Acórdão nº 0445068 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 04 de Maio de 2005 (caso NULL)
Magistrado Responsável | JOSÉ ADRIANO |
Data da Resolução | 04 de Maio de 2005 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Acordam na 2.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto: I - Relatório: 1 - Em processo comum que, com o n.º ......./01.5TDLSB, correu termos no ...º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Braga, sob acusação do Ministério Público e do assistente B............., foram pronunciados os arguidos: - C................
; - D.....................
e - E.....................
, pela prática de 1 (um) crime de gravações e fotografias ilícitas agravado, p. e p. pelo art. 199.º, n.ºs 1 e 2 alíneas a) e b), ex-vi art. 197.º, alínea b), do Cód. Penal, sendo o primeiro arguido com referência ao art. 60.º, n.º 2, da Lei da Televisão (Lei n.º 31-A/98, de 14/1).
Realizado o julgamento perante tribunal singular, foi proferida sentença na qual se decidiu: «1 - Absolver o arguido C.................., da prática do crime de gravações e fotografias ilícitas, p. e p. pelo art. 60.º n.º 2, da Lei nº 31-A/98, de 14/7, com referência aos arts. 199.º n.º 2 b) e 197.º b), do Cód. Penal, que lhe vinha imputado, mandando-o em paz; 2 - Declarar extinta a medida de coacção fixada a este arguido; 3 - Condenar o assistente B..............., pelo decaimento, nas custas com 1 (um
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UC de taxa de justiça, nos termos das disposições conjugadas dos arts. 515.º n.º 1 a), 518.º e 519.º n.º 1, do Cód. Proc. Penal e 85.º n.º 1 b), do Cód. das Custas Judiciais, devendo levar-se em conta a já paga; 4 - Condenar a arguida D................., pela prática de 1 (um) crime de gravações e fotografias ilícitas agravado, p. e p. pelo art. 199.º n.º 2 b), com referência ao art. 197.º b), do Cód. Penal, em 200 (duzentos) dias de multa à taxa diária de € 5 (cinco euros), o que perfaz a multa global de € 1000 (mil euros); 5 - Condenar o arguido E............, pela prática de 1 (um) crime de gravações e fotografias ilícitas, p. e p. pelo art. 199.º n.º 2 a), do Cód. Penal, em 150 (cento e cinquenta) dias de multa à taxa diária de € 5 (cinco euros), o que perfaz a multa global de 750 (setecentos e cinquenta euros); 6 - Condenar os arguidos D...... e E............. nas custas, com 2 (duas) UC de taxa de justiça, que será acrescida da sobretaxa de 1% nos termos do preceituado no art. 13º n.º 3, do Dec. Lei n.º 423/91, de 30/10, e 1/3 de procuradoria, cada um».
*2 - Inconformados com tal decisão, dela recorreram: - o assistente; - os arguidos D.............. e E........... .
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O primeiro termina a respectiva motivação com as seguintes conclusões: «1ª - A prova produzida permitiu fixar a condição de director do arguido C............ e considerar (fls. 5 da sentença) que "ficou amplamente demonstrado, pelas próprias declarações e depoimentos das testemunhas que indicou (...), que o referido arguido era o director de informação e que durante a manhã do dia da emissão da peça, tal como era habitual, esteve presente numa reunião onde o alinhamento do Jornal Nacional e seus temas globais foram discutidos".
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- Está provado que a emissão da peça jornalística foi antecedida de repetida promoção com uma imagem do recorrente, com vista a chamar a atenção dos telespectadores.
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- Do visionamento da cassete vídeo junta aos autos retira-se a conclusão de que, tendo o director de informação estado presente na reunião matinal para alinhamento e discussão dos temas a abordar no Jornal Nacional desse dia, jamais poderá dizer-se que não se provou que o mesmo tivesse tido conhecimento da peça em causa e da carga negativa que a mesma tinha para a imagem do recorrente.
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- Pelo menos, nessas condições, e sendo o Jornal Nacional a principal rubrica de informação da TVI, vista por cerca de 1.500.000 (um milhão e quinhentas mil) pessoas e que a peça aqui em causa se referia a um Juiz de Direito, antecedida de repetida promoção com imagem do mesmo, e com a duração de cerca de 20 minutos no horário mais nobre, impunha-se que o arguido C.............. questionasse, por elementar dever de cuidado, se o recorrente tinha autorizado a captação da sua imagem.
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- Aliás, existe erro notório na apreciação da prova e/ou contradição na fundamentação de facto (cf. als. b) e c) do nº 2 do artº 410º do C.P.Penal), porquanto, ao dar-se como provado que aquele arguido é o director de informação e programação, que esteve presente na reunião matinal para alinhamento e discussão dos temas a abordar no Jornal Nacional desse dia, e não se provando que esteve impedido de, por qualquer forma, conhecer as condições de captação das imagens do recorrente e de se opor à sua utilização - cf. artº 199º, nº 2, al. b) do C.Penal -, atenta contra o conteúdo das funções de direcção e contra as regras da experiência comum o dar-se como não provado o que acima se indicou.
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- Na qualidade de director de programação e informação, o arguido C................. era o responsável máximo por todo o funcionamento da estação no âmbito dos programas e da informação, a ele cabendo decidir, orientar e fiscalizar tudo o que nesses domínios é emitido, usufruindo das respectivas vantagens, mas suportando, obviamente, as inerentes responsabilidades.
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- Mesmo existindo um grupo de subordinados, com distribuição de funções e deveres, não é isso que retira as qualidades de chefia nem que exonera aquele que ocupa o topo da pirâmide das respectivas responsabilidades, sendo inconsistente o argumento da estratificação de funções, sob pena de se esvaziar do sentido o cargo de quem dirige.
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- O cargo desempenhado pelo arguido C............... é um cargo que a lei - artº 27º da Lei 31-A/98, de 14 de Janeiro - impõe que exista, o que desde logo atesta a necessidade da existência de um responsável e a responsabilidade de que o mesmo se reveste.
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- Recaía, assim, sobre o arguido C............... o especial dever de sindicar o conteúdo e condições de obtenção do respectivo material do programa de informação como é o Jornal Nacional da TVI, atenta a sua grande difusão e importância.
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- Ora, este arguido deveria ter demonstrado que esteve impossibilitado, por qualquer motivo, de se opor à utilização das imagens do recorrente e à emissão da peça em causa, bem como ao seu alinhamento (antecipada e repetidamente promovida), cabendo, então, a responsabilidade a quem o substituísse.
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- É ao arguido, como director de informação e programação, que incumbe provar que se opôs, ou que não o pôde fazer, à comissão dos crimes referidos no citado artº 60º.
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- Exactamente por que a lei considera o risco criminal e a difícil prova directa deste tipo de actividade, colocando tal risco a cargo do agente, é que a pena, no caso concreto, sofre uma atenuação de um terço nos seus limites mínimo e máximo, distinguindo claramente a gravidade da responsabilidade do director dos restantes agentes.
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- Deste modo, pese embora se possa, até, entender que é irrelevante que se tenham dado como não provados os factos acima indicados como impugnados, já que, mesmo assim, sempre existiria a responsabilidade criminal do arguido C................ (nem que fosse a título de dolo eventual), o Tribunal recorrido, para além de ter apreciado erradamente a prova produzida, inverteu o ónus da prova e não atendeu ao conteúdo dos citados dispositivos legais - artºs 27º e 60º da Lei de Televisão.
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- Mas, se não tomou conhecimento, cometeu o crime por que vinha acusado, sob a forma de omissão, por violação de um especial dever, de resto previsto na Lei, o de orientar, superintender e, até, determinar o conteúdo da programação e informação, o que significa, repete-se, que as normas constantes dos artºs 27º e 60º do citado diploma têm de ser interpretadas de modo a fazer recair sobre quem dirige as responsabilidades consequentes.
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- Em suma, as competências do director de uma estação de televisão impõem-lhe um dever de conhecimento antecipado das matérias a emitir, de forma a poder impedir a divulgação daquelas susceptíveis de gerar responsabilidade criminal, ou seja, o mesmo é dizer que a omissão, por parte dele, daquele dever de impedir a publicação de matérias com repercussões criminais gera responsabilidade criminal, salvo se se provar que houve exoneração, o que não aconteceu no caso em apreço.
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- Em conformidade com o exposto, devem os factos não provados acima indicados, ou seja, que o arguido C................, tendo tomado conhecimento da captação não autorizada de imagens do ofendido, não se opôs, como podia e devia, à sua edição em reportagem e posterior difusão na estação televisiva de que é director, por ter ponderado as elevadas vantagens televisivas e económicas que daí lhe adviriam e que agiu livre e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei, ser considerados como provados, condenando-se o arguido C............., como autor do crime imputado, com referência aos artºs 199º, nºs 1 e 2, al. b) e 197º, al. b) do Código Penal, ex vi do artº 60º da Lei de Televisão, numa pena de multa nunca inferior a 200 dias (a redução de um terço tem que operar sobre a pena já agravada, que é de 320 dias), a uma taxa diária nunca inferior a € 75,00, pois é público e notório que um director de televisão aufere proventos superiores a € 30.000,00 mensais.
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- Quanto ao arguido E..........., sendo-lhe imputado o crime p. e p. nos artºs 199º, nºs 1 e 2, als. a) e b) e 197º, al. b) do Código Penal, não se explicou a alteração e apenas se considerou integrada a previsão do artº 199º, nº 2, al. a), ou seja, não atendeu à agravação resultante de o crime ser cometido através de meio de comunicação social, tal como se fez para a arguida D......... .
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- Ora, a razão de ser da agravação estende-se a todos os arguidos, pois o que a lei pretende censurar é exactamente o meio pelo qual a captação de imagens é efectuada, ou seja, distinguindo os órgãos de comunicação social ou os seus funcionários de qualquer outro agente.
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- Assim, também este arguido deve ser punido com a agravação, admitindo-se que, apesar de tudo, se ajuste a simples pena de multa, nunca inferior a 240 dias, pois, além do que foi doutamente considerado, há que ponderar e censurar o...
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