Acórdão nº 0320097 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 18 de Fevereiro de 2003 (caso NULL)

Data18 Fevereiro 2003
ÓrgãoCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação do Porto: RELATÓRIO Fátima....., por si e na qualidade de legal representante de seu filho menor Hugo.....; e Ricardo..... intentaram, no Tribunal Judicial de....., a presente acção com processo ordinário contra: - Fundo de Garantia Automóvel, pedindo a condenação deste no pagamento da quantia total de Esc. 32.340$00, acrescida dos juros de mora legais, a partir da citação.

Alegaram, para tanto, em resumo, que, no dia 20/2/98, ocorreu um acidente de viação que vitimou Américo....., marido da 1.ª e pai dos demais Autores; que é de presumir que o Américo, com prudência e atenção, conduzia o seu veículo motorizado pela metade direita da faixa de rodagem, tendo em conta o seu sentido de marcha, onde terá sido embatido por um veículo desconhecido que circulava em sentido contrário; que desse embate lhe resultaram lesões que lhe provocaram a morte, tendo os Autores sofrido danos patrimoniais e não patrimoniais que pretendem ver ressarcidos.

Contestou o Ré, impugnando a generalidade dos factos alegados, por não serem do seu conhecimento, aduzindo que a indemnização peticionada se lhe afigura exagerada.

Proferiu-se o despacho saneador, consignaram-se os factos tidos como assentes e elaborou-se a base instrutória, sem reclamações.

Procedeu-se a audiência de discussão e julgamento, finda a qual se respondeu à matéria da base instrutória, também sem reclamações.

Finalmente, verteu-se nos autos sentença que, julgando a acção parcialmente procedente, condenou o Réu a pagar aos Autores a quantia global de Esc. 14.500.000$00, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data da sentença.

Inconformados com o assim decidido, interpuseram, sucessivamente, recurso o Réu e os Autores, os quais foram admitidos como de apelação e efeito suspensivo.

Alegaram, oportunamente, os apelantes, os quais finalizaram as suas alegações com a seguinte síntese conclusiva: A - O Réu 1.ª - "As directivas comunitárias reconhecem aos seus destinatários liberdade de escolha de meios para satisfação do resultado que impõem e não gozam de efeito directo, atendendo à teleologia da figura, à vontade dos outorgantes dos tratados constitutivos da comunidade e às nítidas diferenças de regime existente entre estas e os regulamentos; 2.ª - Aquilo que decorre da directiva 84/5/CEE , é unicamente a obrigação de criação de um organismo que tenha por missão reparar, pelo menos dentro dos limites da obrigação de seguro, os danos materiais ou corporais causados por veículos não identificados ou relativamente aos quais não tenha sido satisfeita a obrigação de segurar; 3.ª - A directiva em causa é relativa à aproximação das legislações dos Estados-membros respeitantes ao seguro de responsabilidade civil que resulta da circulação de veículos automóveis e não à harmonização do direito privado; 4.ª - Os Estados-membros gozam de liberdade para, dentro do limite máximo decorrente da obrigação de seguro e com respeito pelo princípio do pagamento da indemnização, estabelecer as condições de efectivação da indemnização quer com base no risco ou na culpa; 5.ª - Em todo o caso, não é reconhecido efeito directo horizontal às directivas, isto é, das normas da directiva não resultam obrigações para os particulares ou outros entes diversos do Estado; 6.ª - Na verdade, as directivas não são objecto de publicação obrigatória (cfr. o artigo 254.º, n.º 1 do Tratado de Roma), e, por outro lado, os destinatários e sujeitos das obrigações impostas pelas directivas são os estados membros, não podendo os particulares ou entes equiparados a estes serem obrigados directamente por elas; 7.ª - Violar-se-ia o princípio da protecção da confiança se as entidades privadas ou públicas fossem objecto de condenação em função do não cumprimento de obrigações por parte do Estado ou sem que o Estado tivesse criado regras de direito interno que os vinculasse; 8.ª - O recorrente não é destinatário da directiva em causa, não tem a qualidade jurídica de estado membro da União Europeia, a sua actuação rege-se pelo direito privado, é responsável subsidiário, substituindo um particular no pagamento da indemnização e está equiparado às entidades seguradoras, não podendo tratar-se desigualmente os lesados que beneficiem destas ou do recorrente; 9.ª - Considerar, como a faz a sentença sob recurso, que a responsabilidade pelo risco não é aplicável, é interpretação que colide com os dados de direito comunitário que acima se elencaram, de tal modo que o Tribunal acaba por admitir, por essa via, aquilo que o próprio direito comunitário não reivindica para si, ou seja, o efeito directo horizontal das directivas; 10.ª - Tendo em conta a matéria de facto considerada provada, conclui-se que a responsabilidade deve situar-se dentro dos limites do risco, aplicando-se o art.º 508.º do Código Civil e limitando-se a condenação do recorrente ao valor do dobro da alçada da relação vigorante à data do acidente (19.951,91 Euros - Esc. 4.000.000$00); 11.ª - Ao não se interpretar e aplicar da forma acima assinalada o Tribunal a quo violou o artigo 1.º e 21.º do Dec. Lei n.º 522/85, de 31/12 e os artigos 249.º e 254.º n.º 1, do Tratado de Roma, o artigo 9.º e 508.º do Código Civil".

B - Os Autores 1.ª - "Os elementos constantes dos autos, impõem um(a) resposta, ainda que parcialmente, diversa ao ponto 28 da Base Instrutória, insusceptível de ser afastada por qualquer outro meio de prova; 2.ª - Deverá por isso a resposta dada ser alterada no sentido que se propõe: "O falecido Américo conduzia o seu veículo motorizado pela metade direita da faixa de rodagem da supra referida estrada, dando uma curva para a direita em direcção a......; Consequentemente, 3.ª - Por violação do disposto no art.º 13.º n.º 1 do C. da Estrada, deve o condutor desconhecido do veículo não identificado, ser considerado o único e exclusivo culpado na produção do acidente; 4.ª - Os montantes arbitrados pela perda do direito à vida, sofrimento do falecido Américo e danos não patrimoniais aos AA. são, no apelo aos princípios da equidade, manifestamente, exíguos; 5.ª - A indemnização global pela perda do direito à vida e dano moral do falecido Américo, deverá ser fixada em pelo menos 50.000 Euros; 6.ª - E a indemnização, a cada um dos AA. pelos danos não patrimoniais padecidos, fixada em 20.000 Euros; 7.ª - Foram violados os art.ºs 349.º, 566.º n.º 3 do C. Civil e art.º 13.º n.º 1 do C. da Estrada".

Nenhum dos apelados apresentou contra-alegação.

...............

O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões dos recorrentes, nos termos do disposto nos artºs 684º, n.º3, e 690º, n.º 1, do C. de Proc. Civil.

De acordo com as apresentadas conclusões, as questões a decidir por este Tribunal são as de saber, em relação ao recurso do Réu, se a indemnização a arbitrar aos Autores está sujeita ao limite imposto pelo art.º 508.º do C. Civil; e, no tocante ao recurso dos Autores, se é de alterar a resposta ao quesito 28.º da base instrutória, devendo, por via dessa alteração, ser considerado único culpado pelo acidente o condutor do veículo desconhecido; e se devem ser alterados os montantes da indemnização atinentes aos danos pela perda do direito à vida e sofrimento do falecido, bem como os não patrimoniais sofridos por cada um dos Autores.

Foram colhidos os vistos legais.

Cumpre decidir.

...............

OS FACTOS Na sentença recorrida, foram dados como provados os seguintes factos: 1.º - A Autora Fátima..... foi casada no regime de comunhão de adquiridos com Américo.....; 2.º - Américo..... faleceu no estado de casado em primeiras núpcias com a 1.ª Autora sem deixar testamento ou qualquer disposição de última vontade; 3.º - Ricardo..... e Hugo..... são filhos de Américo..... e de Maria de Fátima Gomes Almeida; 4.º - Américo..... faleceu no dia 25 de Fevereiro de 1998, com 40 anos de idade; 5.º - No dia 20 de Fevereiro de 1998, pela 1 hora da madrugada, o falecido Américo saiu da sua residência com destino a...... para iniciar o seu turno de trabalho na firma "L....., S.A"; 6.º - Fazendo-se transportar no seu veículo motorizado matrícula ..-OVR-..-..; 7.º - Habitualmente, o falecido Américo saía da sua residência em direcção à freguesia de S. Martinho da Gândara, daí prosseguindo para o..... e aí tomando a estrada que liga esta freguesia à cidade de.....; 8.º - Nesse dia, por volta da 1,30...

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