Acórdão nº 98S086 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 24 de Fevereiro de 1999

Magistrado ResponsávelJOSÉ MESQUITA
Data da Resolução24 de Fevereiro de 1999
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1. A, e B, com os sinais dos autos, intentaram no Tribunal do Trabalho de Barcelos a presente acção com processo ordinário, emergente de contrato individual de trabalho, contra: C, também devidamente identificada nos autos, pedindo: - que seja declarado ilícito o seu despedimento e a Ré condenada a reintegrá-las, salvo opção de indemnização de antiguidade e a pagar-lhes os salários e subsídios desde o despedimento até à data da sentença e, a título de danos morais, 3317000 escudos, à primeira, e 2996000 escudos, à segunda, - que seja declarado terem rescindido o contrato de trabalho com justa causa e a Ré condenada a pagar-lhes, respectivamente 1685500 escudos e 1498000 escudos, acrescidas das seguidas indemnizações a título de danos morais, tudo com juros. Alegaram, em síntese, e para o que aqui importa: - Ter-lhes a Ré alterado o começo do horário de trabalho que era às 8 horas e passou para as 6 horas da manhã; - Ter-lhes proporcionado transporte apenas durante dois meses; - Findos estes e porque não dispunham de transporte público que lhes permitisse chegar ao local de trabalho às 6 horas, apresentaram-se às 8 horas, cumprindo o horário anterior; - A Ré recusou-lhes a entrada por vários dias em que continuaram a apresentar-se por volta das 7 horas e 30 minutos. Configurando esta atitude um despedimento sem justa causa e, portanto, ilícito ou, sempre teria fundamento para invocar, como realmente invocaram, por mera cautela, rescisão do contrato com justa causa, por carta datada de 23 de Junho de 1994, com efeitos a partir de 24. 2. Contestou a Ré, alegando, em resumo: - que nunca despediu as Autoras, tendo o seu contrato de trabalho caducado apenas em 24 de Junho de 1994, por força das cartas que lhe enviaram a comunicar a rescisão unilateral; - que a alteração do horário foi ditado para fazer face a imperativos de concorrência no sector; - que o transporte facultado, sempre o foi com carácter transitório, o que as A.A. aceitaram; - estavam, pois, vinculadas a iniciar o trabalho às 6 horas da manhã; - não há justa causa para a rescisão pelas Autoras que, por isso, incorreram em sucessivas faltas não justificadas; - a rescisão devia ser comunicada com 60 dias de antecedência. Conclui pedindo que as acções sejam julgadas improcedente e, em reconvenção, que cada uma das Autoras seja condenada a pagar-lhe 107000 escudos de indemnização devida pela falta de aviso prévio. 3. Responderam as Autoras, invocando a inaptidão da reconvenção, por falta de indicação dos valores, o que foi suprido pela Ré. 4. Foi proferido despacho saneador a admitir a reconvenção, organizada a especificação e o questionário, prosseguindo o processo para julgamento, realizado e qual foi proferida a douta sentença de folhas 160 e seguintes, na qual se decidiu: - absolver a Ré de todos os pedidos principais; - julga parcialmente procedentes cada um dos pedidos subsidiários e a Ré condenada a pagar a cada uma das Autoras a quantia de 1658500 escudos, com juros de mora à taxa de 15 por cento, desde a citação até 30 de Setembro de 1995 e à taxa de 10 por cento de 1 de Outubro de 1995 até ao pagamento; - absolver a Ré dos demais pedidos subsidiariamente; - absolver as Autoras do pedido reconvencional formulado pela Ré. 5. Desta sentença recorreu a Ré de apelação para a Relação do Porto que por seu acórdão de folhas 200 e seguintes lhe negou provimento pelos fundamentos da decisão recorrida e, assim, inteiramente confirmada. II 1. É deste aresto que vem o presente recurso de revista, interposto pela Ré, no qual começa por arguir a nulidade do acórdão da Relação, por violação das conjugadas disposições dos artigos 158, ns. 1 e 2, 659, n. 2, 660, n. 3 e 668, n. 1, alínea b), todos do Código de Processo Civil, por falta de motivação e, apresenta depois as seguintes CONCLUSÕES: 1. As recorridas deixaram de receber qualquer remuneração a partir de 14 de Abril de 1994 e na comunicação que dirigiram à recorrente a rescindirem os seus contratos de trabalho, que teve lugar cerca de dois meses depois, aí referiram também que o não pagamento dos salários se verificava desde 15 de Abril de 1994, estando há muito excedido o prazo de 15 dias subsequente ao conhecimento dos factos, pelo que, por força do n. 2 do artigo 34, do Decreto-Lei 64-A/89, era devido às recorridas e ao tribunal justificarem as rescisões dos contratos com arrumo nesses factos. 2. Por outro lado, a legitimidade de rescisão dos contratos de trabalho das recorridas só podia ser apreciada com base no fundamento por elas invocado, a falta de pagamento de salários com louvação no disposto no artigo 3 da Lei n. 17/86 e nunca a partir das alíneas a) e h) do n. 1, do artigo 35 do Decreto-Lei n. 64-A/89. 3. Para que a rescisão de um contrato de trabalho possa ser feita, a partir do n. 1 do artigo 35 do Decreto-Lei 64-A/89, tem que existir justa causa assente num comportamento culposo da entidade patronal. O abuso de direito pressupõe a existência do próprio direito exercido sem culpa e esgota-se no plano da ilicitude, com a única consequência de determinar a não tutela do direito assim exercido, sem que se invista o lesado num direito de sinal contrário. Consequentemente, o imposto abuso de direito por parte da recorrente não é culposo e, por essa via o artigo 334 do Código Civil não é aplicável ao caso dos autos e nunca constituiria justa causa de rescisão dos contratos de trabalho das recorridas ao abrigo do artigo 35 do Decreto-Lei 64-A/89. 4. De qualquer modo, a recorrente não abusou do seu direito de determinar às recorridas num horário de trabalho semanal, já que o mesmo foi imposto por exigências do seu funcionamento e de sobrevivência e actuou de boa fé e na prossecução do escopo económico e social desse seu direito "que vem previsto no artigo 11 do Decreto-Lei n. 409/71, de 27 de Setembro, e, por seu turno o único interesse dos recorridos que foi aplaudido, a falta de transporte, não tem qualquer relevância jurídica. 5. E, não havendo abuso do direito, a sentença recorrida fez uma indevida interpretação e aplicação do direito na medida em que a factualidade sub judice não é subsumível à previsão do artigo 334 do Código Civil, e do n. 1, do artigo 35 do Decreto-Lei 64-A/89 e seria, quando muito, enquadrável na previsão da alínea b) do n. 2, do artigo 35 do mesmo diploma, que não confere direito a qualquer indemnização, conforme resulta o seu artigo 36. Conclui pedindo a revogação do acórdão e da sentença da 1. instância. 2. As recorridas contra-alegaram...

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