Acórdão nº 0523073 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 27 de Setembro de 2005

Magistrado ResponsávelMÁRIO CRUZ
Data da Resolução27 de Setembro de 2005
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação do Porto: Relatório B.............., casado, residente na Rua ............, s/n, em .........., Oliveira de Azeméis, intentou a presente acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra "C.............., S.A.", pessoa colectiva n.º 500 106 924, com sede na Rua ............., em ........, Oliveira de Azeméis, Apartado ..., pedindo - que sejam anuladas as deliberações tomadas na Assembleia Geral da Ré, realizada no dia 2002.08.02, traduzidas na aprovação das seguintes propostas de deliberação: - Redução do capital social para € 250.000, nos termos e para os efeitos do artigo 35º do Código das Sociedades Comerciais (doravante designado por CSC), mediante redução do valor nominal das acções, passando estas a valer unitariamente 25 cêntimos.

- Desmaterialização dos títulos das acções.

- Alteração do artigo 4º para "O capital social integralmente subscrito e realizado em dinheiro é de duzentos e cinquenta mil euros, representados por um milhão de acções com o valor nominal de vinte e cinco cêntimos cada uma.

- Alteração do artigo 5º do pacto social para "A totalidade do capital social encontra-se representado por acções escriturais nominativas." - Aumento do capital social de € 250.000 para € 600.000, mediante subscrição e realização em numerário pelos senhores accionistas na proporção do capital de que forem titulares.

- E consequente alteração dada ao artigo 4º do pacto, i.e.: "O capital social integralmente subscrito e realizado em dinheiro é de seiscentos mil euros, representado por dois milhões e quatrocentas mil acções com o valor nominal de vinte e cinco cêntimos cada uma.

Mais pede o autor - que seja ordenado o cancelamento do eventual registo que porventura venha a ser efectuado na sequência de escritura/registo de redução do capital social e do subsequente aumento, e bem assim do registo de alteração dos artigos 4º e 5º do pacto social.

Para tanto, alega em síntese: - A primeira deliberação (redução do capital de € 5.000.000 para € 250.000) consta da convocatória que seria tomada nos termos do art. 35º do CSC, o qual, todavia, à data da deliberação já não estava em vigor, por ter sido publicado e ter entrado em vigor o DL n.º 162/2002, de 11/07.

- Mesmo que se admitisse que tal deliberação ainda assim pudesse ser tomada, teria que o ser na assembleia de aprovação de contas de um qualquer exercício fiscal, sob pena de ter de ser submetida a aprovação judicial, porquanto também não integrou renovação das deliberações tomadas na assembleia anterior (cfr. art. 35º do CSC na redacção em vigor à data da deliberação e art. 62º do mesmo diploma).

- Assim, tal deliberação, bem como as de desmaterialização dos títulos das acções e de alteração do art. 4º do pacto social, são anuláveis por violação da lei, nos termos dos art.s 35º, na sua actual redacção, e 58º, n.º 1, do CSC.

- Para além de serem também anuláveis por falta de informação atempada, porquanto se informou os accionistas, através da convocatória, que as mesmas eram tomadas ao abrigo do art. 35º e se invocou, no decorrer da assembleia, que a redução do capital afinal tinha em vista a cobertura de prejuízos (arts. 58º, n.º 1, al. c), e 289º, al. c), do CSC).

- Acresce que, não se verificando os pressupostos de aplicação do artigo 35° e não tendo a finalidade da redução constado da convocatória nos termos da al. a) do n.º 1 do artigo 94º, a deliberação padece do vício da nulidade e de anulabilidade, que se invoca ao abrigo das alíneas a) e d) do n.º 1 do artigo 56º, da alínea d) do n.º 2 do artigo 69º e do 58º, n.º 1, al. a), todos do CSC.

- Por outro lado, a deliberação sobre a desmaterialização dos títulos das acções revela conteúdo e objecto indeterminado e indeterminável, porquanto não se concretizou minimamente a forma pela qual seria feita, nem se identificou a entidade que a ela procederia, pelo que tal deliberação é igualmente anulável nos termos dos arts. 280º do Código Civil e 58º n.º 1, al. a) do CSC.

- A alteração dos artigos 4º e 5º do pacto social, enquanto deliberações conexas com as restantes deliberações anulandas, terão igualmente de ser anuladas.

- A deliberação de aumento de capital, conciliada com a anterior de redução, além de anulável porque contrária à lei (art.s 87º e 58º, n.º 1, al. a)), é ainda igualmente anulável por abuso de direito. Com efeito, tais deliberações visaram tão só reduzir as participações sociais dos accionistas maioritários. Com efeito, sendo o autor accionista da ré, detendo 94.812 acções, representativas do seu capital social, que correspondem a 9,4812%, as referidas deliberações, aprovadas por maioria da accionista "D...........", que detém 80% do mesmo capital social, tiveram apenas como objectivo que a accionista maioritária obtivesse vantagens especiais para si, traduzidas no acréscimo do seu peso relativo no corpo accionista, tirando partido da impossibilidade de os accionistas minoritários entrarem com o dinheiro necessário à subscrição da sua proporção no aumento do capital. A Ré tem vindo, progressivamente, a afastar o A. dos cargos de administrador e de director comercial, sabendo que, dessa forma, ele não teria possibilidade económica para acompanhar aumentos de capital. O aumento de capital proposto que, aquando da convocatória se suportava no artigo 35º e que, no decorrer da assembleia, passou a suportar-se em objectivos de obtenção de autonomia financeira e de aquisição de equipamentos, não teve qualquer um dos invocados e camuflados objectivos. Assim todas as deliberações são anuláveis nos termos do art. 58º, n.º 1, al. b), do CSC e do art. 334º do Código Civil.

- Por outro lado, a deliberação de aumento do capital não obedeceu aos requisitos formais previstos nas alíneas c), d), e), f) e g) do art. 87º do CSC, pelo que é anulável nos termos do n.º 1, al. a), do art. 58º do mesmo código.

- Acresce que as deliberações de redução e aumento do capital tomadas nessa assembleia não integraram renovação de idênticas deliberações tomadas na assembleia geral anual de 2000.02.28, relativamente às quais o A. já havia proposto outra acção com vista à sua anulação, não tendo aí a Ré solicitado prazo para renovar tais deliberações. Assim, as deliberações mais recentes sempre seriam inválidas por contrariarem outras anteriores de conteúdo idêntico, ainda não anuladas. Além disso, sempre seriam nulas, por impossibilidade do seu objecto.

Regularmente citada, a Ré contestou, pugnando pela improcedência da acção, alegando, e, suma, o seguinte: - A convocatória da Assembleia continha as necessárias informações aos accionistas que lhes facultariam conhecer o teor integral das propostas do Conselho de Administração da Ré, das quais se pode verificar que a deliberação de redução do capital se tomava em conformidade com o disposto no art. º 35º, n.º 1, do CSC e que a deliberação constituía uma renovação da deliberação anteriormente tomada.

- As deliberações em apreço constituem renovação de quatro deliberações tomadas na Assembleia Geral de aprovação de contas respeitante ao exercício findo em 31 de Dezembro de 2001, sendo que a deliberação de redução do capital social, foi renovada para efectivo cumprimento e enquadramento no disposto na alínea b) do n.º 1, 2 e 3 do art. 35º do CSC, com a redacção que lhe foi dada pelo DL n.º 162/2002 de 11/07.

- De acordo com as normas que orientam uma operação de desmaterialização de títulos de acções, não compete à Assembleia Geral assegurar o cumprimento dos normativos que condicionam tal operação, mas sim compete ao Conselho de Administração assegurar a execução da deliberação da assembleia.

- A realização do aumento de capital deliberado é absolutamente vital para a sobrevivência da Ré, não havendo nele qualquer desígnio oculto ou malévolo.

- As propostas do Conselho de Administração não pretendiam esmagar os accionistas minoritários com um aumento de capital abrupto, mas, pelo contrário, com inteira transparência e boa fé, ir aumentando paulatinamente as chamadas de capital próprio, para atingir o ratio de cobertura de capitais próprios de 25% e assim poder candidatar a ré ao POE, sem exigência imediata de um esforço, que seria também ele muito pesado para a accionista maioritária.

O A. replicou, concluindo como na petição inicial e pedindo a condenação da Ré como litigante de má fé, em multa e indemnização em montante não inferior a € 500,00 tendo em vista indemnizá-lo pelos danos morais que sofreu a ler a contestação e as despesas que teve de suportar com a sua defesa.

A ré pronunciou-se pela inadmissibilidade da réplica.

Findos os articulados e uma vez comprovado o registo da acção, foi dispensada a realização de audiência preliminar e proferiu-se despacho saneador, no qual se considerou inadmissível a réplica apresentada pelo A., e determinado que o aí alegado fosse considerado não escrito, salvo na parte relativa ao pedido de condenação de litigância de má fé.

Seleccionou-se então a matéria de facto assente e elaborou-se a base instrutória.

Procedeu-se, por fim, ao julgamento, não tendo as respostas à base instrutória sido alvo de qualquer reclamação, vindo depois a ser proferida Sentença.

Nesta, julgou-se procedente a presente acção, declarando anuladas todas as deliberações sociais aprovadas na Assembleia Geral da Ré realizada no dia 2002.08.02, ordenando-se, consequentemente, o cancelamento de eventuais registos que tenham sido efectuados na sequência de tais deliberações e julgou-se improcedente o pedido de condenação da Ré como litigante de má-fé.

A Ré interpôs recurso da decisão, vindo a ser admitido como de apelação e com efeito suspensivo.

Apresentou então a Ré as suas alegações de recurso O A. contra-alegou.

Remetidos os autos a este Tribunal foi o recurso aceite com a adjectivação e demais atributos que lhe haviam sido atribuídos na primeira instância.

Correram os vistos legais.

..............

Âmbito do recurso.

Vamos começar por transcrever as conclusões apresentadas pelo apelante, já que de acordo com o...

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