Acórdão nº 00064/09.1BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 28 de Outubro de 2010

Magistrado ResponsávelDr
Data da Resolução28 de Outubro de 2010
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO A…, devidamente identificado nos autos, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF de Coimbra, datada de 15/04/2010, que, no âmbito de acção administrativa especial por si instaurada contra o R.

MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA [abreviada e doravante «MAI»], determinou a absolvição da instância deste com base na inimpugnabilidade do acto em questão [entende-se, face aos termos e fundamentos desenvolvidos e nos quais se estriba a decisão (apreciação unicamente da excepção de inimpugnabilidade do acto), tratar-se de lapso/erro a referência que surge na parte final do segmento decisório à “caducidade do direito de acção”, sendo certo que nenhuma nulidade da decisão veio a ser suscitada pelas partes].

Formula o aqui recorrente nas respectivas alegações (cfr. fls. 211 e segs.

- paginação suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário) as seguintes conclusões que se reproduzem: “...

1 - Apesar de o recorrente entender que a decisão punitiva não está sujeita a recurso hierárquico necessário para o Sr. Comandante-Geral pelas razões que espelhou no corpo das presentes alegações - o que redunda numa errónea interpretação da lei levada a efeito pela decisão judicial recorrida, que violou assim e ademais não só o direito do recorrente à tutela judicial efectiva constitucionalmente prescrito, como também, atenta a existência de norma que prescreve que o recurso hierárquico é uma faculdade, o princípio in dubio pro impugnatione (vertido que está, entre o mais, no art. 7.º do CPTA) - v, neste sentido, o Acórdão do TCA-Norte, proferido que foi no âmbito do processo n.º 1573/07, 2 - A verdade é que o mesmo jamais foi notificado da necessidade de assim agir, tendo-se incumprido frontalmente o art. 68.º do CPA - tudo como o recorrido até admitiu.

3 - Logo, de acordo com a melhor doutrina que a este respeito se pronunciou, duas soluções se impõem: ou se admite a impugnação contenciosa imediata do acto ou se admite a impugnação administrativa a partir do momento em que se toma conhecimento da obrigatoriedade de assim agir - cfr. Vieira de Andrade, A Justiça Administrativa (Lições), 6.ª edição, Almedina, Coimbra, 2004, p. 295 e douto aresto proferido por este colendo Tribunal junto como doc. n.º 1.

4 - Ora, não só o recorrente atacou contenciosamente o sobredito acto punitivo, como, em virtude de o Tribunal recorrido ter entendido, no âmbito do processo n.º 62/09 (tendente a obter a suspensão de eficácia da aludida pena), que era necessária a interposição de recurso hierárquico, assim actuou, tendo deduzido a respectiva impugnação administrativa para o Exm.º Sr. Comandante-Geral da Guarda Nacional Republicana - cfr. autos a fls. … 5 - Pelo que a conclusão a retirar é sempre e só uma: a presente impugnação deve ser admitida.

6 - Impugnação que, aliás, sempre se deveria admitir por uma outra ordem de motivação.

7 - É que se o recorrente tivesse interposto recurso hierárquico, este, não possuindo efeitos suspensivos (o que até suscita, de acordo com a melhor doutrina portuguesa, a inconstitucionalidade da norma que assim estatui, cfr. art. 124.º do RDGNR), não teria acautelado minimamente os interesses em causa, na medida em que o recorrente teria que cumprir de imediato a pena.

8 - Ou seja, porque se prostraria o recorrente numa situação de facto consumado, a necessidade de interposição de recurso hierárquico (ou melhor, a interpretação censurada do normativo em questão) mais não seria do que uma intolerável compressão do direito fundamental, ou a ele equiparado, à tutela judicial efectiva que assiste a qualquer cidadão lesado e, assim, ao recorrente - cfr. art. 20.º da CRP.

9 - Aliás, para além do que se vem de concluir, mas antecedendo lógico-argumentativamente a presente pronúncia, teríamos assim que uma interpretação conforme com a Constituição da República dos normativos em causa também alicerçaria a interpretação que se vem de defender.

10 - Conclusões que não são jamais infirmadas com o que vem dito pela decisão judicial recorrida e por dois motivos: - por um lado, porque a previsão do artigo 60.º do CPTA é inaplicável ao caso, dizendo respeito à falta de indicação do autor, da data ou dos fundamentos do acto na notificação (coisas que nunca estiveram em falta), não sendo nunca extensível à menção da al. c) do n.º 1 do art. 68.º do CPA, especificamente dirigida aos casos excepcionais de actos contenciosamente inimpugnáveis.

- por outro, na medida em que a segunda impugnação administrativa necessária a que alude o Tribunal (da decisão do Comandante-Geral para o Ministro da Administração Interna, cfr. art. 120.º do RDGNR) é perfeitamente impossível de ser deduzida, pela simples, mas decisiva razão de que o recorrente interpôs o sobredito recurso hierárquico, não tendo até hoje sido proferida qualquer decisão (facto que motivou, como o digno Tribunal recorrido tão bem sabe, novo apelo à via judicial - cfr. doc. n.º 2).

11 - Numa palavra, a interpretação sufragada pelo Tribunal das normas legais invocadas é manifesta e ilegitimamente desconforme com a Constituição da República, violando o direito do recorrente à tutela judicial efectiva garantida pelo n.º 4 do artigo 268.º, e, em geral, pelo artigo 20.º, n.º 5, garantia fundamental do Estado de Direito Democrático, sendo assim que ao ter julgado acto inimpugnável e o direito de acção caducado, incorreu a sentença recorrida em erro de julgamento por errónea interpretação e violação da lei ...

”.

Conclui no sentido do provimento do recurso, com consequente revogação da decisão judicial recorrida.

O R., ora recorrido, notificado, veio apresentar contra-alegações (cfr. fls. 288 e segs.

), em que termina concluindo nos seguintes termos: “...

  1. - O acto que o Recorrente impugnou contenciosamente não reveste o pressuposto processual da impugnabilidade, por estar sujeito a recurso hierárquico necessário para o Comandante-Geral da Guarda Nacional Republicana e, da decisão deste, para o Ministro da Administração Interna, nos termos do disposto nos artigos 117.º, 118.º, 120.º e 121.º do Regulamento de Disciplina da Guarda Nacional Republicana, aprovado pela Lei n.º 145/99, de 1 de Setembro.

  2. - A exigência legal de impugnação administrativa necessária, que, neste caso, colhe justificação, designadamente, na intensidade da relação especial de disciplina militar, mostra-se perfeitamente conforme à Constituição da República, nomeadamente com o disposto no n.º 4 do artigo 268.º, como se pode ver em abundante jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo.

  3. - Assim, tendo considerado verificada a excepção da inimpugnabilidade do acto, a douta Sentença recorrida assentou numa correcta interpretação e aplicação do Direito, pelo que deverá ser mantida ...

”.

O Ministério Público (MºPº) junto deste Tribunal, notificado nos termos e para efeitos do disposto no art. 146.º do CPTA, emitiu parecer no sentido da procedência do recurso (cfr. fls. 307/307 v.

), parecer esse que objecto de contraditório não mereceu qualquer resposta (cfr. fls. 308 e segs.

).

Dispensados os vistos legais juntos dos Exmos. Juízes-Adjuntos (cfr. fls. 311) foram os autos submetidos à Conferência para julgamento.

  1. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo recorrente, sendo certo que, pese embora por um lado, o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos arts. 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, n.ºs 3 e 4 e 685.º-A, n.º 1 todos do Código de Processo Civil (CPC) (na redacção introduzida pelo DL n.º 303/07, de 24.08 - cfr. arts. 11.º e 12.º daquele DL -, tal como todas as demais referências de seguida feitas relativas a normativos do CPC) “ex vi” arts. 01.º e 140.º do CPTA, temos, todavia, que, por outro lado, nos termos do art. 149.º do CPTA o tribunal de recurso em sede de recurso de apelação não se limita a cassar a sentença recorrida, porquanto ainda que declare nula a sentença decide “sempre o objecto da causa, conhecendo de facto e de direito”.

    As questões suscitadas resumem-se, em suma, em determinar se a decisão judicial ao absolver o R. “MAI” da presente acção administrativa especial incorreu ou não em violação do disposto nos arts. 20.º e 268.º, n.º 4 CRP, 07.º e 60.º CPTA, 68.º CPA, e 124.º RDGNR [cfr. alegações e demais conclusões supra reproduzidas].

  2. FUNDAMENTOS 3.1.

    DE FACTO Resultou apurada da decisão judicial recorrida a seguinte factualidade: I) Com data de 24.11.2006 foi instaurado ao A., que é Cabo-chefe n.º …, do Grupo Territorial de Coimbra da Guarda Nacional Republicana, processo disciplinar (fls. 02 do PA); II) Ao A. foi aplicada, com data de 15.12.2008, pelo Comandante do Grupo, a pena disciplinar de 20 dias de suspensão, com a fundamentação constante da decisão final (fls. 25-28 que aqui se dão como inteiramente reproduzidas);∞Nos termos do art. 712.º do CPC e por resultar de documentos juntos aos autos e no PA apenso adita-se a seguinte factualidade que se mostra necessária à apreciação das questões suscitadas nos mesmos: III) O A. interpôs, em 17.04.2009, recurso hierárquico dirigido ao Comandante-Geral da GNR da decisão referida em II) através de requerimento que deu entrada nos serviços da GNR/CT Coimbra (registado sob o n.º 1000) - cfr. PA apenso e cujo teor aqui se dá por reproduzido; IV) O Comandante-Geral da GNR com base em informação/parecer n.º 131/10 rejeitou o recurso hierárquico referido em III) por despacho datado de 16.07.2010 - cfr. PA apenso e cujo teor aqui se dá por reproduzido; V) O A. intentou no TAF de Coimbra acção administrativa especial contra o aqui R. sob o n.º 667/09.4BECBR na qual peticiona a anulação do acto punitivo referido em II) dado o recurso hierárquico interposto para Comandante-Geral da GNR aludido em III) ainda não ter sido objecto de...

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