Acórdão nº 68/07.9TAFZZ.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 15 de Setembro de 2010

Magistrado ResponsávelORLANDO GON
Data da Resolução15 de Setembro de 2010
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Relatório Pelo Tribunal Judicial da Comarca de Ferreira do Zêzere, sob acusação do Ministério Público, foi submetido a julgamento, em processo comum, com intervenção do Tribunal Singular, o arguido A, filho de AR e de O., natural de …. Ferreira do Zêzere, , residente …. em Ferreira do Zêzere; imputando-se-lhe a prática de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo artigo 152.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2 do Código Penal.

Realizada a audiência de julgamento, o Tribunal Singular, por sentença proferida a 22 de Abril de 2010, decidiu julgar procedente a acusação do Ministério Público e, em consequência, condenar o arguido A, pela prática de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo artigo 152.º do Código Penal, na pena de três anos e seis meses de prisão.

Inconformado com a douta sentença dela interpôs recurso o Ministério Público, concluindo a sua motivação do modo seguinte: a). Por sentença, datada de 22 de Abril de 2010, o tribunal a quo condenou o arguido A. pela prática de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo art.152.º, n.º1 al. a) e n.º 2 do Código Penal, na pena de três anos e seis meses de prisão.

  1. Ora, é necessário considerar que “ o tribunal só deve negar a aplicação de uma pena alternativa ou de uma pena de substituição quando a execução da prisão se revele, do ponto de vista da prevenção especial de socialização, necessária ou, em todo o caso, provavelmente mais conveniente do que aquelas penas; coisa que só raramente acontecerá se não se perder de vista o já tantas vezes referido carácter criminógeno da prisão, em especial da de curta duração”.

  2. Pressuposto básico da aplicação da pena de substituição ao arguido é a existência de factos que permitam um juízo de prognose favorável em relação ao seu comportamento futuro, ou seja, é necessário que o Tribunal esteja convicto de que a censura expressa na condenação e a ameaça de execução da pena de prisão aplicada sejam suficientes para afastar o arguido de uma opção desvaliosa em termos criminais e para o futuro.

  3. No caso em apreço, verificamos que os factos se reportam até ao ano de 2008, o arguido não detém antecedentes criminais ou outros processos pendentes, a vítima não reside consigo deste Setembro de 2008, não sendo previsível o seu regresso à habitação e o arguido mostra-se inserido na sociedade, residindo na companhia do seu filho.

  4. Nesta medida, em face destas circunstâncias, consideramos que o tribunal a quo deveria ter optado pela suspensão da execução da pena de prisão, visto que se mostra suficiente a censura do facto e a ameaça de prisão, pese embora o comportamento extremamente gravoso do arguido para com a Z.

  5. O simples facto de o tribunal a quo concluir que o arguido é quezilento e não demonstrou arrependimento - devendo ter-se sempre em conta o seu baixo grau de instrução - não invalidam a aplicação do instituto da suspensão da execução da pena de prisão.

  6. Relembre-se que, atenta a medida da pena imposta ao arguido, a suspensão da execução da pena de prisão ficaria sempre sujeita a regime de prova (art. 53.º n.º 3 do Código Penal).

  7. Ora, o facto de o arguido ficar sujeito ao cumprimento de um plano de reinserção social, adequado à sua personalidade e carências de ressocialização, afigura-se-nos ser, por ora, adequado a atingir as finalidades de punição.

  8. Por outro lado, de modo a que o arguido assuma a gravidade das consequências dos actos que desenvolveu na pessoa de Z, deverá, igualmente, a suspensão de execução ser sujeita à obrigação do arguido pagar €500 à APAV.

  9. Assim sendo, consideramos que deverá o arguido ser condenado na pena de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão, suspensa na sua execução, pelo mesmo período, atento o disposto no art. 50.º n.º 5 do código Penal, sujeito a regime de prova (art.53.º, n.º3 do Código Penal) e ao dever de entregar à Associação Portuguesa de Apoio à Vítima a quantia de € 500 (quinhentos euros) (art. 51.º n.º1 al. a) do Código Penal).

    Termos em que requer que o recurso seja julgado procedente e, consequentemente seja a pena aplicada ao arguido suspensa na sua execução sujeita a regime de prova e ao dever de o arguido entregar a quantia de € 500 euros à Associação Portuguesa de Apoio à Vítima.

    O Ex.mo Procurador-geral-adjunto neste Tribunal da Relação após visto nos autos.

    Colhidos os vistos, cumpre decidir.

    Fundamentação A matéria de facto apurada e respectiva convicção constante da sentença recorrida é a seguinte: Factos provados 1. O arguido contraiu matrimónio com a ofendida Z. em 9 de Outubro de 1970.

    1. P e J encontram-se registados como sendo filhos do arguido e da ofendida.

    2. O casal identificado em 1) fixou a sua residência, desde sempre, em…., Ferreira do Zêzere.

    3. A aludida relação conjugal foi pautada, desde o início, por agressões físicas e verbais por parte do arguido a Z.

    4. Com efeito, o arguido desferia, quase todas as semanas, murros, bofetadas e pontapés em Z, apelidando-a de “puta”, “cabra” e “vaca” e arremessando-lhe, em número de vezes não concretamente apurado, paus e pratos.

    5. Nesta sequência, em virtude de ter sofrido pelo menos um acidente vascular cerebral, Z passou a ser acompanhada, a partir de 1 de Dezembro de 2006, pela Associação de Melhoramento e Bem Estar Social de …, permanecendo no Centro de Dia da mesma durante todo o dia e regressando pelas 17h30, para pernoitar na sua residência.

    6. Para o efeito, elementos da aludida Associação iam buscar a ofendida a sua casa cerca das 9 horas dos dias úteis, indo deixá-la pelas 17h30 desses dias.

    7. No dia 9 de Outubro de 2007, em hora não concretamente apurada, mas entre as 17 e as 23h59, o arguido desferiu um murro no olho esquerdo de Z.

    8. No dia 23 de Dezembro de 2007, pelas 19h45, dentro da residência aludida em 3), o arguido dirigiu-se a Z e afirmou: “sua grande puta, sua grande vaca, tu não trabalhas porque não queres, caminha, caminha”, desferindo-lhe, seguidamente, diversos murros na cabeça, faces e tronco, empurrando-a e arrastando-a pelo chão.

    9. Em consequência dos factos descritos, Z sofreu equimose em ambas as regiões malares, equimose do pólo superior da orelha direita, equimose da região lombar direita com três centímetros de comprimento por dois de largura, equimose da face interna do braço direito com 6 centímetros de comprimento e dois de largura, equimose com dois centímetros de diâmetro na face externa do braço esquerdo.

    10. Tais lesões demandaram-lhe um período de dez dias de doença, sendo cinco com afectação da capacidade para o trabalho.

    11. Desde 1 de Setembro de 2008 que Z está internada na Santa Casa da Misericórdia de Ferreira do Zêzere.

    12. O arguido agiu livre, voluntária e conscientemente, com o propósito concretizado de molestar a ofendida no seu corpo e saúde, causando-lhe dores, bem como um permanente medo, perturbação e um clima de terror nocivo à sua estabilidade emocional, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida pela lei penal.

    13. O arguido actuou sempre...

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