Acórdão nº 06B849 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Março de 2006 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelSALVADOR DA COSTA
Data da Resolução23 de Março de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I AA, BB, CC, DD, EE, FF, GG, HH, II, JJ, KK, LL, MM, NN, OO, PP, QQ, RR, SS, TT, UU, VV, WW, XX, YY, ZZ, AA1, AA2, AA3, AA4, AA5, AA6, AA7, AA8, AA9, AA10, AA11, AA12, AA13, AA14, AA15, AA16, AA17, AA18, AA19, AA20, AA21, AA22, AA23, AA24, AA25, AA26, AA27, AA28, AA29, AA30, AA31, AA32, AA33, AA34, AA35, AA36, AA37, AA38, AA39, AA40, ZZ, LL, AA41, AA42 e AA28, AA43, AA44, AA45, AA46, AA47, AA48, AA49, AA50, AA30, AA51, AA52, AA53, AA54, AA55, AA56, AA57, AA58, AA59, AA60, e AA61 intentaram, no dia 29 de Janeiro de 2001, contra o Município de Ponte da Barca, acção declarativa de condenação, com processo ordinário, pedindo a declaração de serem possuidores dos reservatórios, canalizações e poças que referem, e donos e possuidores das águas que brotam no lugar do Castelo, no Monte de Cerdeira, e a condenação do réu a reconstruir, no prazo de 30 dias, novas canalizações para substituir as que destruiu, a efectuar a ligação dos tubos ao depósito e a pagar-lhe quantia inerente a prejuízos sofridos devido a privação de água e 29.755$ relativos à aquisição de canos.

Fundaram a sua pretensão na circunstância de, na sequência de apoio fornecido pelo Instituto da Reforma Agrária, haverem construído um canal que corria em paralelo com o primitivo, para efectuar as regas dos campos, e em 1988, um depósito em granito onde as águas eram depositadas e daí encaminhadas para os domicílios de todos os habitantes, de haverem adquirido as águas por usucapião, e de o réu, em 1997, haver executado os trabalhos de abastecimento de água à localidade e os haver avisado para requisitarem contadores, já que o abastecimento antigo iria ser cortado no prazo de 30 dias, e descreveram os prejuízos que afirmaram ter suportado.

O réu, em contestação, invocou serem os tribunais administrativos os competentes para conhecer da acção, e que realizou as obras para o abastecimento de água sem interferir nas captações e canalizações existentes e que as reclamadas pelos autores não foram efectuadas por eles nem à sua custa.

Os autores, na réplica, quanto à excepção, afirmaram serem competentes para ao acção os tribunais da ordem judicial por não estarem em causa interesses públicos, ampliaram a causa de pedir e o pedido, prevenindo a hipótese de as águas serem públicas, invocando a sua aquisição por pré-ocupação, e o réu respondeu no sentido da inadmissibilidade da alteração simultânea do pedido e da causa de pedir.

No saneador foi o réu absolvido da instância com fundamento na incompetência do tribunal em razão da matéria, a Relação, por acórdão proferido no dia 8 de Novembro de 2001, revogou a sentença, o processo prosseguiu, e na audiência preliminar foi admitida a ampliação requerida pelos autores sob o entendimento de que ela só abrangia a causa de pedir.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença no dia 12 de Novembro de 2004, que absolveu o réu do pedido, da qual os autores apelaram, e a Relação, por acórdão proferido no dia 9 de Novembro de 2005, negou-lhes provimento ao recurso.

Interpuseram os apelantes recurso de revista, formulando, em síntese, as seguintes conclusões de alegação: - o segmento com mais de cem anos do artigo segundo da base instrutória permite a ilação de que adquiriram o direito às litigadas águas por pré-ocupação operada antes de 21 de Março de 1868; - a referida expressão é susceptível de ser interpretada de forma a abranger o lapso de tempo anterior a 21 de Março de 1868; - os factos provados revelam que as águas públicas foram apropriadas pelos particulares, em época excedente a 100 anos, e que eles fizeram obras para efectuarem a sua captação, armazenamento e transporte; - entendendo-se que os mais de 100 anos dados como provados não são suficientes para ser dada, nessa parte, a acção como procedente, há insuficiência notória na matéria de facto dada como provada; - nesse caso, existiria insuficiência da matéria de facto que motivaria a nulidade da sentença recorrida, por não se ter pronunciado sobre todos os pedidos formulados, nos termos dos artigos 668º, nº 1, alínea d) e 712º do Código de Processo Civil, por omissão de pronúncia; - as águas vinham de terrenos pertencentes aos particulares porque as condutas saem dos terrenos baldios mas, posteriormente, percorrem terrenos dos recorrentes; - o recorrido não podia unilateralmente, e sem qualquer autorização, danificar, partir e arrancar canalizações, poças e os recipientes de armazenamento da água, e se entendesse que a água não pertencia aos recorrentes e que as condutas deviam ser retiradas, devia previamente munir-se de autorização judicial ou administrativa legitimante da sua actuação; - com os pedidos que formularam, motivados nas causas de pedir alegadas, os recorrentes baseiam as suas pretensões na responsabilidade civil por factos ilícitos praticados pelo recorrido; - ao destruir as poças e canalizações existentes, construídas para a condução da água para os domicílios dos recorrentes, actuou recorrido de forma ilícita e causou-lhes prejuízos; - o recorrido deve indemnizar os recorrentes pelos prejuízos inerentes à obra que destruiu, bem como dos que eles sofreram em resultado da sua actuação.

Respondeu o recorrido, em síntese de alegação: - os recorrentes não lograram provar os factos relativos à aquisição do direito sobre a água por pré-ocupação; - não há insuficiência notória da matéria de facto provada, mas falta de prova, que não pode ser apreciada no recurso; - a posse provada é não exclusiva por parte dos recorrentes e dos seus antecessores, mas também de outrem; - o acórdão não é nulo por omissão de pronúncia porque conheceu de toda a matéria que devia conhecer.

II É a seguinte a factualidade declarada provada no acórdão recorrido: 1. A administração do Monte da Cerdeira, sito no lugar do Castelo, freguesia do Lindoso, município da Ponte da Barca, sempre foi exercida pela Junta de Freguesia, e o seu terreno é utilizado desde tempos imemoriais pelos habitantes para nele apascentarem os seus gados e para dele extraírem as demais utilidades que permite sejam fruídas.

  1. No referido Monte, brotavam, há mais de 100 anos, naturalmente, águas do subsolo, que se encaminhavam para poças de regadio existentes no mesmo lugar, com mais de cem anos, construídas pelos antepassados dos autores, e eram aí armazenadas.

  2. Depois de armazenadas, as águas eram encaminhadas através de aquedutos a céu aberto, construídos pelos antepassados dos autores, que se estendiam por cerca de dois quilómetros, através dos quais eram transportadas para uma outra poça, denominada Fonte dos Fios, onde eram armazenadas, e, no tempo da rega, eram distribuídas pelos respectivos utentes, de acordo com os costumes e as áreas utilizadas.

  3. Em 1977, os autores solicitaram ao Instituto da Reforma Agrária um subsídio para encanar as águas desde o local das nascentes até à sua habitação, e apoios para a construção de um outro ramal, paralelo ao primeiro, para efectuar as regas dos campos, e aquele Instituto forneceu as tubagens, e os autores utilizaram o rego aberto já existente e colocaram os tubos, soldaram as emendas e colocaram terra a cobri-los, ficando enterrados a cerca de meio metro da superfície do solo.

  4. Para armazenar as águas, os autores construíram dois depósitos em pedra granítica, um para as águas destinadas à rega, e o outro para armazenar as águas destinadas às suas habitações, e conduziram o ramal de rega até à Fonte dos Fios, onde era depositado em poças a céu aberto e aí utilizado por eles, o outro canal vinha directamente às casas onde os autores moravam, e, em 1988, construíram um depósito igual em granito, onde as águas eram depositadas, de onde eram encaminhadas pela tubagem já existente, em cinco linhas, para os domicílios de todos os habitantes do lugar de Castelo.

  5. Há cerca de 15 anos, os autores efectuaram obras no reservatório sito na nascente, reformulando-o, e na mesma altura, decidiram que a distribuição da água pelas casas só existiria caso as mesmas não fossem necessárias para as regas, e se tal ocorresse, como veio a ocorrer, as águas seriam retiradas ao abastecimento das moradias e distribuídas pelos utentes dos campos.

  6. Há mais de vinte anos que pelo menos os autores vêm aproveitando as referidas águas, de acordo com o horário que lhes é destinado, do dia ou da noite, na rega e na lima dos seus prédios, e desde a mesma altura vêm limpando e desobstruindo o rego de condução de águas, à vista de toda a gente, sem oposição de ninguém, como se de donos das águas se tratasse 8. Em 1997, o Município de Ponte da Barca deliberou executar os trabalhos de abastecimento de água, saneamento e telefone no referido lugar do Castelo, e, para o efeito, colocou novas condutas de água na adução, desde a captação até ao reservatório, e construiu uma câmara de correcção da agressividade da água, bem como um reservatório em betão armado com 200 m3 de capacidade, e levou a cabo a rede de distribuição com a execução de ramais domiciliários a todas as construções existentes no local.

  7. Para execução da empreitada referida, o réu destruiu as canalizações existentes, destinadas a conduzir a água para os domicílios dos autores, colocando nova tubagem, mas a água para a rega continuou a ir para o poço existente na Fonte dos Fios.

  8. O réu também procedeu à construção de dois reservatórios em betão armado, para onde foram encaminhadas as águas, e daí construiu nova tubagem para...

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