Acórdão nº 0422740 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 25 de Maio de 2004
Magistrado Responsável | ALBERTO SOBRINHO |
Data da Resolução | 25 de Maio de 2004 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório COMPANHIA DE SEGUROS....., SA, com sede no Largo....., em...., intentou a presente acção de condenação, emergente de acidente de viação, com processo sumário, contra B....., residente na Rua ....., em ....., pedindo que seja condenado a pagar-lhe a quantia de 8.921,48 €, acrescida de juros de mora desde 02/09/02 até integral pagamento, quantia esta correspondente à indemnização paga ao proprietário do veículo danificado num acidente provocado pelo veículo conduzido pelo réu, além de que este o conduzia ainda com uma taxa de alcoolémia superior à taxa legal. Tendo pago essa indemnização como seguradora do veículo do réu, invoca o direito de regresso para reclamar o pagamento da indemnização satisfeita ao condutor do outro veículo.
Contestou o réu, imputando o acidente a condução negligente do outro condutor e afirmando que não conduzia sob o efeito do álcool e mesmo que estivesse com uma taxa superior à legalmente permitida, esta não teria interferido com a condução, não diminuindo a sua capacidade de destreza, segurança e atenção exigíveis.
Elaborado o despacho saneador, foi a selecção da matéria de facto controvertida dispensada por essa selecção se revestir de manifesta simplicidade.
Teve lugar, por fim, a audiência de discussão e julgamento.
Na sentença, subsequentemente proferida, foi a acção julgada improcedente e o réu absolvido do pedido.
Inconformada com o assim decidido, recorreu a autora, defendendo que o direito de regresso existe logo que o condutor tenha agido sob a influência do álcool.
O réu não contra-alegou.
***Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
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Âmbito do recurso A- De acordo com as conclusões, a rematar as respectivas alegações, o inconformismo da recorrente radica no seguinte: 1- A recorrente não pode concordar com a decisão subjúdice, com base na interpretação do art. 19º alínea c) do Dec-Lei 522/85, de 31/12, efectuada pelo Acórdão Uniformizador de Jurisprudência.
2- O citado Acórdão Uniformizador de Jurisprudência não possui eficácia vinculativa fora do caso concreto a que se reporta.
3- No entender da Recorrente, que se identifica inteiramente com as posições plasmadas nos votos de vencido, a interpretação da norma efectuada pelo citado Acórdão viola a lei substantiva, é contrária aos princípios da interpretação da lei, dos contratos, da produção de prova e, sobretudo, põe em causa a unidade do sistema jurídico.
4- O legislador no art. 19° alínea c) do Decreto-Lei 522/85, de 31/12, estabelece que a Seguradora tem direito de regresso contra o condutor que "tiver agido sob a influência do álcool".
5- A definição de "condução sob influência de álcool" há que a encontrar no seio do ordenamento jurídico, buscando a respectiva coerência e unidade.
6- Assim, há que buscar a definição que se encontra plasmada no art. 81° do Cód. da Estrada que esclarece no seu n° 2 "Considera-se sob influência do álcool o condutor que apresente uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 0,5 g/l ou que, após exame realizado nos termos previstos no Código da Estrada e Legislação Complementar, seja como tal considerado em relatório médico".
7- Neste preceito, não restam quaisquer dúvidas, que o legislador estabeleceu uma presunção legal "júris et de jure" de que - a partir do limite mínimo de 0,5 g/l- o álcool influencia o condutor na sua actividade de condução, uma vez que inevitavelmente, para além de tal limite, o álcool afecta a capacidade de percepção, os reflexos, a capacidade motora, a destreza de movimentos, a visão e a atenção.
8- Esta consagração legal, parte de constatações de estudos científicos irrefutáveis, que apontam para a clara interferência do álcool no organismo humano e nas respectivas capacidades (motoras, de percepção, dos sentidos, dos reflexos).
9- É também da ciência que advém as fórmulas ou métodos para medir a quantidade de álcool no sangue por que se estabeleceram os limites de álcool no sangue por g/l, a partir dos quais o álcool interfere indubitavelmente nas capacidades do indivíduo necessárias à actividade de conduzir.
10- Estar sob o efeito de álcool e a respectiva interferência na condução é um dado científico, mensurável, adquirido. Estamos, pois, no âmbito de dados científicos que se traduziram em prescrições legais.
11- A interferência do álcool na actividade de conduzir não se mede por forma ocular e grosseira, afere-se por dados como a capacidade...
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