Acórdão nº 2799/08.7TBVCD.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Setembro de 2010

Data09 Setembro 2010
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: CONCEDIDA A REVISTA Área Temática: DIREITO CIVIL - DIREITO DA FAMILIA Doutrina: - Antunes Varela, Código Civil anotado, Vol.5º, pg. 303. - M. Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, pg. 322. - Paulo Cunha, Direito de Família, II, pg. 256 .

Legislação Nacional: CODIGO CIVIL : - ARTº 1871.º. CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (CRP):- ARTºS 26º, Nº 1, 36º, Nº 1 E 18º, Nº 2 E 282.º, N.º4.

Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃO DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL PROFERIDO EM PLENÁRIO, N.º 23/06, DE 10 DE JANEIRO DE 2006. ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: - DE 21-06-83, UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA, TIRADO EM PLENÁRIO, DISPONÍVEL EM WWW.DGSI.PT; - DE 19.01.1993 E DE 20.07.2003, PROFERIDOS, RESPECTIVAMENTE, NOS PROCESSOS Nº 082375 E Nº 04A1974,DISPONÍVEIS PARA CONSULTA EM WWW.DGSI.PT; - DE 11-12-2008, Pº 08B3692, DISPONÍVEL EM WWW.DGSI.PT. ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO, PUBLICADO NA REV. LEGISLAÇÃO E JURISPRUDÊNCIA ( ANO 8º, PG 142).

Sumário : I-A identidade da causa de pedir que caracteriza a repetição da causa e que está na base da oponibilidade do caso julgado, não se confunde nem se relaciona directamente com a identidade das palavras, argumentos ou razões tecidas nos petitórios respectivos ou a configuração do seu desenvolvimento no seio de cada um destes articulados.

II-A causa de pedir é, como se sabe, «o acto ou facto jurídico (contrato, testamento, facto ilícito, etc.) donde o autor pretende ter derivado o direito a tutelar: o acto ou facto jurídico que ele aduz como título aquisitivo desse direito» (M. Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, pg. 322).

III- Ora como ensinava este emérito processualista, a causa de pedir nas acções de investigação de paternidade «é o facto natural da filiação ( relação factual, coisa diversa da relação jurídica correspondente ) e mais o facto que o autor invoque de entre os previstos no artº 1871º,nº1 do Código Civil (escrito do pai, posse de estado, abuso de confiança ou de autoridade, sedução ou convivência more uxorio). Isto porque a procedência da acção depende destes dois elementos».

IV- Presentemente, a nossa Jurisprudência continua a entender que a causa petendi nas acções de investigação de paternidade é o facto jurídico da procriação, como, de resto, nem poderia deixar de ser ( por todos, o Acórdão de Uniformização de Jurisprudência deste Supremo Tribunal, de 21-06-83, tirado em plenário, disponível em www.dgsi.pt, onde se considerou: «concorda-se com o Recorrente em que nas acções de investigação de paternidade, a causa de pedir é o facto jurídico da procriação. Há muito que isso está assente»). Com efeito, a acção de investigação da paternidade tem como escopo a atribuição jurídica da paternidade do filho ao progenitor biológico deste, e como tal, o facto de onde emerge tal direito só pode ser a procriação ou geração.

V- Porém, não se pode olvidar que o legislador da Reforma de 1977 ( Dec-Lei 496/77, de 25 de Novembro) veio a estabelecer que os legalmente denominados pressupostos da investigação da paternidade (epígrafe da primitiva versão do artº 1860º em cujo texto os mesmos constavam), passassem a funcionar, na epígrafe e no novo texto do artº 1871º, como presunções da relação biológica de paternidade do investigado, constituindo verdadeiras presunções legais, com valor probatório especialmente fixado na lei, como ensinou o Prof. Antunes Varela (Código Civil anotado, Vol.5º, pg. 303).

VI-O conceituado Professor coimbrão considerava o valor probatório como especialmente fixado na lei, na medida em que, ao contrário do que acontece no regime geral das presunções juris tantum que são ilídíveis por prova em contrário ( artº 350º, nº 2 do C.Civil), no caso das presunções do citado artº 1871º, o nº 2 do aludido preceito exige dúvidas sérias para a ilisão da presunção, o que, na opinião do citado Mestre, leva a crer que o legislador tenha querido « colocar a fasquia probatória das presunções formuladas no nº 1 um pouco acima da altura própria das meras presunções de facto» ( ibidem).

VII- Talvez por isso, algum sector doutrinal considerou a alegação dos factos tendentes ao preenchimento dos conceitos jurídicos contidos em tais presunções, tais como os conceitos de posse de estado, convivência notória, comunhão de vida em condições análogas às dos cônjuges, etc., como causas de pedir autónomas da procriação, uma vez que tais presunções, se não abaladas pelas duvidas sérias sobre a paternidade do investigado, permitem o estabelecimento judicial do vínculo da filiação. Não cremos que se trate, em rigor, de novas causas de pedir autónomas ou distintas da procriação, porque a causa de pedir nas acções de investigação de paternidade é sempre integrada pela alegação factual da procriação biológica, como fenómeno gerador que é, embora possa haver a alegação de outros factos reforçantes e conducentes à demonstração judicial da causa petendi, sobretudo se o autor pretende beneficiar de qualquer das presunções legais indicadas no falado preceito legal.

VIII- É que, como bem salientou Antunes Varela, o fenómeno natural da procriação continua a ser o alvo fundamental da investigação judicial, mas sendo a procriação um facto, a convicção acerca da existência desse facto (facto de onde emerge o direito do autor a ser reconhecido judicialmente como filho do investigado, portanto, a causa de pedir), «só pode em regra alegar-se, na ordem decisória, com base em juízos de experiência ( ilações ou presunções) ou até em conceitos jurídicos» ( A. Varela, op.cit, pg. 303).

IX- A circunstância de o Tribunal Constitucional ter proferido, em Plenário, o Acórdão 23/06, de 10 de Janeiro de 2006, no qual foi declarada a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma constante do nº 1 do artigo 1817º do Código Civil, aplicável por força do artº 1873º do mesmo Código, na medida em que prevê, para a caducidade do direito a investigar a paternidade, um prazo de dois anos a partir da maioridade do investigante, por violação das disposições conjugadas dos artºs 26º, nº 1, 36º, nº 1 e 18º, nº 2 da Constituição, em nada tal afecta a decisão judicial já transitada em julgado que declarou a caducidade de tal direito da Autora, na acção anterior referida no pressente Acórdão.

X- Com efeito, é a própria Constituição da República que, no nº 4 do seu artº 282º, ressalva os casos julgados, de modo a assegurar a intangibilidade de tais decisões pelos efeitos da declaração de inconstitucionalidade das normas, com força obrigatória geral.

Decisão Texto...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
2 temas prácticos
2 sentencias
  • Acórdão nº 25735/15.0T8SNT.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 25 de Maio de 2017
    • Portugal
    • Court of Appeal of Lisbon (Portugal)
    • 25 de maio de 2017
    ...– cfr., a título meramente exemplificativo Acs. STJ de 19.01.1993 (Pº 082375), de 20.07.2003 (Pº 04A1974) e de 09.09.2010 (Pº 2799/08.7TBVCD.P1.S1), todos acessíveis em A procriação biológica pode ser demonstrada de forma directa, através dos exames hematológicos ou outros métodos cientific......
  • Acórdão nº 4704/14.2T8VIS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 08 de Setembro de 2015
    • Portugal
    • Court of Appeal of Coimbra (Portugal)
    • 8 de setembro de 2015
    ...arrumada, pois que tal declaração não abrange os casos já julgados – artº 282º nº3 da Constituição e Ac. do STJ de 09.09.2010, p. 2799/08.7TBVCD.P1.S1. Ou, noutra nuance e mutatis mutandis: «Transitada em julgado a decisão que negou o juízo de inconstitucionalidade relativamente à norma do ......

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT