Acórdão nº 04P4308 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Dezembro de 2004 (caso NULL)
Magistrado Responsável | SIMAS SANTOS |
Data da Resolução | 09 de Dezembro de 2004 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça Fundamentos da decisão: A recorrente suscitou (no proc. n.° 438/98.1JASTB, 1.° Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal) incidente de recusa da Senhora Juiz Presidente, nos termos do art. 43.º, n.° 5 do CPP, invocando, em síntese, as seguintes razões: - A afirmação da Senhora Juiz quanto à suficiência de indícios que, em seu entender, justificaram o despacho da Senhora Juíza de Instrução que ordenou a busca e apreensão efectuada em casa da arguida MS e na omissão - no despacho da Senhora Juíza - sabendo perfeitamente "que tal corresponde à crua verdade.., que esse indício resultava de putativa prática de um crime de aborto cometido alegadamente sete anos antes do despacho da Juíza de Instrução em causa..."; - A alteração do despacho que designou dia para julgamento, na sequência do requerimento apresentado pelo Ministério Público, dando sem efeito as datas indicadas a fls 723 e designando para julgamento o dia 15.06.2004, despacho que veio a ser notificado às arguidas "de forma a tornar inviável, objectivamente, ao tribunal aceitar os requerimentos de prova que elas entenderam fazer, ou caso entendessem, sofreram os mesmos de algumas incorrecções ou insuficiências, proferir, quanto a elas, como a lei há muito impõe, despacho de convite ao aperfeiçoamento"; - O facto do requerimento apresentado pelo Ministério Público (a pedir a alteração da data designada para julgamento) não ter sido notificado às arguidas (o que constitui irregularidade processual) e ao Ministério Público ser dada a oportunidade de se pronunciar sobre os requerimentos das arguidas.
O que foi recusado pela Relação de Évora.
Insiste a arguida, com a discordância do Ministério Público junto da Relação, perante este Supremo Tribunal de Justiça, pretendendo que: A. As afirmações produzidas pela Mma. Senhora Juíza no sentido de que "como é sabido, quem se dedica a este tipo de práticas criminosas não o faz como acto isolado, fazendo-o, por regra, como modo de vida e com fins lucrativos" e de que "havia assim indícios de que a arguida MS havia feito aborto a uma senhora identificada nos autos como arguida num processo de inquérito de que se encontram juntas certidões", consideradas em si mesmas e atendendo à circunstância e ao contexto em que foram proferidas, levam a Recorrente a entender existir motivo sério e grave adequado a gerar desconfiança sobre a imparcialidade da Mma. Juíza, em termos de não lhe parecer possível confiar no julgamento por ela dos factos objecto do processo.
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Tais afirmações revelam, no entender da ora Recorrente, um claro e inadmissível pré-juízo relativamente à Arguida, na medida em que a Mma. Senhora Juíza revelou nelas inverter completamente, e em nítido desfavor da Arguida, o processo lógico-dedutivo que em processo penal deve presidir à apreciação dos indícios e das provas e à formação da convicção do julgador e basear-se em presunção de culpa inaceitável e juridicamente inexistente e irrelevante, mostrando que, sempre em desfavor da Arguida, ignora ou faz letra morta da única presunção relevante em processo penal, que é a da inocência dos arguidos.
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Os ditos indícios reportavam-se a um aborto alegadamente cometido sete anos antes do despacho que ordenou as buscas, estando o eventual crime já prescrito aquando da sua prolação, o que era do perfeito conhecimento da Mmª. Senhora Juíza.
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Pareceu seriamente à Recorrente que a Mmª. Senhora Juíza havia já formado a sua convicção sobre a imputabilidade a ela dos factos criminosos por que vem pronunciada e vai ser julgada, o que se mostra incompatível com os princípios e com os termos a que se deve subordinar qualquer Julgamento penal: estrutura acusatória e subordinação ao contraditório pleno, com a inerente proibição de valoração de provas não produzidas ou examinadas em audiência; ónus de alegação e prova a cargo da Acusação e presunção de inocência dos Arguidos.
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O que está em causa, aqui, é o modo ou as razões, revelado ou reveladas pelas afirmações antes transcritas, como ou por que a Mmª. Senhora Juíza chegou àquela decisão, de que se verificavam indícios justificando suficientemente o despacho que ordenou a realização daqueles meios de obtenção de provas.
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A Recorrente entende que as citadas afirmações revelam que a Mmª. Juíza partiu precisamente dum prejuízo de culpabilidade da Arguida, ou de imputabilidade à Arguida de deter minados factos criminosos para concluir pela existência desses referidos indícios, quando deveria ter feito, e é exigível ao juiz do julgamento que o faça, de modo completamente inverso.
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Entende, por isso, a ora Recorrente mostrar-se verificada no caso a hipótese prevista no n.º 1 do artigo 43° do Código de Processo Penal, norma que considera violada pela douta decisão recorrida.
A Relação de Évora apreciou da seguinte forma o pedido de recusa formulado pela recorrente: «Primeiro fundamento: Consta dos autos (fls 18) que em 12.03.99 a Senhora Juíza de Instrução da Comarca de Setúbal determinou que se procedesse a busca nas residências das suspeitas MF e MS (aí identificadas) por existirem indícios nos autos de que aquelas se vinham "dedicando à prática de crimes de aborto... e por se reputar...
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