Acórdão nº 0316114 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 05 de Maio de 2004 (caso NULL)
Magistrado Responsável | ÂNGELO MORAIS |
Data da Resolução | 05 de Maio de 2004 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Acordam, em audiência, no Tribunal da Relação do Porto: No processo comum singular nº../.., que corre termos na comarca de....., realizado o julgamento, sentenciou-se: "1 - condeno a arguida M....., Lda, pela prática, na forma continuada, de um crime de abuso de confiança fiscal, p°. e p°. pelos art°s 7° e 105° n°s 1 e 5 da Lei N° 15/2001, de 5 de Junho, na pena de setecentos dias de multa, à taxa diária de dez euros, o que perfaz a multa global de sete mil euros; 2 - condeno o arguido B....., pela prática, em autoria material e na forma continuada, de um crime de abuso de confiança fiscal, p°. e p°. pelo art° 105º nºs l e 5 da Lei N° 15/2001, de 5 de Junho, na pena de um ano e seis meses de prisão; 3 - decido suspender a execução daquela pena de prisão pelo período de dois anos, suspensão essa subordinada ao pagamento à Fazenda Nacional, no mesmo prazo, dos montantes em débito, acrescidos dos respectivos juros moratórios".
*Inconformado com tal decisão, dela interpõe recurso para esta Relação o arguido B....., que remata a sua motivação com as seguintes conclusões: «A - Porque o seu exacto sentido é esse, como se colhe até da prova produzida em julgamento, as alíneas c), d), e), f), g), h), j) e k) da matéria de facto dada como apurada na douta sentença recorrida, bem como toda a demais matéria de facto, ser interpretada que o recorrente agiu apenas em nome e representação da co-arguida e jamais a título pessoal; B - Para além do que consta da alínea bb) da referida matéria de facto, e dado que tal era já do conhecimento do Mmº Juiz a quo, deve ter-se em devida conta tudo quanto se contem no Relatório apresentado, nos termos do art. 38º do CPEREF, pela Gestora Judicial, que se junta e cujo teor aqui se dá por reproduzido, C - Por via do qual deve ainda adicionar-se à dita matéria de facto que "como resulta dos mapas anexos a tal relatório, há vários anos que a empresa "M....., Lda", vem apresentando uma situação económica-financeira muito difícil".
D - O recorrente, na qualidade de gerente daquela sociedade, e em representação dela, "face às dificuldades económicas e financeiras porque a primeira arguida atravessa, optou por satisfazer as suas obrigações para com os trabalhadores e fornecedores", assim conseguindo manter a laboração da empresa e salvaguardar a existência de 69 postos de trabalho, o que socialmente é extremamente importante numa região como aquela em que a mesma se insere.
E -Até por isso, deve ser eliminada da alínea i) da matéria de facto a expressão, conclusiva e de direito, "sem qualquer causa justificativa", assim como não pode dar-se como provado nos vários itens da alínea d), na alínea e) e na alínea h) da referida matéria de facto, que o recorrente "podia" pagar.
F - Dos autos se colhe que nem o recorrente nem a sociedade co-arguida, que tem a falência como solução muito provável, dispõem de possibilidades económicas e financeiras de, num prazo de 2 anos, pagar à Fazenda Nacional a quantia de € 388.834,54 (77.954.326$00) e respectivos juros compensatórios, G - Pelo que a suspensão da execução da pena subordinada a tal pagamento não passa da imposição de um dever que logo à partida se verifica que o recorrente não pode cumprir, não sendo, por isso, mais que apenas adiar a execução da pena, e isto em manifesta violação do nº 2 do art. 51º do C. Penal, H - Preceito este que consagra o denominado princípio da razoabilidade, manifesto desdobramento do princípio constitucional da proporcionalidade, consagrado no art. 266º nº 2 da CRP.
I - O disposto no art. 14º da Lei nº 15/2001 se interpretado e aplicado no rigor dos seus precisos termos e sem observância dos ditos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade é inconstitucional, pelo que não pode o mesmo deixar de ser interpretado e aplicado à luz de tais princípios e, desde logo, do nº 2 do artº. 51º do C Penal.
J - Tais principies informam e aplicam-se a todo o nosso ordenamento jurídico e especialmente ao direito penal, como tem sido entendimento dominante da nossa jurisprudência de que se citam os seguintes arestos mencionados no texto desta alegação:- Ac. Trib. Rel. de Guimarães, de 10.07.2003, Ac. S.T.J., de 14.03.2002 e Ac. Trib. Constitucional, de 04.04.2000.
K- À luz destes princípios constitucionais e do respeito que lhes é devido, deve, no caso presente, revogar-se a condição imposta na douta sentença recorrida para aplicação da suspensão da execução da pena.
L- Tal interpretação e aplicação do citado art. 14º da Lei nº 15/2001, como ocorrido na sentença recorrida, ofende ainda o princípio da igualdade, pois privilegia manifestamente o Estado em relação aos demais cidadãos, dispensando aquele da aplicação do estabelecido no nº 2 do art. 51º do C.Penal, M- Donde também a revogação referida na precedente alínea K. destas conclusões».
*Na sua exaustiva resposta, o Ministério Público, conclui pela constitucionalidade e confirmação do decidido.
*Nesta Instância, o Senhor procurador-geral adjunto opina igualmente pelo não provimento do recurso.
*Cumprido o disposto no artº417º nº2 do Cód. Proc. Penal, nada foi acrescentado.
*Colhidos os legais Vistos, cumpre decidir, atenta a fundamentação e motivação da sentença sob censura que, na sua pertinência, se transcreve seguidamente: "2.1 Da matéria de facto provada: a) a sociedade arguida, com o NIPC 000 000 000, e com sede no lugar....., em ....., encontra-se colectada em Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas e enquadrada em Imposto Sobre o Valor Acrescentado, pelo exercício da actividade de serração de madeira (CAE 0001), no regime normal de periodicidade mensal; b) o arguido B..... sempre foi o sócio-gerente da sociedade arguida, mantendo-se até aos dias de hoje nessa qualidade; c) porém, a partir de dado momento, o arguido B..... decidiu fazer suas e não entregar nos cofres da Fazenda Pública as quantias em dinheiro provenientes de IVA por cada transacção ou prestação de serviços que a sociedade efectuou aos seus clientes; d) deste modo, em obediência a esse mesmo desígnio, o arguido, no giro comerciai da actividade de serração de madeiras a que a sociedade se dedicava, apropriou-se das quantias que se passam a discriminar: - preencheu e enviou, no dia 18/10/2001, a declaração periódica de IVA, referente ao período 01.01, na qual se apurou que tinha de entregar nos cofres da Fazenda Pública o montante de 4 650 404$00 (23 196,12 Euros), o qual não entregou, como podia e devia; - preencheu e enviou, no dia 18/10/2001, a declaração periódica de IVA, referente ao período 01.02, na qual se apurou que tinha de entregar nos cofres da Fazenda Pública o montante de 3 161 009$00 (15 767,05 Euros), o qual não entregou, como podia e devia; - preencheu e enviou, no dia 18/10/2001, a declaração periódica de IVA, referente ao período 01.03, na qual se apurou que tinha de entregar nos cofres da Fazenda Pública o montante de 1 814 739$00 (9 U51.68 Euros), o qual não...
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