Acórdão nº 586/10.1YRLSB.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Julho de 2010

Magistrado ResponsávelSANTOS CARVALHO
Data da Resolução21 de Julho de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: EXTRADIÇÃO Decisão: NEGADO PROVIMENTO Sumário : I - O mandado de detenção europeu (MDE) é uma decisão judiciária emitida por um Estado membro com vista à detenção e entrega por outro Estado membro de uma pessoa procurada para efeitos de procedimento criminal ou para cumprimento de uma pena ou medida de segurança privativas da liberdade. O mandado de detenção europeu é executado com base no princípio do reconhecimento mútuo e em conformidade com o disposto na Lei n.º 65/2003, de 23 de Agosto e na Decisão Quadro n.º 2002/584/JAI, do Conselho, de 13 de Junho.

II - Trata-se de um instrumento destinado a reforçar a cooperação entre as autoridades judiciárias dos Estados-Membros suprimindo o recurso à extradição, pelo que os seus procedimentos são expeditos e com prazos reduzidos, embora com total salvaguarda dos direitos constitucionais de defesa.

III - A falta de indicação no mandado de detenção europeu da nacionalidade da pessoa a deter não é um elemento essencial para a sua execução, nem jamais poderia ser motivo de recusa de entrega, pois os motivos de recusa de entrega, obrigatórios e facultativos, estão mencionados nos art.ºs 11.º e 12.º da Lei 65/2003 e neles não está prevista a falta de algum dos elementos de identificação. Basta que a pessoa procurada seja suficientemente identificada com os elementos disponíveis, para que, no momento da detenção, haja uma coincidência de identificações, sem margem para dúvida.

IV - O recorrente tomou conhecimento do conteúdo do MDE quando foi detido e apresentado para interrogatório no Tribunal da Relação de Lisboa, teve ainda oportunidade de reflectir sobre tal conteúdo quando, por escrito e através do seu Il. Mandatário, deduziu a oposição. Mas, só agora, no recurso para o STJ do Acórdão da Relação que ordenou a sua entrega, “descobriu” que não era a pessoa procurada, como se não fosse a primeira coisa que teria dito, caso não fosse essa pessoa procurada, logo que o Desembargador relator lhe deu conhecimento dos factos que lhe estão imputados.

V - Seja como for, estamos na fase de recurso e os recursos não se destinam a conhecer de questões novas, antes são remédios jurídicos, destinados a eliminar os erros de apreciação e de julgamento cometidos no tribunal recorrido. Portanto, é com base no texto da decisão recorrida que o tribunal de recurso julga e, assim, todas as questões que não tenham sido conhecidas pelo tribunal recorrido não podem agora, no tribunal de recurso, ser suscitadas “ex novo” pelo recorrente.

VI - De acordo com a al. n) do n.º 2 do art.º 2.º da Lei n.º 65/2003, os crimes que sejam considerados como auxílio à entrada e permanência irregulares pelo Estado que emite o MDE e que aí sejam punidos com pena de duração máxima superior a 3 anos não necessitam de dupla incriminação para o mandado ser exequível, isto é, os factos podem não constituir crime face à lei do Estado da execução e mesmo assim este Estado não pode recusar o pedido.

VII - É irrelevante a alegação de que o procedimento criminal estará prescrito tanto pela lei portuguesa como pela lei alemã, com o fundamento de que os factos alegadamente praticados pelo requerente remontam a 1994, ou seja, há mais de 16 (dezasseis) anos.

VIII - E é irrelevante, não tanto porque os factos se prolongaram até 1997, mas porque o que a al. e) do art.º 12° n.º 1 da Lei 65/2003 de 23 de Agosto dispõe é que há motivo de recusa facultativa se tiverem decorrido os prazos de prescrição do procedimento criminal ou da pena, de acordo com a lei portuguesa, desde que os tribunais portugueses sejam competentes para o conhecimento dos factos que motivam a emissão do mandado de detenção europeu.

IX - Ora, como bem explicou o Tribunal da Relação de Lisboa, «Tendo os factos em apreço sido praticados com vista à entrada e permanência indevida de estrangeiros no território da República Federal da Alemanha, os mesmos são criminalmente irrelevantes do ponto de vista das normas do direito português, que punem condutas idênticas, com referência ao território nacional».

Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1.

Por Acórdão de 30 de Junho de 2010, o Tribunal da Relação de Lisboa determinou a execução do mandado de detenção europeu emitido pelo Tribunal de 1ª Instância de Duisburgo, Alemanha, contra o arguido A, indeferindo a oposição que o mesmo oportunamente deduzira.

  1. Desse Acórdão recorre agora o requerido para o Supremo Tribunal de Justiça e, da sua fundamentação, retira as seguintes conclusões: 1- O MDE emitido pelas autoridades Alemãs, não é esclarecedor e não contêm as informações constantes do artigo 3° da Lei 65/2003.

    2- A identidade do requerente não é a que consta do MDE.

    3- O MDE não contém a nacionalidade, elemento obrigatório, violando assim o disposto artigo 3° da Lei 65/2003.

    4- Não foram assegurados os Direitos, Liberdades e Garantias da Constituição da República Portuguesa.

    5- Do MDE não consta o número de infracções e da pena concreta para cada uma delas.

    6- Pelo que, atento à "fraca" informação do MDE, e cuja informação dada pelas autoridades Alemãs, os factos alegadamente praticados pelo requerente remontam a 1994, ou seja, há mais de 16 (dezasseis) anos, cuja prescrição, quer para o procedimento criminal, quer para cumprimento de pena, já ocorreu em Portugal.

    7- Atento os prazos de prescrição ocorrido quer em Portugal quer na Alemanha, e atento a que o MDE, faz referência à prática dos factos, quer em Portugal quer na Alemanha, encontra-se preenchida a causa de recusa previsto no artigo 12° n.º 1 alínea g) da Lei 65/2003 de 23 de Agosto.

  2. O M.º P.º respondeu ao recurso e concluiu: 1 - O mandado de detenção emitido pelo Tribunal de 1ª Instância de Duisburg, Alemanha, obedece a todos os requisitos legais, está traduzido em Português, contém todas as pertinentes informações exigidas pelo art. 3.º da Lei n.º 65/03, de 23 de Agosto, e o arguido foi devidamente informado da sua existência e do seu conteúdo, não se verificando por isso qualquer vício que obste à sua imediata execução; 2 - Os requisitos atinentes à pessoa procurada, exigidos pela alínea a) do n.º 1 do art. 3.º da Lei em referência (identidade e nacionalidade), só serão satisfeitos na medida do possível, isto é tanto quanto forem do conhecimento do Estado emissor, e a sua falta não constitui obstáculo à validade e à execução do MDE, desde que não se suscitem dúvidas - como "in casu" se não suscitaram - sobre os elementos de identificação, incluindo a nacionalidade, da pessoa requerida.

    3 - A questão do erro sobre a identidade do requerido, que nos termos do n.º 2 do art. 21.º da supra citado diploma legal constitui fundamento de oposição à entrega, não foi suscitada pelo ora recorrente no âmbito dessa oposição, motivo pelo qual não foi apreciada nem decidida pelo tribunal recorrido.

    4 - Ora, destinando-se os recursos, apenas, a modificar decisões e não a criar decisões sobre matéria nova, não pode tal questão ser agora apreciada, "ex novo", no âmbito deste recurso, que assim deverá, nesta parte, ser liminarmente rejeitado.

    5 - Inexistindo, por outro lado, qualquer outro fundamento de recusa, quer obrigatória quer facultativa - nomeadamente os que vêm previstos nas invocadas alíneas e) e g) do art. 12.º do mesmo diploma legal - deve o arguido e ora recorrente ser entregue ao Estado emitente do presente MDE, com se decidiu, posto que sob a condição, cuja garantia já se mostra prestada, a que se refere a alínea c) do art. 13.º da mencionada Lei n.º 65/2003.

    6- O Acórdão...

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