Acórdão nº 0344749 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 25 de Fevereiro de 2004 (caso NULL)
Magistrado Responsável | ISABEL PAIS MARTINS |
Data da Resolução | 25 de Fevereiro de 2004 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
ACORDAM NA SECÇÃO CRIMINAL (2.ª) DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO I 1. No processo n.º ..../00.7PAVCD do 1.º juízo criminal de Vila do Conde, após julgamento, em processo comum e perante tribunal colectivo, por acórdão de 16 de Maio de 2003, foi o arguido A.......... condenado, no que ora releva, pela prática de um crime de homicídio simples, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 22.º, 23.º, 73.º e 131.º do Código Penal [Daqui em diante abreviadamente designado pelas iniciais CP], na pena de 4 anos e seis meses de prisão.
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Inconformado, o arguido veio interpor recurso do acórdão, rematando a motivação com a formulação das seguintes conclusões: «1.ª - A disciplina exceptiva prevista na primeira parte do n.º 2 do artigo 428.º do CPP, ex vi n.º 2 do artigo 410.º do mesmo diploma, legitima aqui, concretamente, o recurso e conhecimento por este tribunal da matéria de facto.
«2.ª - Pois a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, as contradições insanáveis da fundamentação e entre esta e a decisão e o erro notório na apreciação da prova resultam, essencialmente, do próprio texto recorrido, por si só e quando conjugado com as regras da experiência comum.
«3.ª - Dá-se aqui por integralmente reproduzida toda a factualidade que o acórdão em questão deu como provada, salientando-se, no entanto, alguns aspectos que da mesma e dos autos decorrem, a que ou aos quais não foi dado o devido valor.
«4.ª - À data dos factos o arguido tinha a idade de 17 anos e não apresentava quaisquer antecedentes criminais, embora à data do acórdão proferido nestes autos tivesse já sido julgado e condenado pela prática de factos que, cronologicamente, antecederam os deste.
«5.ª - O arguido tomou a iniciativa de se dirigir ao ofendido, que estava acompanhado de um grupo de amigos e despoletou discussão entre ambos, desconhecendo-se quem a iniciou.
«6.ª - Antes de o arguido desferir um golpe na pessoa do ofendido, com uma faca de cozinha, anunciou-lhe que o ia mandar para o hospital, para fazer companhia a alguém que já lá estava.
«7.ª - De toda a a factualidade plasmada no acórdão recorrido é impossível extrair-se qualquer indicação, por mínima que seja, de que o arguido tivesse tido a intenção ou tão só a representação da eventualidade da sua conduta poder advir a morte do ofendido e, mesmo assim, se ter conformado e aceite esse possível resultado.
«8.ª - Em consequência do golpe infligido pelo arguido, sofreu o ofendido "solução de continuidade" na região infraclavicular de dimensões e características desconhecidas, que lhe demandaram dez dias de doença, das quais não resultaram sequelas valorizáveis, nem cicatrizes desfigurantes.
«9.ª - A matéria da alínea e) dos factos considerados provados não passa de expressão conclusiva e vazia de interesse, sem qualquer base concreta, objectiva e factual, que a baseie e/ou onde possa alicerçar-se.
«10.ª - O relatório do IML é absolutamente incongruente e contraditório, tanto entre si como com a matéria dada por provada e a fundamentação.
«11.ª - Com efeito, este incompletíssimo relatório "descreve" um traumatismo, não seguido de fractura, na mão esquerda do ofendido (aqui discriminando o tamanho: 03 cm) e outro, igualmente sem fractura, na região infraclavicular direita do mesmo, sem dimensão nem profundidade, cujas consequências, do ponto de vista médico-legal, são totalmente inadequadas impróprias para sustentar a 4.ª conclusão que no mesmo se faz.
«12.ª - Este relatório, como elemento de prova ... nada prova! «13.ª - A factura de fls. 115 motivou a prova extraída pelo tribunal, mas já não a de fls. 117, que, curiosamente, prova que o arguido também teve de ser tratado em consequência do mesmo episódio, logo, que igualmente também sofreu ferimentos, de onde resultaram lesões.
«14.ª - Assim sendo, como é, ocorre insuficiência para a matéria de facto provada, quer por si só, quer de acordo com as regras da experiência comum.
«15.ª - Como deficiente apreciação ou valoração dessa mesma prova, de onde erro notório na respectiva ponderação.
«16.ª - Como contradição insanável da e na fundamentação com a decisão proferida.
«17.ª - Todos este vícios acontecem no próprio texto decisório.
«18.ª - O nexo de causalidade entre o comportamento do arguido e as lesões sofridas pelo ofendido está em completa dissonância e oposição ao tipo incriminador aplicado pelos julgadores.
«19.ª - Nada se provou relativamente às características do golpe perpetrado pelo arguido na vítima: profundidade, superficialidade, extensão, forma, localização precisa, se perto ou longe de órgãos vitais, lesão concreta derivada, etc.
«20.ª - Não se provaram os murros ou pontapés de que o ofendido, logo desde a primeira hora, imputou ao arguido (fls. 2).
«21.ª - Não se provou o modo, forma e intensidade da agressão.
«22.ª - No relatório do IML fala-se em n.º de lesões, quando só uma, hipoteticamente, poderia ser potencialmente letal, enquanto apenas se provou que o arguido desferiu um só golpe e na sentença aqui posta em crise, na respectiva fundamentação, se fala em "facadas".
«23.ª - Ficou por provar toda a matéria essencial relativa ao tipo concreto de agressão, às lesões objectivas derivadas, às características, forma e volume da acção.
«24.ª - Hemitorax e região infraclavicular não são uma e a mesma coisa.
«25.ª - A acção cometida pelo arguido, de acordo com a prova feita, revela todo o seu elemento volitivo: ofender a integridade física da vítima, sendo inadequado, por absoluta falta de prova, concluir por uma qualquer alteração do seu processo volitivo.
«26.ª - É ostensivamente insuficiente para a decisão a matéria de facto provada.
«27.ª - Nem se ficou a saber porque razão costumava o arguido andar sempre munido de faca.
«28.ª - É impossível, com a factualidade que temos, preencher o tipo de crime pelo qual o arguido foi condenado.
«29.ª - Não se provou nenhum facto de onde decorra que o arguido se tenha conformado com o resultado morte e, mesmo assim, não se tenha demovido de actuar.
«30.ª - Os ferimentos sofridos pelo ofendido não foram sequer potencialmente mortais, daqui também contradição manifesta entre os fundamentos e a decisão.
«31.ª - Para estabelecer nexo de causalidade adequada entre a decisão e os factos provados mostra-se necessária a produção de nova e mais prova.
«32.ª - De acordo com as regras da experiência comum, a actuação do agente só pode enformar determinado tipo de ilícito criminal quando, dos factos pelo mesmo cometidos, seja seguro e suficiente concluir que o agente quis efectivamente praticar essa acção, conforme decorra concludentemente da factualidade produzida.
«33.ª - A acção do arguido é completamente desproporcional à figura do homicídio simples na forma tentada.
«34.ª - O erro de julgamento sobre a prova produzida é ostensivamente notório e resulta do próprio texto da decisão recorrida.
«35.ª - Não se deu como provada a intenção de matar, que integra matéria de facto, o que é contraditório com o dizer-se depois que se previu a possibilidade de a morte vir a ocorrer.
«36.ª - O ofendido não foi atingido com a gravidade em qualquer órgão do seu corpo.
«37.ª - A intenção revelada pelo arguido (de mandar a vítima para o hospital) é incompatível com a conformação de resultado diferente.
«38.ª - O erro notório na apreciação da prova resulta tanto da factualidade provada, como da inaptidão desta para o preenchimento do tipo de ilícito criminal em questão.
«39.ª - Deste modo, deve o crime imputado ao recorrente ser convolado para outro tipo, a saber, o de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo artigo 143.º do CP.
«40.ª - Ou, então, terão os autos de baixar de novo à 1.ª instância, anulando-se o julgamento, consequentemente, repetindo-se o mesmo no tribunal dessa instância que for o próprio, para apuramento de outra eventual e acrescida prova.
«41.ª - Perante a formulação do artigo 22.º, n.º 1, do CP, não existe tentativa se o arguido agiu apenas com dolo eventual.
«42.ª - Só há tentativa quando o agente pratica actos de execução de um crime que decidiu cometer - irrecusável e inequívoca decisão de querer praticar um determinado tipo de crime.
«43.ª - ou se quer de modo intencional ou se representa como possível.
«44.ª - São claras e inequívocas as respectivas disposições legais - artigos 14.º, n.º 3, e 22.º, n.º 1, do CP: a tentativa exige o propósito criminoso, não admitindo a mera eventualidade de representação.
«45.ª - Há tentativa quando o agente pratica actos de execução de um crime que decidiu cometer sem que este chegue a consumar-se.
«46.ª - No dolo eventual não existe uma intenção directamente dirigida à consumação do crime e a expressão "decidiu cometer" exprime um critério objectivo claro, sem deixar quaisquer margens para...
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