Acórdão nº 03S2169 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Outubro de 2004

Magistrado ResponsávelVÍTOR MESQUITA
Data da Resolução13 de Outubro de 2004
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1. Relatório "A", intentou no Tribunal do Trabalho de Lisboa a presente acção declarativa com processo ordinário emergente de contrato individual de trabalho contra o ISSS - Instituto Superior de Serviço Social, CRL, que alterou a sua denominação para Cooperativa de Ensino Superior Intervenção Social, CRL (fls. 18 e ss.) e, posteriormente, para Cooperativa de Ensino Superior de Desenvolvimento Social, CRL (fls. 374 e ss.), peticionando a condenação da R. a pagar-lhe a quantia de Esc. 4.671.498$00, acrescida de juros à taxa legal de 10% contados desde a citação e até integral pagamento.

Para tanto alegou, em síntese: que foi admitida ao serviço da R. em 1 de Novembro de 1974 para o desempenho de funções docentes; que no ano lectivo de 1988/89 a R. atribuiu à A. as funções de coordenação do departamento de formação permanente, funções que a A. exerceu até Fevereiro de 1997, auferindo a mais por esse facto a remuneração correspondente a 3 horas de docência; que a partir do ano de 1993 a R. não pagou à A. este acréscimo de remuneração no subsídio de Natal, deixando também de o pagar nos subsídios de férias; que entre 1994 e Fevereiro de 1997 a R. não pagou à A. pelo trabalho de coordenação a remuneração correspondente a 3 horas de docência; que a partir do ano lectivo de 1994/95 a A. foi incumbida de leccionar a disciplina de Teoria e Metodologia do Serviço Social II, auferindo por isso entre 1994 e 1997 uma remuneração que não era contudo paga nos meses de Agosto e Setembro e que a partir de Outubro de 1997 a R. retirou à A. aquela disciplina, não lhe pagando mais a respectiva retribuição.

A R. contestou a acção impugnando parte do alegado pela A. e invocando no seu articulado, em síntese: que não é devido o pagamento dos subsídios de férias e de Natal com o acréscimo de três horas semanais correspondente às funções de coordenação, não procedendo a R. a este pagamento a qualquer dos seus membros; que em 21 de Abril de 1994 a R. passou a atribuir uma importância mensal fixa pelo exercício das funções dos membros dos seus órgãos sociais directivos e consultivos, ao invés do critério das horas semanais; que a A. leccionava a disciplina de Teoria e Metodologia do Serviço Social II em acumulação com a disciplina de Grupo de Estudos e Prática-Sector de Habitação e Urbanismo, recebendo por esse facto mais uma remuneração mensal, com excepção dos meses de Agosto e Setembro; que esta sempre foi a prática da R. nas situações de acumulação, com aprovação dos membros da R. incluindo a A.; que a A. deixou de leccionar a disciplina de Teoria e Metodologia do Serviço Social II porque passou a beneficiar de uma bolsa financiada pelo PRODEP que era incompatível com a actividade lectiva, suportando a R. desde 1998 o vencimento da A. sem que esta exerça qualquer actividade lectiva.

Conclui pugnando pela improcedência da acção.

A A. respondeu à contestação nos termos de fls. 48 a 51.

Foi proferido despacho saneador e elaborados especificação e questionário, ambos objecto de reclamação, oportunamente decidida.

Designado dia para o julgamento, a este veio a proceder-se com observância das formalidades legais, após o que foi decidida a matéria de facto em litígio e proferida sentença que, julgando parcialmente procedente a acção, condenou a R. a pagar à A. a quantia de Esc. 1.953.890$00 acrescida de juros e a quantia que se liquidar em execução de sentença correspondente à leccionação da disciplina de TMSS II desde Outubro de 1997 até à data da decisão final, incluindo subsídios de férias e de Natal, acrescida de juros de mora.

Inconformada a R. recorreu de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa que, por douto acórdão de 29 de Janeiro de 2003, concedeu parcial provimento à apelação e alterou a sentença da 1ª instância, absolvendo a R. na parte em que foi condenada a pagar à A. a quantia que se liquidar em execução de sentença correspondente à leccionação da disciplina de TMSS II desde Outubro de 1997 até à data da decisão final, incluindo subsídios de férias e de Natal, acrescida de juros de mora, no mais mantendo a decisão recorrida.

Desta feita inconformada a A., veio recorrer de revista para este Supremo Tribunal de Justiça, formulando nas alegações as seguintes conclusões: 1ª - Provou-se nos autos que a R. baixou a retribuição da A. porquanto não pagara a R. à A. nos meses de Agosto e Setembro de 1995, 1996 e 1997 as remunerações referentes à leccionação da disciplina de Teoria e Metodologia do Serviço Social II, tendo-lhe retirado a leccionação daquela disciplina a partir de Outubro de 1997 e não mais lhe pagando a respectiva retribuição.

  1. - Bem decidiu a douta de 1ª instância ao condenar a R. a pagar à A. as retribuições em dívida decorrentes da diminuição da retribuição mensal por assim fazer correcta aplicação do art. 21º, n.º 1, al. c) do Dec. Lei n.º 49.408.

  2. - E o Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho aprovado pelo Dec. Lei n.º 49.408 é aplicável aos docentes dos estabelecimentos de Ensino Superior Particular ou Cooperativo, por não estar excluído do âmbito de aplicação daquele diploma.

  3. - E o Estatuto do Ensino Superior Particular ou Cooperativo aprovado pelo Dec. Lei 16/94 não exclui a aplicação do Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho e expressamente refere que o regime contratual dos docentes daquele ensino será objecto de diploma próprio que ainda não surgiu, razão por que nenhuma exclusão existe - art. 24º do Dec. Lei 16/94.

  4. - Antes a Lei de Bases do Ensino Superior Particular ou Cooperativo expressamente menciona a obrigatoriedade do cumprimento da legislação do trabalho em vigor - art. 13º, f) da Lei n.º 26/2000.

  5. - Não sendo igualmente aplicável o Estatuto da Carreira do Ensino Superior Público por o art. 24º do Dec. Lei 16/94 expressamente excluir aquela aplicação.

  6. - Nem sendo aplicável os Estatutos Internos da R. no que se refere a estipulações contratuais, de carreira ou de habilitação dos docentes daqueles estabelecimentos de ensino porquanto o Dec. Lei 16/94, no n.º 2 do seu art. 25º, faz depender a vigência desses estatutos da aprovação do diploma que regula o regime contratual desses docentes.

  7. - E se, como sustenta o Acórdão recorrido, a recorrente exercia a docência da disciplina de Teoria e Metodologia do Serviço Social II em "acumulação" com outra disciplina, esse argumento - a ser aceitável - levaria à conclusão de que a leccionação daquela disciplina representava a prestação de trabalho suplementar e tinha como tal de ser remunerado, o que a R. nunca fez.

  8. - E exactamente porque não era trabalho suplementar, nem a R. como tal o considerou, remunerando-o em singelo, é que representa antes um alargamento do horário de trabalho docente semanal da A., com o consequente aumento da retribuição mensal.

  9. - Retribuição que mais não podia ser diminuída por a isso se opor o art. 21º, n.º1, al. c) do Dec. Lei n.º 49.408.

  10. - O acórdão recorrido ao dar procedência parcial ao recurso interposto pela R. e ao considerar que a retribuição auferida pela A. pela leccionação da disciplina de Teoria e Metodologia do Serviço Social II podia ser retirada pela R. violou o art. 21º, n.º 1, al. c) do Dec. Lei n.º 49.408.

A R. interpôs também recurso subordinado nos termos do art. 682º, n.º 2 do CPC, restrito à parte do acórdão da Relação que manteve a condenação parcial da R.

Este recurso foi julgado deserto por falta de alegações (despacho de fls. 355).

Na qualidade de recorrida relativamente à revista interposta pela A., a R. contra alegou, formulando no termo das suas contra-alegações as seguintes conclusões: 1. Segundo o contrato entre a recorrente e a recorrida, aquela estava obrigada a leccionar a disciplina de GEP (Grupo de Estudos e Prática) - Habitação e Urbanização, durante 6-10 horas semanais.

  1. Por sua vez, a recorrida estava obrigada a pagar-lhe, apenas, a retribuição correspondente ao seu tempo "completo" de trabalho.

  2. A recorrente deixou de leccionar a disciplina de Teoria e Metodologia do Serviço Social II por ser incompatível com a bolsa que recebia para preparar o seu doutoramento, financiada pelo PRODEP.

  3. A leccionação da disciplina de Teoria e Metodologia do Serviço Social II durante os anos lectivos de 1994/1995 para além do seu "horário normal", não confere à recorrente o direito a auferir o correspondente suplemento remuneratório para o futuro.

  4. A especificidade do trabalho docente no Ensino Superior Particular ou Cooperativo não se coaduna com a mera aplicação do Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho.

  5. Em qualquer caso não foi violado o princípio da irredutibilidade da retribuição, designadamente o invocado no art. 21º, n.º 1, al. c) do Regime Jurídico anexo ao Decreto Lei n.º 49.408 e 1969/11/24.

    O Exmo. Procurador Geral Adjunto emitiu nos autos douto parecer, no sentido de não ser concedida a revista, considerando que o pretendido pela recorrente extravaza a integridade remunerativa devida.

    Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

  6. Fundamentação de facto As instâncias deram como provada a seguinte factualidade: 2.1. Para o desempenho de funções docentes do ensino superior a R. admitiu a A. ao seu serviço em 74.11.01, desempenhando desde então a A. as suas funções sob as ordens, direcção e fiscalização da R. (alínea A).

    2.2. No ano lectivo de 1988/89 a R. atribuiu à A. as funções de coordenação do Departamento de Formação Permanente, funções que a A. exerceu até Fevereiro de 1997, inclusive (alínea B).

    2.3. A R. acordou com a A., pelo menos desde 90.03.14, que a A. auferiria a mais pelas funções referidas em 2.2., a remuneração correspondente a 3 horas de docência semanal (alínea C).

    2.4. A R. pagou à A. o acréscimo referido em 2.3. no subsídio de Natal de 1991 e nos subsídios de férias de 1992 e 1993 (alínea D).

    2.5. A remuneração/hora em vigor na R. para a categoria de função da A. era: - de 4.000$00 no ano de 1993; - de 5.500$00 no ano de 1994; - de 5.750$00 no...

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