjugadas dos artigos 144º, 145º e 146º, todos do Cód. Penal, que resultam assim frontalmente violadas. 12. Pois o arguido não previu, não desejou, nem tão pouco configurou a hipótese de matar a vítima. 13. Pelo que, impunha-se ao Tribunal a quo, de acordo com todos os factos constantes dos autos, bem como pela leitura conjugada dos artigos 144º, 145º e 146º do C. Penal ter qualificado diferentemente do que fez, de facto, a conduta do arguido, razão pela qual ora se recorre. 14. A prova produzida quando analisada numa perspectiva iminentemente jurídica exige que o arguido será absolvido da prática de um crime de homicídio qualificado p. e p. pelas normas dos arts. 131º e 132º, al. c) do C. Penal . 15. Sem prescindir de todo o exposto o Tribunal a quo calculou exageradamente a dosimetria penal a aplicar ao arguido, negligenciando as condições pessoais e sociais da ora recorrente. 16. A interpretação correcta obrigava à ponderação pelo Tribunal do circunstancialismo exposto, de modo à aplicação da forma mínima aplicável ao ilícito em questão, violando desta forma o preceituado nos arts. 70 e 71 do C.Penal." Termina pedindo que o recorrente "a) seja absolvido da prática de crime qualificado, p. e p. nos arts. 131º e 32º do C. Penal, pelo qual foi condenado; e b) se a conduta do recorrente subsumida no tipo de crime de ofensas à integridade física graves, qualificadas, agravadas pelo resultado p. e p. nos artgs. 144º al. d), 145º, nº1 al. b) e 146º todos do C. Penal. E caso se não entenda "ser a dosimetria penal a aplicar ao arguido diminuída ao mínimo legal". Responderam o Ministério Público e a assistente julgando pela improcedência do recurso. Neste Supremo Tribunal o Exmoº Procurador-Geral Adjunto teve vista dos autos e foi proferido o despacho preliminar. Colhidos os vistos e realizada a audiência oral, cumpre decidir. É a seguinte a matéria de facto dada sem provada e não provada: 1. O arguido C dedica-se à exploração de vários estabelecimentos onde se pratica a prostituição, entre eles um denominado "... Bar", também conhecido por "...", sito no lugar de Pedregais, freguesia de Rio de Moinhos, Arcos de Valdevez, lugar esse onde não existe qualquer outra construção habitada nas redondezas; 2. As mulheres que trabalhavam nesses bares, em número de cerca de duas dezenas, faziam-no voluntariamente, nalguns casos, mas noutros casos eram compelida a permanecer ali pela força; 3. Por isso, o arguido C necessitava de ter colaboradores, os quais, para além de desempenharem funções específicas (barman, cozinheiro, segurança, disco-jóquei, etc.), ajudavam a vigiar as mulheres que para ele trabalhavam e a prevenir eventuais tentativas de fuga; 4. Entre essas pessoas contava-se o seu filho, o arguido A, que o pai colocou, com menos de dezasseis anos, a ajudar na «gerência» dos estabelecimentos, permitindo que o mesmo mantivesse relações sexuais com as mulheres que ali trabalhavam; 5. Entre os colaboradores do arguido C contava-se, também, o arguido B, conhecido pela alcunha de "Caça Aviões", ou simplesmente "o Caça", cujas funções eram sobretudo as de «segurança»; 6. Para o arguido C trabalhou também, durante alguns meses, o E, nascido a 3 de Outubro de 1981; 7. Durante o período em que...

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