Acórdão nº 06A324 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Março de 2006 (caso NULL)
Magistrado Responsável | URBANO DIAS |
Data da Resolução | 21 de Março de 2006 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I - "AA" intentou, em Novembro de 2000, no tribunal judicial de Ponte de Lima, acção ordinária contra Empresa-A, pedindo que fosse condenada a pagar-lhe a importância de 83.239.047$00, a título de danos patrimoniais e de danos morais, e de quantia a relegar para liquidação de sentença, acrescidas de juros, alegando que o acidente de que foi vítima foi causado exclusivamente pelo condutor do veículo seguro na R..
A R. contestou, pedindo a improcedência do pedido.
A acção foi, após julgamento, decidida no sentido da sua parcial procedência, condenando a R. a pagar ao A. o total de 59.285,36 € e respectivos juros, sendo 39.285,36 € a título de danos patrimoniais e 20.000 € por danos morais.
Com esta decisão não se conformaram tanto o A. como a R. que, por isso, apelaram para o Tribunal da Relação de Guimarães, tendo este, na procedência total do recurso da R. e na improcedência do recurso do A., fixado a indemnização devida pela R. ao A. em 36.939,45 € e juros, sendo 16.839,45 € a título de danos patrimoniais e 20.000 € por danos morais.
Com esta decisão não concordou o A. que pediu a revista, com a consequente revogação da mesma de forma a ser a indemnização relativa a lucros cessantes ser fixada em 89.784 €, acrescida da indemnização fixada pela 1ª instância no valor de 840.000$00 e no que se liquidar em execução de sentença e relativamente às despesas com terceira pessoa para de si tratar, e em 100.000 € a título de danos morais.
Para o efeito, apresentou as suas alegações que rematou com as seguintes conclusões: - O Tribunal da Relação não poderia ter alterado a resposta à matéria de facto dos artigos em crise; - A perícia médica e os documentos não são inatacáveis por não fazerem prova plena em juízo; - Foi ouvida prova testemunhal aos quesitos em questão exceptuando o 38°; - Não se procedeu à gravação da audiência de julgamento; - Os danos patrimoniais sofridos pelo recorrente foram avultados, e existiram como consequência directa e necessária do "handicap" físico do presente acidente; - O recorrente só por causa desse "handicap" teve de deixar a sua actividade; - O rendimento mensal que o Tribunal a quo determinou resultou da interpretação que a senhora Juiz fez dos elementos probatórios do processo determinando a substituição de uma e eventual liquidação em execução de sentença pelo valor que entendeu adequado, como aliás afirma; - Os danos patrimoniais sofridos pelo recorrente no que concerne a lucros cessantes tendo em conta o rendimento mensal apurado, a causa exclusiva do fim da sua actividade e a esperança de vida naquela, deverão ser reavaliados para um valor não inferior a 89.784 €; - O recorrente tem necessidade de uma terceira pessoa para as necessidades de vida do seu dia a dia, pelo que deve ser de novo atendido o valor atribuído pela sentença da Primeira Instância de 60.000$00 (300 €) mensais; - A indemnização arbitrada por danos não patrimoniais que foi exígua em função da sua gravidade deverá ser elevada para 100.000 €; - O Acórdão recorrido violou os artigos 712°, 646°n°4 do CPC e 483°, 495° e 496° do C. Civil.
A recorrida, por sua vez, contra-alegou, defendo a manutenção do acórdão impugnado.
II - Estando apenas em causa os valores relativos aos danos resultantes de lucros cessantes (89.784 €), danos emergentes respeitantes à alegada necessidade de contratar uma terceira pessoa (300 €/mensais), e danos não patrimoniais (o recorrente defende a sua fixação em 100.000 €) é irrelevante a apreciação dos factos atinentes à dinâmica do acidente - está assente que a culpa na produção do mesmo foi única e exclusivamente do condutor do veículo seguro na R. - bem como a factualidade relativa aos demais danos inicialmente alegados.
III - Balizados pelas conclusões do recurso, centremos, pois, a nossa atenção nas seguintes questões que à nossa consideração foram colocadas pela recorrente: 1ª - o Tribunal da Relação violou o art. 712º do C.P.C. quando alterou a matéria de facto? 2ª - a factualidade provada permite concluir o A.-recorrente teve, em consequência do acidente ajuizado os lucros cessantes invocados? 3ª - e que dizer relativamente aos danos emergentes alegados e relativos à contratação de uma terceira pessoa para tratar do A. em consequência directa do mesmo acidente? 4ª - a indemnização por danos morais foi devidamente ponderada no aresto sob censura? Analisemos, separadamente cada uma destas questões.
1 - a matéria de facto.
O art. 712º do CPC determina os termos em que a Relação pode alterar a base factual fixada pela 1ª Instância, circunscrevendo tal poder às hipóteses descritas nas als. a) a c) do nº1.
Quando a Relação confirma ou altera a matéria de facto, fá-lo, por regra, definitivamente. De facto, ao Supremo, enquanto Tribunal de revista, está vedado exercer censura sobre as decisões a Relação que se prendem com a concreta apreciação da prova (art. 712º, nº6, do CPC).
Contudo, o art. 712º, nº6, não exclui a possibilidade de o Supremo exercer censura sobre mau uso que a Relação faça dos poderes que lhe são conferidos.
Este nº 6 apenas veio resolver uma velha controvérsia jurisprudencial sobre se o recurso para o Supremo era admissível ou se a eventual decisão deste implicaria pronúncia sobre a matéria de facto, o que lhe está vedado.
Ora, decidir de facto significa proferir um juízo probatório, ou seja, dar como provado ou não provado um facto mediante a apreciação de um ou mais elementos de prova.
Tal juízo está, naturalmente...
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