Acórdão nº 05A819 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 24 de Maio de 2005 (caso NULL)

Data24 Maio 2005
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I. No dia 18.4.96, cerca das 6,40 horas, na Avenida da Lousã, em Coimbra, deu-se um acidente de viação entre o veículo ligeiro de passageiros Peugeot 106, de matrícula ET, conduzido por A, e o comboio nº 6500 (automotora da Lousã), conduzido pelo maquinista da CP, B no âmbito das suas funções.

Do acidente resultaram para A prejuízos, tanto pessoais como materiais, motivo pelo qual, imputando a culpa ao maquinista da automotora, accionou a CP - Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses, EP, para obter a sua condenação no pagamento duma indemnização no valor de 38.789.000$00.

A ré contestou.

Impugnou a existência e extensão dos danos invocados e atribuiu a totalidade da culpa à autora.

Requereu a apensação de duas outras acções propostas com base no mesmo acidente, o que foi deferido.

Seguindo o processo os trâmites legais, foi proferida sentença que a condenou a pagar à autora a quantia de 5.197.250$00 (ou 25.923.77 €), absolvendo-a do restante pedido.

Julgando parcialmente procedentes as apelações interpostas pela autora e pela ré, a Relação condenou esta no pagamento de 13.536.059$00 (ou 66.803,75 €), especificando que incidem juros à taxa legal desde a data do acórdão sobre o devido a título de danos morais (2.868.750$00) e desde a data da citação sobre o restante quantitativo indemnizatório (10.667.309$00).

A ré pede revista deste acórdão, sustentando que: a) Deve ser absolvida do pedido porque nenhuma culpa teve na produção do acidente, sendo a da autora de 75%; b) Quando assim não se entenda, deve graduar-se em menor grau - nunca superior a 12,5% - a culpa da CP; c) Deve fixar-se em 9.975,96 € (2 mil contos) a indemnização atribuída a título de danos morais e em 55.261,32 € (11.078.900$00) a fixada por força da IPP de que a autora é portadora.

Não houve contra alegações.

Cumpre decidir.

  1. São duas as questões centrais a apreciar no presente recurso: a culpa na produção do acidente e a quantificação de parte dos danos sofridos pela lesada.

    Vamos apreciá-las por esta ordem.

    1. A questão da culpa Na análise deste problema as instâncias tomaram em consideração a culpa da Refer, EP, pessoa colectiva de direito público que tem por objecto principal a prestação do serviço público de gestão da infra-estrutura integrante da rede ferroviária nacional, nela delegado por efeito automático do diploma legal que a criou (art.º 2º, nº 1, do DL 104/97, de 29/4). Porém, a Refer surge demandada apenas numa das acções cuja apensação a esta foi ordenada, proposta pela Companhia C contra ela e também contra a CP, e que visou a condenação de ambas na quantia paga por aquela seguradora ao proprietário do veículo conduzido pela lesada, destruído em consequência do acidente. Nenhum pedido a autora nesta acção (a principal), deduziu contra a Refer; nem tinha, em princípio, que fazê-lo, pois à data dos factos discutidos esta empresa ainda não tinha existência jurídica, não podendo por eles ser responsabilizada. É certo que os direitos e as obrigações integrantes do património da CP, "afectos às infra-estruturas integrantes do domínio público ferroviário", foram transferidos para a Refer, "sem alteração de regime" (art.º 11º, nº 3, do DL citado). E também é certo que, por força do art.º 14º, nº 2, do mesmo diploma, a Refer sucedeu na posição jurídica da CP, contratual ou extracontratual (seria este o caso dos autos). Tal sucessão, porém, nos termos do mesmo preceito, processa-se "através de protocolos" a celebrar entre as duas empresas, "os quais identificarão as posições jurídicas a transmitir". Deste modo, não estando demonstrada no processo a existência de qualquer protocolo contemplando a posição jurídica da CP na relação litigiosa decorrente do acidente ajuizado, está fora de causa "distribuir" por ambas as entidades a culpa que à CP possa vir a ser atribuída na eclosão do acidente; para fixar a indemnização devida à lesada, a culpa, caso exista, dividir-se-á, se for caso disso, somente entre ela e a CP.

      Vejamos os factos relativos ao acidente definitivamente assentes que interessam à solução do problema. São os seguintes: 1) O veículo ET seguia no sentido Portagem/Calhabé, sendo que o fazia pelo "corredor" mais à esquerda dos dois que a sua faixa de rodagem contém, no sentido em que seguia.

      2) Na ocasião do embate a Avenida da Lousã tinha pouco movimento e apresentava-se no local seca, de traçado recto, plano, asfaltada, tendo de largura cerca de 20 metros.

      3) A Avenida da Lousã é interceptada ou cortada na diagonal pela via férrea.

      4) O local onde ocorreu o acidente é precedido por dois sinais de perigo de aproximação de passagem de nível sem guarda, apostos pelo Município de Coimbra alguns metros antes dos sinais semafóricos existentes na transposição da Av. Navarro com a Av. da Lousã e que se encontram colocados em cada um dos lados da via por onde circulou o veiculo ET.

      5) A automotora saiu do apeadeiro de Coimbra Parque com destino à Estação Nova de Coimbra, seguindo o maquinista em obediência às ordens do Chefe de Comboios e ao serviço da CP, e não sendo acompanhado por qualquer autoridade a antecipar a circulação.

      6) O semáforo existente no local referenciado em 4) estava na posição de luz verde no sentido de marcha do veículo ET.

      7) Ao aproximar-se do local do acidente a condutora do veiculo ET deparou com o comboio nº 6500 (automotora da Lousã), que circulava no sentido Apeadeiro do Parque - Portagem.

      8) A automotora invadiu a faixa de rodagem por onde circulava o veículo ET, o qual, no momento do embate, seguia na semi-faixa da esquerda da faixa de rodagem, atento o sentido de marcha deste.

      9) A linha-férrea atravessa obliquamente ambos os "corredores" que existem na semi-faixa de rodagem por onde circulava o ET.

      10) O embate ocorreu na semi-faixa da esquerda da faixa de rodagem, atento o sentido de marcha do ET, a cerca de 3,60 metros do separador central que à sua esquerda se interpõe entre a faixa de rodagem em que seguia e a afecta ao sentido contrário.

      11) O embate entre o ET e automotora deu-se entre a parte da frente esquerda, e lado esquerdo deste e entre o espigão da automotora, que serve para engatar as composições umas nas outras e o pára-choques da automotora, ambos do lado esquerdo.

      12) O ET foi projectado a 12,50...

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