Acórdão nº 520/08.9GAACB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 30 de Junho de 2010

Magistrado ResponsávelJORGE DIAS
Data da Resolução30 de Junho de 2010
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

pág. 24 Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra, Secção Criminal.

No processo supra identificado foi proferida sentença que julgou procedente a acusação deduzida contra o arguido: R, nascido a 21 de … de 1951, filho de E e de J natural de… concelho de Leiria e residente …. concelho de Leiria; Sendo decidido: - Condenar o arguido, pela prática de um crime de ofensa à integridade física p. e p. pelo art. 143 nº 1, ocorrido a 2-12-2008, na pena de 100 (cem) dias de multa; - Condenar o arguido, pela prática de um crime de ameaça p. e p. pelo art. 153 nº 1 e art. 155 nº 1 a) do C. P., ocorrido a 2-12-2008, na pena de 60 (sessenta) dias de multa; - Condenar o arguido, pela prática dos crimes assinalados em 3.1. e 3.2. na pena única de 150 (cento e cinquenta) dias de multa à taxa diária de 15 (quinze) Euros; - Condenar R a entregar a A a quantia de 3 000 (três mil) Euros, acrescida de juros de mora à taxa legal até integral pagamento devidos desde 22-10-2009; ***Inconformado interpôs recurso o arguido.

São do seguinte teor as conclusões, formuladas na motivação do seu recurso, e que delimitam o objecto do mesmo: 1. Pela douta sentença proferida nos autos à margem identificados, o Meritíssimo Juiz a quo julgou procedente, por provada, a acusação deduzida contra o arguido, imputando-lhe a prática, como autor material de um crime de ofensa à integridade física p. e p. pelo art. 143, nº 1, do Código Penal e um crime de ameaça p. e p. nos art. 153 e 155 n21 al. a) também do Código Penal, 2. Em consequência dos factos considerados como provados, e considerando a acusação totalmente procedente, o Meritíssimo Juiz a quo decidiu condenar o arguido, como autor material dos crimes de que vinha acusado, condenando-o na pena única de 150 dias de multa à taxa diária de €15,00, num montante global de €2250,00, e ainda condenou o arguido no pagamento do pedido cível apresentado pelo assistente, no montante de €3000,00.

3. Fundamenta o meritíssimo Juiz A Quo que baseou toda a sua decisão no depoimento do assistente, "a qual de forma distanciada e lógica, relatou o ocorrido (...)" continuando a afirmar que "o seu depoimento revela coerência e ausência de qualquer contradição". Somos a contrariar este entendimento do Meritíssimo Juiz. Desde logo, nunca um assistente num processo crime poderá ser considerado como "distanciado", uma vez que, é parte no processo, e não presta Juramento, conforme estipula o art. 145 nº 4 do CPP, pelo que é parte interessada no mesmo e nunca alguém distanciado dos factos.

4. Ainda mais quando, o assistente afirma claramente que está de mal com o arguido, e sendo seu ex-trabalhador, na empresa do arguido, saiu de lá a mal, pois foi despedido pelo arguido.

5. Por outro lado, afirma ainda o Meritíssimo Juiz a quo, na sua fundamentação de facto, que, o depoimento do assistente é confirmado pelas testemunhas que se seguiram, o que também não podemos concordar. Desde logo, porque todas as testemunhas trazidas ao processo pelo assistente foram ex-trabalhadores do arguido e todos foram por este despedidos, tendo saído a mal da empresa. Por outro lado são amigos do assistente, e colegas de trabalho.

6. E muitos factos ficaram por esclarecer. Senão vejamos: É afirmado pelo assistente que, quem estava consigo no momento da alegada agressão era o Sr. H, também testemunha aqui nos autos, ouvida em audiência. Essa testemunha esteve a cerca de 3, 4 metros do local onde ocorreu a alegada agressão, isto já nas palavras do próprio. No entanto, e depois de relatarem que foi o arguido que agrediu o assistente com um taco de basebol, vindo do nada, sem qualquer discussão previa, ao contrario do que é dado como provado pelo meritíssimo Juiz, é também dito pelo assistente, e confirmado pela testemunha H que, ninguém se meteu no meio dos dois para os separar, apenas interveio a Testemunha R que veio "em auxilio do sr. R", isto nas palavras do assistente, e que foi pela testemunha H agarrada para não se meter no meio dos dois. (depoimento da 1º testemunha, folhas 3 da acta da audiência de discussão e julgamento de dia 22 de janeiro de 2010, e gravação digital efectuada na aplicação habilus) 7. Ora, como é que é possível acreditar que, o assistente estava a ser, alegadamente, violentamente agredido com um taco de basebol pelo arguido, e a testemunha H, a cerca de 3 metros de distância, não intervém para ajudar o seu amigo e colega de trabalho? Mais, não permite que outro intervenha e chega mesmo a agarra-lo para que este não se meta e não vá em auxilio do Sr. R.

8. Quando é dito pelo assistente e pela testemunha que alguém vem em auxílio de outro, só poderá ser porque essa pessoa que precisa de auxílio está a ser agredida! A nós gera a dúvida, e confirma o depoimento do arguido.

9. Mais, a testemunha JJ que segundo o meritíssimo juiz também teve um depoimento isento e sem contradições, vem afirmar que foi verdade que o R veio em defesa do patrão, isto quando o sr. A ficou com o taco na mão, e afirma ainda que "nós éramos três e ninguém o deixou. Ele quis se aproximar mas um colega nosso não deixou!" (depoimento da 3ª testemunha, folhas 4 da acta da audiência de discussão e julgamento de dia 22 de janeiro de 2010, e gravação digital efectuada na aplicação habilus) 10. Por várias vezes foi pelas testemunhas e pelo próprio assistente afirmado que a testemunha R tentou vir em auxílio do ora arguido e foi impedido pela testemunha H. Ora, isto no nosso entendimento apenas poderá quer dizer uma coisa, é que se o ora recorrente precisava de auxílio era porque estava a ser agredido. Se nenhum dos colegas do assistente se meteu no meio da alegada briga, era porque este não necessitava de defesa. E não cremos que, como afirma o Meritíssimo Juiz, que não é por não existir "bons samaritanos" que ninguém interveio, pois faz parte do instinto humano que quando alguém que nos é próximo, ou pelo menos, nosso conhecido e amigo, se encontra em perigo, nós vamos em seu auxilio.

11. Outra contradição notória entre os depoimentos do assistente e das testemunhas H e JJ centra-se no facto de, tanto o assistente como a testemunha H. afirmam claramente que o assistente conseguiu retirar o taco de beisebol ao Sr. R e que foi po-Io no seu carro "entre os bancos da frente". (depoimento da 1º e 2º testemunha, folhas 3 e 4 da acta da audiência de discussão e julgamento de dia 22 de janeiro de 2010, e gravação digital efectuada na aplicação habilus) 12. Acontece que, a testemunha JJ, que afirma se encontrar dentro do carro, e que não saiu de lá de dentro, afirma ainda que não sabe o que aconteceu a esse taco, que ficou lá na empresa e que o mesmo nunca esteve no carro onde se encontrava. (depoimento da 1º testemunha, folhas 3 da acta da audiência de discussão e julgamento de dia 22 de janeiro de 2010, e gravação digital efectuada na aplicação habilus) 13. Ora, por todas estas imprecisões, incongruências e verdadeiras contradições entre os depoimentos das testemunhas apresentadas pela acusação e do assistente, não aceitamos que na sua douta sentença venha o Meritíssimo Juiz afirmar que foram depoimentos distanciados, lógicos e principalmente que foram depoimentos isentos e sem contradições. Ainda que caiba ao Juiz da causa o princípio da livre apreciação da prova, é notório que no caso em apreço a prova foi claramente mal apreciada, ou tendencialmente apreciada a favor do assistente.

14. Por outro lado, não entende como considera o Meritíssimo Juiz a quo que ficou provado o crime de ameaças, e isto porque foi claramente afirmado pelo próprio assistente que, voltou à empresa no dia a seguir ao factos dizendo mesmo que "Voltei, voltei, não tinha nada a temer, não me sentia com medo para lá voltar". (depoimento da 12 testemunha, folhas 3 da acta da audiência de discussão e julgamento de dia 22 de janeiro de 2010, e gravação digital efectuada na aplicação habilus) 15. Alguém que teme pela sua vida, não volta ao sitio onde foi agredido, ainda mais sozinho. Mas como pelo próprio foi dito, não tinha medo nenhum para lá voltar!! 16. Esta afirmação é suficiente para que não se possa acreditar que a suposta expressão dita pelo arguido foi adequada a provocar medo ou inquietação tal como se encontra previsto no tipo legal de crime.

17. Não se preenchendo o Tipo legal do crime de ameaças, previsto no art. 153 do Código penal, não se pode falar que foi praticado o mesmo crime.

18. Pelo que, existe um erro notório na apreciação da prova, pois foram considerados como provados factos que no nosso entendimento estão claramente em contradição com a prova produzida. Por outro lado, foram desconsiderados factos que tão só são suficientes para absolver o arguido. Pelo que deverá ser a sentença recorrida alterada quanto à matéria de facto, nos termos do art. 410 nº2 do CPP.

19. Quanto à testemunha apresentada pelo arguido, R o seu depoimento não foi sequer considerado pelo Meritíssimo Juiz a quo, pois considerou que o mesmo foi um depoimento com contradições, sendo que a fundamentação para tal convicção apenas se fundou no facto de a testemunha quando questionada sobre a primeira imagem que viu referiu que ambos estavam no chão. Ora, em nosso entendimento, tal fundamentação é parca, e injusta, pois a testemunha referiu muito mais que isso, e nem sequer foi considerado.

20. Tal testemunha confirmou o depoimento do arguido e foi por todas as restantes testemunhas confirmado que o mesmo se encontrava presente no dia e na hora referida na acusação, pelo que era conhecedor dos factos aqui em discussão.

21. A testemunha, no nosso entendimento foi isenta, e só entrou em...

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