Acórdão nº 0535644 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 07 de Dezembro de 2005 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelFERNANDO BAPTISTA
Data da Resolução07 de Dezembro de 2005
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto I. RELATÓRIO: No ..º Juízo, ..ª Secção dos Juízo Cíveis do Porto, B........., casado, e mulher C.........., ambos comerciantes e residentes na Rua ...., n.º ... - .... ...., na ....., Matosinhos, intentaram acção declarativa de condenação, na forma ordinária, contra D......., S.A., sociedade anónima com sede na Rua ...., n.º ... - ..º ...., no Porto.

Pedem: A condenação da ré no reconhecimento, do seu direito de propriedade sobre a fracção autónoma referida em 1º da petição inicial e da invalidade da venda judicial da mesma fracção efectuada a seu favor (da R.), com as legais consequências no Registo Predial.

Alegam: A aquisição daquele direito por usucapião, aquisição não registada no registo predial antes de a R. ter logrado registar a aquisição da mesma efectuada em sede de venda judicial.

Concluem ser nula a venda judicial, por constituir uma venda de coisa alheia.

Regularmente citada, a R. contestou, a fls. 31 e seguintes, em síntese, alegando ser ela a proprietária da fracção em causa, impugnando os factos articulados pelos AA. por os desconhecer, e pedindo, em sede de pedido reconvencional, o reconhecimento do seu alegado direito.

Conclui pela total improcedência da acção e pela procedência do pedido reconvencional.

Os AA. replicaram, a fls. 66 e seguintes, contestando o pedido reconvencional, e, em síntese, mantendo o alegado na p. i.

Foi proferido o despacho saneador, e foram seleccionadas a matéria de facto assente e a base instrutória, que foram objecto das reclamações de fls. 94 e 115, ambas totalmente deferidas.

Procedeu-se ao julgamento, que decorreu pela forma constante da acta, com observância do formalismo legal, tendo sido proferido o despacho que dirimiu a matéria de facto controvertida (fls. 118).

Por fim, foi proferida a seguinte "Decisão Pelo exposto, julgo a acção procedente, por provada, e a reconvenção improcedente, por não provada, e consequentemente: 1 - Declaro os AA. B....... e mulher C......... únicos e exclusivos proprietários da fracção autónoma designada pelas letras "BH", correspondente a um lugar de garagem na cave, com entrada pelo n.º ..., do prédio sito na Rua ...., n.ºs ... e ..., da freguesia da ....., concelho do Porto, descrito na 2a Conservatória do Registo Predial desta cidade sob o n.º 00027, e condeno a R. D........., S.A. a reconhecer aquela qualidade.

2 - Declaro nula, nos termos do art.º 892º do Código Civil, a venda judicial da referida fracção efectuada na execução ordinária n.º 4102/93, que correu termos pela ...ª Secção da ...ª Vara Civel do Porto, com as legais consequências a nível de registo predial, ordenando-se o cancelamento do registo efectuado com base naquela transmissão.

3 - Absolvo os AA. do pedido formulado pela R.." Inconformada com o sentenciado, veio a Ré interpor recurso, apresentando alegações que termina com as seguintes "CONCLUSÕES: a) O problema em discussão nos autos é o do conflito entre adquirentes do mesmo transmitente; b) Os Apelados adquiriram, através de escritura pública, mas não registaram o facto aquisitivo; c) A apelante adquiriu o imóvel através da venda judicial, sendo que essa aquisição foi efectuada, por aplicação do artº 824º nº 2 do Código Civil, livre de quaisquer direitos reais com registo posterior ao da penhora efectuada na execução; d) Consequentemente, o eventual direito de propriedade dos Apelados, porque não registado antes da penhora, caducou por via da venda judicial ( cf o aludido artº 824º nº 2 do Código Civil ); e) Acrescendo, ainda, que a Recorrente registou o seu facto aquisitivo, sendo considerada terceira para efeitos de registo (artº 5º nº 4 do Código de Registo Predial ); f) Os Apelados, porque não registaram atempadamente a sua aquisição, não podem, por aplicação dos artºs 5º nºs 1 e 4, 6º e 7º do Código de Registo Predial, opor o facto aquisitivo à Recorrente, sendo que esta, por via dos mesmos preceitos, pode opor a sua posição jurídica aos Recorridos; g) Por via de todos os mencionados preceitos a posição jurídica da Recorrente adquirente deve prevalecer sobre a dos Apelados; h) A sentença ao preceituar que os Apelados adquiriram a propriedade derivadamente não pode vir, ao mesmo tempo, afirmar que também adquiriram originariamente através da usucapião, sob pena de insanável contradição, havendo por isso urna contradição entre os fundamentos e a decisão, o que leva à nulidade da sentença Cf. Artº 668º,nº 1, c) do Código de Processo Civil ) Sem prescindir, sempre se dirá que no presente caso nunca haveria aquisição por usucapião uma vez que não decorreu o prazo necessário para tal, que no mínimo seria de quinze anos.

  1. A contagem do prazo foi interrompida pela entrega judicial do imóvel à Recorrente (cf. Artºs 1292º e 323º do Código Civil): k) Acrescendo, os Apelados invocaram a usucapião, através da presente acção, ainda não tinham decorrido os quinze anos, sendo que tal situação foi contestada também ainda antes do decurso do prazo.

    Tais procedimentos levariam, também, por via dos aludidos artºs 1292º e 323º do Código Civil, à interrupção do prazo.

  2. No caso vertente, também não poderia haver acessão na posse "sob pena de a regra da inoponibilidade por falta de registo não ter na pratica qualquer eficácia .

  3. A norma do nº4 do artº 5.º do Código de Registo Predial, com a interpretação efectuada pela sentença recorrida, é inconstitucional, o que desde já se invoca, porque violadora do princípio da igualdade, previsto no art.º 13º da Constituição da República Portuguesa NORMAS VIOLADAS: Art.sº 323º, 824 nº 2, 1256º, 1292º e 1296º do Código Civil; Arts.º 5, 6 e 7 do Código de Registo Predial; artº 668º, nº1, alíneas c) do Código de Processo Civil; e art.º 13º da Constituição da República Portuguesa TERMOS EM QUE DEVE SER CONCEDIDO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO, SUBSTITUINDO-SE A DOUTA SENTENÇA RECORRIDA POR OUTRA QUE ABSOLVA AS APELANTES DOS PEDIDOS FORMULADOS PELOS APELADOS E SER JULGADO PROCEDENTE O PEDIDO RECONVENCIONAL OU, CASO ASSIM NÃO SE ENTENDA, SER DECLARADA A NULIDADE DA SENTENÇA COM TODAS AS LEGAIS CONSEQUÊNCIAS".

    Foram apresentadas contra-alegações, pugnando-se pela manutenção do sentenciado.

    Foram colhidos os vistos.

    1. 1. AS QUESTÕES: Tendo presente que: - O objecto dos recursos é balizado pelas conclusões das alegações dos recorrentes, não podendo este Tribunal conhecer de matérias não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso (arts. 684º, nº3 e 690º, nºs 1 e 3, do C. P. Civil); - Nos recursos se apreciam questões e não razões; - Os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido, as questões a resolver são as seguintes: - Nulidade da sentença, por contradição entre os fundamentos e a decisão (artº 668º, nº1, al. c) do CPC); - Se o comprador na venda judicial é considerado terceiro nos termos do artº 5º do Cód. Registo predial; - Se pode o adquirente que não registou juntar à sua posse a dos antepossuidores para efeitos de usucapião (acessão na posse).

      - Se estão preenchidos os requisitos para a aquisição do direito de propriedade por usucapião por banda dos autores/apelados; - Se é inconstitucional a interpretação do nº 4 do artº 5º do CRP no sentido de que o adquirente através de venda judicial não é terceiro para efeitos de registo.

    2. 2. FACTOS PROVADOS: Na 1ª instância foi dada como provada a seguinte matéria de facto: 1 Através da inscrição G-2 Ap. 39/100892, encontra-se registada na 2ª Conservatória do Registo Predial do Porto, como provisória por dúvidas, a aquisição a favor de E......., C.C. F......., na comunhão de adquiridos, a fracção autónoma designada pelas letras BH, correspondente a um lugar de garagem na cave, com entrada pelo n.º .... da Rua ....., do prédio em regime de propriedade horizontal sito na referida Rua ...., n.ºs .... e ...., freguesia da ....., Porto, descrito sob o n.º 00027 e inscrita na matriz predial respectiva sob o art.º 2413-BH.

      2 - Através da inscrição G-2 Ap. 17/200891 - Av. 1 foi a aquisição referida em 1 convertida em definitiva.

      3 - Na execução movida por "G......., S.A." contra E......., C.C. F........, na comunhão de adquiridos, e que com o n.º 4012/1993 correu termos na ..ª Secção da ...ª Vara deste Tribunal, foi penhorada em 21/02/95 a fracção supra referida, penhora que se encontra registada através da inscrição F-2 Ap. 127, 250399.

      4 - Nessa execução, que prosseguiu a impulso do Ministério Público, para pagamento das custas, foi designado para o dia 28/11/02 a venda da fracção mediante propostas por carta fechada, tendo sido aceite a proposta da R. que ofereceu pelo bem penhorado a quantia de 8.000 Euros.

      5 - Por despacho proferido nessa execução, em 19/12/02, foi adjudicada à R. a fracção e ordenado o cancelamento do registo da inscrição F2- Ap. 127/250399.

      6 - Através das inscrições G-3 Ap. 66/27012003 e F -2 Of. Ap.66/27012003 respectivamente, encontra-se registada a favor da R. a aquisição da fracção e cancelada a inscrição F- 2.

      7 - Mediante requerimento dos AA. de 11/03/03 foi registada como provisória por dúvidas a favor deles, e através da inscrição G-4 Ap. 01/11032003, a aquisição da mesma fracção, em virtude de a mesma se encontrar registada a favor da R..

      8 - Por escritura pública de 9/05/94, outorgada no 2º Cartório Notarial de Matosinhos, E........ e mulher F......... declararam vender e o A. declarou comprar, pelo preço de Esc.1.500.000$00(7.481,97 Euros), a fracção BH, pagando o preço aos vendedores neste acto. Averbaram a aquisição na Repartição de Finanças competente e na caderneta predial.

      9 - Em 1994, os AA. pretenderam adquirir um lugar de garagem do prédio em que se situa a fracção BH para aí aparcarem diariamente as suas viaturas.

      10 - A R. requereu a entrega da fracção em causa, a qual lhe foi entregue em 10/02/2003.

      11 - Os AA. exercem a actividade de comerciantes, explorando duas lojas comerciais designadas "H......." e "I........", sitas na Rua...

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