Acórdão nº 04P4118 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Dezembro de 2004 (caso NULL)

Data09 Dezembro 2004
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1.

O Tribunal Colectivo das Varas Mistas de Sintra (NUIP 1664/02.6GFSNT procedeu ao julgamento de DSRF, com os sinais nos autos, como autor material de um crime de violação na forma tentada dos art°s 164.º n.° 1, 22.º n.º 1 e 2 al. a) e c), 23.º n.º 2 e 73.º, todas do C. Penal, tendo a ofendida deduzido um pedido de indemnização civil alegando prejuízos patrimoniais no valor de 454,92 € e danos não patrimoniais no montante de 12.500,00 € e globalmente 13.437,12 €.

Realizado o julgamento, o mesmo Tribunal condenou o arguido, como autor do referido crime, na pena de 2 anos de prisão, suspensa na sua execução por 3 anos e ainda a pagar à ofendida MLVN, o montante de 3.954,92 € de indemnização por danos patrimoniais e morais, acrescido de juros vencidos desde 15.04.2004 e vincendos, até integral e efectivo pagamento, à taxa legal em vigor.

2.1.

Inconformada, a assistente recorreu para este Supremo Tribunal de Justiça, concluindo na sua motivação: 1. Decorre dos factos dados como provados que, a intensidade dolo é elevada e manifesta., bem como o grau de ilicitude dos factos.

  1. Por consequência, os danos psicológicos na assistente foram (e são) marcantes e duradouros para toda a sua vida, alterando para sempre a sua vida sexual.

  2. Donde, é claro que só com uma pena privativa da liberdade aplicada ao arguido satisfaz as finalidades de prevenção geral e especial, pois que assistente ficou apavorada quando soube que ele não ia preso; e ele certamente ficou com um sorriso nos lábios!.

  3. O douto acórdão recorrido refere que se tratou de uma tentativa de violação, mas esta deixou marcas permanentes na assistente, que aliás não se compensam por dinheiro nenhum! 5. Refere também que a assistente é uma mulher com o dobro da idade do arguido.

  4. Todavia, salvo o devido respeito, tal argumento não colhe, visto que a idade não é critério para fixar uma indemnização.

  5. Por outro lado, as considerações tecidas no douto acórdão recorrido sobre a eventual experiência da assistente não tem nenhum suporte factício nos factos.

  6. E sobre o trauma da assistente, louvamo-nos no relatório de acompanhamento da APAV juntos aos autos.

  7. Assim, parece-nos ajustado o montante indemnizatório de 12500€ - apesar de nunca compensar os danos da assistente - , a titulo de danos morais.

  8. Por fim, os juros legais devem ser contados desde o dia da prática dos factos ilícitos até efectivo pagamento, nos termos do art. 805°, n.º 2 al. b) do Código Civil.

  9. O Douto acórdão recorrido violou os arts. 483°e 496° do C. Civil e art. 164° do C. Penal, para além dos artigos acima referidos.

    Nestes termos e nos de direito, dando-se provimento ao recurso, deve o arguido ser condenado numa pena de prisão efectiva e no pagamento dos danos patrimoniais no montante de 12500€, e bem assim nos juros contados desde a prática do facto ilícito.

    2.2.

    Respondeu o Ministério Público que se pronunciou pela manutenção da decisão recorrida, pois, face à ausência de antecedentes criminais, a idade do arguido e o facto de se encontrar socialmente inserido e a trabalhar, tudo permitindo supor que o arguido não volte a reincidir, a opção pela não privação da liberdade é mais adequada não ferindo sobremaneira o sentimento ético-retributivo da generalidade das pessoas.

    2.3.

    Respondeu o arguido também que concluiu:

    1. Ser rejeitado o presente recurso por clara violação à alínea a) do n°.2 do art° 412° do C.P.P.; B) Caso assim não se entenda, ser declarada a ilegitimidade da recorrente para interpor o presente recurso no que concerne à medida da pena aplicada ao arguido, atento o disposto no art° 401°, n°. 1, alínea b) e n°.2 do CPP e do Assento n°.8/99 do STJ; C) Quanto à condenação do arguido no pagamento de uma quantia de €12.500,00 a título de danos não patrimoniais à recorrente, a mesma vem no presente recurso discutir a matéria de facto, o que torna incompetente este Venerando Tribunal para conhecer do mesmo, por clara e manifesta violação à alínea d) do art° 432° do CPP, mas D) Sem conceder, a recorrente não alegou factos significativos, nem, tão pouco pôs em causa a matéria de facto dada como provada no douto acórdão recorrido, para que possa ser alterada a indemnização fixada.

    2. Em suma, o douto acórdão recorrido, fez uma boa e adequada administração da justiça, não merecendo, pois, qualquer censura.

    3. Por conseguinte, e sempre com o mui douto suprimento de V. Exas, deve ser negado total provimento ao presente recurso, confirmando-se e mantendo-se na íntegra o douto acórdão recorrido nos seus precisos termos.

  10. Neste Supremo Tribunal de Justiça teve vista o Ministério Público que sustentou que a questão da legitimidade da assistente (saber se tem um alegado interesse concreto e próprio em agir) se confunde afinal com a questão de fundo, pelo que não deve ser rejeitado preliminarmente o recurso na parte penal, por inadmissibilidade.

    Foi cumprido o disposto no n.º 2 do art. 417.º do CPP.

    O Relator entendeu que a questão prévia devia ser conhecida em audiência, pelo que foram colhidos os respectivos vistos e a ela se procedeu.

    No seu decurso, o Ministério Público sustentou que a filosofia do acórdão de fixação de jurisprudência sobre a legitimidade do assistente para recorrer desacompanhado do Ministério Público não lhe permite interferir no exercício do ius puniendi por parte do Estado, por não ter ficado satisfeito com uma determinada pena. A sua segurança, no entanto, poderá conferir essa legitimidade face, v. g. a um reforço das condições da suspensão capazes de a assegurarem.

    A defesa acompanhou a posição do Ministério Público aceitando o estabelecimento de condições destinadas a assegurar a segurança da assistente.

    Cumpre, assim, conhecer e decidir.

    E conhecendo.

    3.1.

    A recorrente, por um lado, funda a impugnação da indemnização arbitrada numa maior ilicitude da conduta do arguido, do que a considerada pelo Tribunal a quo. E, por outro, invoca o medo que lhe causa a manutenção do arguido em liberdade, pela possibilidade de este voltar a praticar os mesmos factos.

    Estabelece, assim, a assistente suficientemente um interesse próprio em agir, que lhe atribuiu legitimidade para o presente recurso. Saber se o medo invocado é real, é já matéria de fundo que ultrapassa a questão prévia invocada.

    Conhecer-se-á, pois, em toda sua amplitude, do presente recurso.

    São três as questões a decidir neste recurso: - Aplicação da pena de substituição de suspensão; - Montante da indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos pela ofendida.

    - Data a partir da qual são devidos os juros pelo arguido.

    3.2.

    Antes, porém, importa ter em atenção a factualidade apurada pelo Tribunal recorrido (transcrição): Discutida a causa, resultaram provados os seguintes factos:

    1. No dia 6 de Setembro de 2002, pelas 23h30m, o arguido dirigiu-se à residência de MLVN, sita na Rua Eng° Carlos Santos, Lote ... Mem Martins, Sintra.

    2. Como esta tinha realizado obras na sua residência e o arguido trabalhava na construção civil, pediu-lhe que as visse e desse a sua opinião sobre a qualidade das mesmas.

    3. Quando entraram num quarto da casa, o arguido começou a ver os azulejos do mesmo, e, de repente, agarrou a MLVN pela cintura como se a estivesse a abraçar.

    4. Quando a MLVN lhe pediu para parar com tal atitude, o arguido atirou-a para cima da cama ali existente, e em seguida, colocou-se por cima daquela, dizendo-lhe que já havia muito tempo que queria fazer amor com ela.

    5. Nesse momento, a ofendida pediu ao arguido para parar e tentou colocar o joelho na barriga do mesmo, chegando a mordê-lo para se libertar.

    6. Ao invés de parar, o arguido agarrou as mãos da ofendida e começou a apalpar-lhe o peito.

    7. Com a resistência demonstrada pela MLVN, acabaram por cair os dois para o chão, envolvidos em luta.

    8. Aí, o arguido rasgou a roupa da denunciante, após o que esta lhe voltou a pedir para parar.

    9. Agarrando numa colher de pedreiro que ali estava, a ofendida desferiu com a mesma um golpe no arguido, tendo-lhe este retirado a mesma das mãos.

    10. Em seguida, a ofendida agarrou os testículos do arguido e apertou-os conseguindo assim que o arguido a largasse, chamando-a "puta" e "filha da puta".

    11. Quando se recompôs, o que aconteceu quase de imediato, o arguido dirigiu-se à ofendida e começou a desferir-lhe murros e pontapés por todo o seu corpo.

    12. Então, a ofendida pediu-lhe para parar dizendo que aceitava fazer amor com o arguido.

    13. Perante tal atitude, o arguido ordenou que a ofendida tirasse a sua roupa, ao que esta acedeu ficando de roupa interior.

    14. Então, a MLVN disse ao arguido para se sentarem na cama, para se acalmarem, após o que fariam amor, no que este concordou.

    15. Quando estavam sentados na cama, a ofendida pediu ao arguido que lhe fosse buscar um copo com água, anuindo, o arguido foi à cozinha buscá-lo.

    16. Nesse momento, a ofendida decidiu aproveitar o facto de o arguido ter abandonado o quarto para fugir.

    17. Quando se apercebeu de tal intenção, o arguido ainda foi atrás da ofendida, agarrando-lhe um braço.

    18. No entanto, a mesma, gritando por socorro, conseguiu abandonar a residência, saindo para a via pública em roupa interior.

    19. Nesse momento, o arguido saiu da residência e abandonou o local.

    20. Em seguida, a ofendida MLVN foi conduzida ao Hospital Amadora Sintra em ambulância, onde apresentava escoriação ligeira na região frontal do tornozelo direito e punho esquerdo, o que originou um período de doença de 10 dias, sendo os primeiros 3 com incapacidade para o trabalho.

    21. Ao agir da forma descrita, queria o arguido manter relações sexuais de cópula completa com a ofendida, contra a sua vontade, recorrendo à sua superioridade física, e usando para o efeito a sua força e agressões, o que só não conseguiu em virtude daquela se lhe ter oposto e ter conseguido fugir.

    22. O arguido agiu livre e conscientemente, sabendo que a sua conduta era proibida e punida por Lei.

    23. As lesões provocadas causaram à ofendida dores e incómodos.

    24. A ocorrência descrita deixou-a...

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