Acórdão nº 233/10 de Tribunal Constitucional (Port, 15 de Junho de 2010

Magistrado ResponsávelCons. Carlos Fernandes Cadilha
Data da Resolução15 de Junho de 2010
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 233/2010

Processo n.º 6/2010

  1. Secção

Relator: Conselheiro Carlos Fernandes Cadilha

Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional

  1. A. interpôs recurso para o Tribunal Constitucional do acórdão do Tribunal da Relação do Porto que o condenara na prática de crime de fraude fiscal, pretendendo ver apreciada, entre o mais, a constitucionalidade das normas dos artigos 187º e 190º do Código de Processo Penal quando interpretadas no sentido de poderem valer como meio de prova os “prints” impressos de um computador pessoal, cujo acesso se efectuou sem autorização do utilizador nem autorização ou mandado do juiz.

    Pela decisão sumária n.º 60/2010, de 4 de Fevereiro de 2010, decidiu-se não tomar conhecimento do recurso, quanto à interpretação normativa efectuada em relação às referidas normas, por se ter entendido que o recorrente não cumpriu o ónus de suscitação a que se referem os artigos 70º, n.º 1, alínea b), e 72º, n.º 2, da Lei do Tribunal Constitucional.

    O recorrente reclamou para a conferência, invocando que suscitou a referida questão de inconstitucionalidade nas alegações produzidas perante o tribunal recorrido, num parecer de um professor de direito que juntou aos autos e na resposta ao parecer do Ministério Público no Tribunal da Relação.

    Neste ponto, respondeu o Ministério Público, sustentando, ao contrário, que o recorrente não suscitou tal questão da inconstitucionalidade no momento processual próprio, ou seja, na motivação do recurso para a Relação, e que, mesmo que se entendesse que «a resposta ao parecer era ainda o momento processual próprio para suscitar a questão» e «se tinha seguido uma forma processualmente adequada nessa suscitação», «falta o requisito de admissibilidade do recurso que consiste em a dimensão normativa aplicada na decisão recorrida não corresponder, integralmente, à suscitada».

    Conclui, assim, pela impossibilidade de conhecimento, nesta parte, do recurso, «seja porque não foi suscitada a questão da inconstitucionalidade das normas dos artigos 187º e 190º, seja porque não há uma correspondência entre a dimensão normativa suscitada e a aplicada».

    Este entendimento foi acolhido pelo acórdão que apreciou a reclamação para a conferência, nos seguintes termos:

    Segundo o reclamante (cfr. o ponto I da reclamação), a questão de inconstitucionalidade teria sido suscitada nas páginas 30 e 31 das alegações produzidas perante o tribunal recorrido, num parecer de um professor de direito que juntou aos autos e na página 9 da resposta ao parecer do Ministério Público no Tribunal da Relação.

    Mas manifestamente não foi imputada qualquer inconstitucionalidade, nas referidas páginas das alegações, a qualquer norma ou interpretação normativa, aspecto essencial para que uma questão de inconstitucionalidade possa ter-se por suscitada, nos termos dos artigos 70º, n.º 1, alínea b), e 72º, n.º 2, da Lei do Tribunal Constitucional. E, como bem observa o Ministério Público na resposta à presente reclamação, na motivação do recurso para a Relação, a fls. 77179 a 77181, limitou-se o recorrente a referir “os procedimentos levados a cabo quanto à apresentação do computador e à posterior análise dos “prints”, aí se dizendo que a não se ter procedido nos termos da lei, violaram-se as garantias de defesa constitucionalmente consagradas no artigo 32º da CRP” e concluindo-se que os “prints” haviam sido obtidos através de métodos proibidos de prova.

    Por outro lado, e admitindo que, no mencionado parecer de um professor de direito e na mencionada resposta ao parecer do Ministério Público, foi suscitada uma questão de inconstitucionalidade normativa, a verdade é que, como também salienta o Ministério Público na resposta à presente reclamação, o tribunal recorrido não perfilhou a interpretação censurada pelo recorrente, segundo a qual podem valer como meio de prova os “prints” impressos de um computador pessoal, cujo acesso se efectuou sem autorização do utilizador nem autorização ou mandado do juiz.

    O recorrente veio então arguir a nulidade desse acórdão, por não ter sido notificado da resposta que o Ministério Público junto do Tribunal Constitucional apresentou à sua reclamação, omissão que, a seu ver, influiu na decisão, pois que nela foi invocada uma nova razão para o não conhecimento do recurso (ausência de correspondência entre a interpretação censurada e a que foi acolhida pelo tribunal recorrido), que, não tendo sido ponderada na decisão sumária, veio a ser acolhida pelo citado acórdão, sem que lhe tenha sido dada, antes, a possibilidade, constitucionalmente imposta de sobre ela se pronunciar.

    A arguição foi deferida pelo acórdão n.º 200/2010, de 19 de Maio de 2010, que ordenou a notificação do recorrente para se pronunciar, querendo, sobre a resposta do Ministério Público.

    O recorrente, começando por se reportar ao Parecer do Ministério Público constante de fls. 89024-89040 e ao acórdão n.º 137/10, veio dizer o seguinte:

    «(…) Do parecer do Ministério Público e desta pronúncia do Tribunal Constitucional parece resultar que é já pacífico que, ao contrário do que foi sustentado na Decisão Sumária sob reclamação, o recorrente sustentou atempada e adequadamente a questão de constitucionalidade: fê-lo, pelo menos, reconheceu o Tribunal, no Parecer de Direito do Prof. Rui Carlos Pereira que juntou aos autos de recurso na Relação do Porto, bem como na resposta ao parecer do Ministério Público nos mesmos autos.

    «(…) Tal pronúncia do Tribunal Constitucional está, aliás, de acordo com outras decisões do Tribunal, como por exemplo as constantes dos Acórdãos nºs 173/88, 102/95, 17/2007, 7172007 ou 216/2009.

    «(…) Importa assim, na linha desta jurisprudência, que o Tribunal Constitucional agora confirme este entendimento quanto à idoneidade das peças processuais em causa para a suscitação da questão de constitucionalidade, também aflorado no Acórdão nº 200/2010 (…).

    «(…) Sobrará assim, como único obstáculo ao conhecimento do objecto do recurso de constitucionalidade, a questão levantada pelo Ministério Público, e acolhida pelo Tribunal Constitucional na decisão anulada (…), segundo a qual não há identidade entre a dimensão normativa cuja inconstitucionalidade se suscitou, atempada e adequadamente, e a dimensão normativa efectivamente aplicada pela Relação do Porto.

    «(…) A verdade é que também essa questão não procede.

    «(…) O Ministério Público entendeu que a Relação resolveu uma questão da constitucionalidade, a da interpretação normativa que considera que os ‘prints’ que constituem apontamentos comerciais não estão sujeitos ao regime de protecção do artigo 187º do Código de Processo Penal, e que a decidiu no sentido da sua não inconstitucionalidade. Mas não teria sido essa a dimensão normativa cuja inconstitucionalidade o recorrente havia suscitado.

    «(…) Ora, é por demais evidente que a questão é rigorosamente a mesma: a questão que o reclamante suscitou de forma processualmente adequada nas instâncias (a inconstitucionalidade da norma contida nos...

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