Acórdão nº 04B2064 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Julho de 2004 (caso NULL)

Data06 Julho 2004
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: "A" e B intentaram, no Tribunal Judicial do Funchal, contra C e D acção com processo ordinário pedindo que seja declarada a resolução do contrato de arrendamento do r/c do prédio sito no Funchal, ao sítio dos Louros, na Rua Pedra Sina, ... e ... por falta de pagamento de rendas e, subsidiariamente, se declare a denúncia do mesmo contrato de arrendamento, bem como a condenação destes a entregar-lhes o andar e a pagar-lhes 1.428.900$00 acrescidos de 43.300$00 por cada mês até à respectiva entrega.

Alegaram, em síntese, que são proprietários do referido r/chão, que os réus deixaram de pagar a renda do locado em Fevereiro de 2000, e ainda que são emigrantes em Inglaterra, pretendem regressar à Madeira para aí se radicarem e só possuem o prédio onde o locado se situa.

Contestaram os réus, invocando, além do mais, a excepção de caso julgado por já ter corrido contra eles acção de despejo por falta de comunicação do falecimento da anterior inquilina, sustentando que foram os autores que cancelaram a conta onde as rendas eram depositadas, e que os autores possuem o 1º andar do prédio onde podem perfeitamente viver.

Deduziram reconvenção peticionando que os autores sejam condenados a pagar-lhes 2.600.000$00 por obras de conservação que tiveram de efectuar no andar por os autores e anteriores proprietários se recusarem a fazê-las.

Após resposta à contestação, foi exarado despacho saneador julgando improcedente a excepção de caso julgado, tendo sido fixados os factos assentes e organizada a base instrutória.

Procedeu-se, depois, a julgamento vindo a ser proferida sentença que, julgando parcialmente procedentes a acção e a reconvenção, declarou a denúncia do contrato de arrendamento e condenou os réus a despejarem o locado no termo do prazo de renovação contra o pagamento de uma indemnização correspondente a dois anos e meio de rendas à data do despejo, e condenou os autores a pagarem aos réus a quantia que se vier a apurar em execução de sentença referente às obras de conservação custeadas por estes.

Inconformados, apelaram os réus, com êxito, porquanto o Tribunal da Relação de Lisboa, em acórdão de 22 de Janeiro de 2004, decidiu conceder provimento ao recurso e revogar a sentença recorrida, absolvendo os réus do pedido e os autores do pedido reconvencional.

Interpuseram, agora, os autores recurso de revista, pugnando pela procedência do pedido de denúncia do arrendamento, decretando-se o despejo fundamentado na necessidade do locado e, não obstante isso, pela improcedência da reconvenção absolvendo-se totalmente os autores do pagamento de quaisquer eventuais benfeitorias.

Em contra-alegações sustentaram os recorridos dever ser mantida a decisão impugnada.

Verificados os pressupostos de validade e de regularidade da instância, corridos os vistos, cumpre decidir.

Nas alegações da revista formularam os recorrentes as conclusões seguintes (sendo, em princípio, pelo seu teor que se delimitam as questões a apreciar - arts. 690º, nº. 1 e 684º, nº. 3, do C.Proc.Civil): 1. Face aos factos provados e ao direito aplicável, o acórdão recorrido, ao decidir que os autores não necessitam do locado, não só contraria aqueles e toda a abundante jurisprudência e doutrina citadas no texto como nem se fundamenta em Aragão Seia ao contrário do que aparentemente quer dar a perceber.

  1. Mas sim em conjecturas, suposições e exigências ilícitas e até impossíveis ou quase, aliás nem sequer alegadas ou invocadas, como são as respeitantes "aos projectos da vida na Madeira dos autores", "quais os proventos que irão viabilizar a vida do agregado familiar em termos económicos", "que não terão facilidades de obter emprego na Madeira ...", "os autores nada dizem sobre a necessidade de abandonarem a Inglaterra", etc.

  2. Com salvaguarda do respeito devido por quem julgou diversamente, os autores entendem que o pensamento e citações do Ilustre Conselheiro Aragão Seia, expressos e transcritos de fls. 8 a 12 no texto supra, devidamente aplicadas se harmonizam perfeitamente com a factualidade provada por forma a que de uns e outra emerge com evidência a necessidade séria, premente e mais que próxima do locado para a habitação sua e do seu referido agregado familiar.

  3. Como é notório, o Funchal é uma cidade que vive essencialmente do turismo e onde a maioria deste seu mercado é oriunda da Inglaterra e onde por isso quem fala inglês e trabalha nesse sector tem a vida facilitada no que respeita ao exercício da sua profissão.

  4. Por outro lado, não só no Funchal mas em todo o País, qualquer cozinheiro arranja trabalho com toda a facilidade e bem pago e sendo o autor cozinheiro emigrado na Inglaterra desde há muitos anos deve falar fluentemente inglês e saber do seu ofício.

  5. O que se vem dizendo dele mutatis mutandis vale para ela como arrumadora de quartos, sendo também notório abundarem os hotéis, residenciais e casas particulares no Funchal onde essa gente tem emprego à vista e cuja falta até vem sendo remediada com mão-de-obra não qualificada dos emigrantes principalmente de Leste e Brasil, aliás tal como sucede em quase todo o Portugal, deixando este e a Madeira, nos últimos anos, de serem Região e País de emigração para passarem a ser de imigração.

  6. Tanto é dizer, sem sombra de dúvidas, que os autores não têm qualquer problema ou dificuldade em arranjar trabalho na cidade onde têm a sua casa e para onde depois de emigrados em Inglaterra há muitos anos querem vir de vez para junto da sogra e dos seus dois únicos 2 filhos, com 16 e 15 anos, mal o locado esteja despejado.

  7. Só não regressaram definitivamente porque na Madeira entretanto não têm onde ficar e quando aqui vêm têm de dormir no chão e num colchão e talvez por estas evidências é que o Mmo. Juiz da 1ª Instância não levou à matéria assente nem à base instrutória o que a propósito havia sido alegado no artigo 12º da petição inicial com este conteúdo: "Ambos estão fartos de serem emigrantes, de estarem e trabalharem fora das suas terras".

  8. Agora ou depois disso o que não se lhes pode é exigir - como o acórdão dá a entender - é o impossível ou quase como seria o caso de obrigatoriamente terem à espera desde aquela propositura da acção um empregador ou algum estabelecimento seu para lhe garantir trabalho ou para abrir ao público até que pudessem regressar, tanto mais que entre aquela e o despejo decorrem anos e que no caso presente apesar de já lá terem ido dois e meio ainda aqui vamos.

  9. Nem para demonstrarem a sua séria, premente e mais que próxima precisão do locado, e já devidamente comprovada, tenham ainda e também essa outra "necessidade" de terem de confessar no processo "os projectos de vida na Madeira" como também lhe é exigido no acórdão recorrido.

  10. E tendo ou não os autores pequeno ou grande aforro, que lhes permita viver na Madeira sem trabalhar, têm o direito de o fazer e de virem viver definitivamente para junto dos dois filhos e sogra sem que isso ensombre ou prejudique a necessidade da casa para os efeitos da procedência desta acção e indirectamente deixarem de dormir no chão da sala em colchão, como vem acontecendo quando vêm à Madeira, e onde não têm para ficar mesmo que transitoriamente.

  11. É certo que quando os autores adquiriram o locado em Abril de 1996 já estava arrendado aos pais dos réus, mas então ainda não havia para eles data do regresso, os filhos só tinham 11 e 9 anos e a sogra ainda...

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