Acórdão nº 96P392 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Outubro de 1996

Magistrado ResponsávelSILVA PAIXÃO
Data da Resolução10 de Outubro de 1996
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. O arguido A, casado, agente da P.S.P., nascido em 8 de Abril de 1959, em Parada de Cunhos, Vila Real, residente nesta cidade, na Travessa ..., e B, igualmente agente da P.S.P., foram pronunciados pela prática, em co-autoria e em concurso aparente, do crime de extorsão do artigo 317 n. 1, alínea c), e n. 5 e do crime de abuso de poderes do artigo 432, ambos do Código Penal. Submetidos a julgamento na 1. Vara Criminal do Círculo do Porto, por acórdão de 2 de Fevereiro de 1996, o B foi absolvido, mas o arguido A foi condenado como autor material do crime de extorsão do artigo 317 n. 1, alínea c), e do crime de abuso de poderes do artigo 432, em concurso real, nas penas parcelares de 10 meses de prisão e de 1 ano de prisão, respectivamente. Operado o cúmulo jurídico, foi o arguido A condenado na pena unitária de 14 meses de prisão. Por outro lado, entendeu o acórdão recorrido que tal arguido não beneficiava "do perdão da Lei 15/94, de 11 de Maio, atento o disposto no artigo 2, alínea b), deste diploma". 2. Inconformado, o arguido A recorreu desta decisão, tendo culminado a sua motivação com estas conclusões: I - "O recorrente não poderia ser condenado pela prática em concurso real dos crimes de extorsão e de abuso de poderes, uma vez que estaríamos perante uma relação de concurso aparente entre aqueles crimes, devendo aplicar-se, por consequência, a previsão e punição estatuída no artigo 317". II - "A condenação em concurso real dos dois crimes (artigo 317 e 432), quando o arguido foi pronunciado, apenas, por um deles - artigo 317 -, sendo no respectivo despacho entendida, como meramente instrumental a conduta que configuraria a prática do outro - artigo 432 -, constitui uma alteração substancial dos factos, violando, portanto, o acórdão sob recurso, o disposto no n. 1 do artigo 359 do Código de Processo Penal, com a consequente nulidade do mesmo (artigo 379, alínea b), do Código de Processo Penal)". III - "Sem prescindir, os factos dados como provados não integram o crime de extorsão, por ausência de um elemento essencial do mesmo - coacção ou ameaça - que leva ao constrangimento do pretenso ofendido". IV - "A ser entendido que os mesmos integrarão um crime de corrupção passiva previsto e punido pelo artigo 422 do Código Penal, deverá o arguido, e porque não se verificam as excepções previstas nas alíneas do n. 2 do artigo 9 da Lei 15/94, de 11 de Maio, beneficiar do correspondente perdão". 3. O Excelentíssimo Magistrado do Ministério Público, na sua resposta, pugnou pela manutenção do acórdão. Colhidos os vistos, realizou-se o julgamento com observância do ritualismo legal, cumprindo, agora, decidir. 4. O Tribunal Colectivo deu estes factos como provados: a) Os arguidos A e B, como agentes da Polícia de Segurança Pública do Porto, integraram, até meados de Outubro de 1993, uma "Brigada de acidentes" ou "Brigada de exteriores", também conhecida, em designação policial, por "Tango 22", assim funcionalmente lhes competindo, para além de genéricas atribuições de fiscalização do trânsito automóvel, acorrer a quaisquer situações estradais que reclamassem a intervenção e a presença das forças policiais. b) Para tanto, estava-lhes atribuída uma viatura policial, devidamente individualizada como tal, onde se transportavam. c) Na sobredita qualidade e em execução de tais atribuições, foram os arguidos chamados, pelas 1 hora e 20 minutos do dia 29 de Setembro de 1993, a tomar conta de uma ocorrência relacionada com um acidente de viação ocorrido na Rua ..., junto ao cruzamento com a Rua ... desta cidade. d) Aí chegados, constataram que, pouco tempo antes, tivera lugar uma violenta colisão envolvendo vários veículos automóveis, supostamente provocada pela condução contravencional do condutor do veículo causador do embate, C, já que o mesmo, que circulava pela citada Rua ..., no sentido norte/sul, não teria respeitado a sinalização luminosa, então na cor vermelha, do semáforo instalado naquele cruzamento, atento o seu sentido da marcha. e) Assim, e enquanto o arguido B recolhia os elementos necessários à elaboração da correspondente "participação do acidente de viação", verificando a posição final dos veículos e efectuando medições, o arguido A procedia à identificação do sobredito C determinando-lhe, ainda, a realização de um teste de alcoolémia, o qual daria resultado negativo. f) É, então, que o arguido A, visando aproveitar-se economicamente das suas especiais funções de policiamento, aborda o aludido C, o qual se lhe apresenta particularmente perturbado, não só por via do acidente em causa, como pelo facto de pretender evitar que a sua esposa, consigo residente em Amarante, viesse a saber da sua presença no Porto, àquelas horas, pretensão esta que o C transmitiu, em tom de desabafo e de lamentação, ocasionalmente, ao arguido A. g) Ao aperceber-se deste particular estado de perturbação e ansiedade, o arguido A informou o aludido C de que, em face da gravidade da ocorrência (sinistro), teria de ser imediatamente detido e conduzido ao correspondente posto policial. h) E fê-lo com tal convicção e seriedade que criou naquele condutor a certeza de que tal detenção...

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