Acórdão nº 0103/10 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 16 de Junho de 2010

Magistrado ResponsávelCASIMIRO GONÇALVES
Data da Resolução16 de Junho de 2010
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: RELATÓRIO 1.1. A…, S.A., com os demais sinais dos autos, recorre do acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul, que julgou improcedente a acção administrativa especial por si deduzida contra o despacho do SEAF que lhe indeferiu o pedido de transmissibilidade de prejuízos fiscais.

1.2. A recorrente termina as alegações do recurso formulando as Conclusões seguintes: I. O regime previsto no artigo 69º do Código do IRC sobre a transmissibilidade dos prejuízos não configura um benefício fiscal, mas sim um desagravamento estrutural, nos termos do artigo 4º do EBF.

  1. A norma em causa não impede a tributação como é propósito dos benefícios fiscais, mas visa apenas conter a obrigação de imposto na medida do rendimento real da empresa e na sua dimensão inter-temporal e inter-societária.

  2. Como refere Carlos Baptista Lobo “somos obrigados a concluir que não existe qualquer fundamento de extra-fiscalidade para a justificação do regime fiscal previsto nos artigos 67º a 72º do Código do IRC. Pelo contrário, o regime previsto traduz-se num desagravamento estrutural.” IV. Concluindo que “A configuração destes instrumentos fiscais como benefícios fiscais é totalmente desadequada e redutora da realidade” V. Tal foi também o entendimento do Grupo de Trabalho criado por Despacho de 1 de Maio de 2006, do Ministro de Estado e das Finanças, que procedeu à reavaliação dos benefícios fiscais.

  3. Considerou o Grupo de Trabalho que “Subjacente a tais normas não há pois uma verdadeira extrafiscalidade, isto é, um específico objectivo económico e/ou social a ser prosseguido mas apenas um mero propósito técnico”.

  4. Pelo que concluíram, peremptoriamente “Nesta medida, portanto, não estamos perante benefícios fiscais em sentido próprio.” VIII. Por todos estes motivos, o art. 11º-A do EBF (actual artigo 13º do EBF) não é aplicável ao regime estatuído no art. 69º do CIRC.

  5. Com este enquadramento legal, devia o Douto Tribunal recorrido, ter apreciado a questão do deferimento tácito do pedido de transmissibilidade dos prejuízos fiscais registados nas sociedades incorporadas.

  6. Porquanto, tendo a Recorrente requerido a 30 de Novembro de 2004, autorização para dedução de prejuízos fiscais aos eventuais lucros que viesse a registar nos exercícios pós fusão, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 69º do CIRC, o respectivo deferimento tácito ocorreu em 30 de Maio de 2005.

  7. Atente-se que o requerimento foi apresentado cumprindo todos os requisitos formais e substanciais em vigor à época, constantes do artigo 69º, nº 2, do CIRC e da Circular 6/2002, de 2 de Abril, da DSIRC.

  8. E tal como o Acórdão do STA decidiu no processo 0548/08, de 22.04.2009, não pode a Administração Fiscal, mediante a Circular nº 7/2005, de 16-05-2005, exigir a comprovação de inexistência de dívidas à Segurança Social, porquanto a sua emissão “é posterior à data de apresentação dos pedidos de transmissibilidade de prejuízos fiscais”.

  9. Acrescentando que “é apenas do acompanhamento do requerimento por estes elementos referidos no nº 2 (do artigo 69º do CIRC) e não quaisquer outros eventualmente necessários ou convenientes para apreciação do pedido que o artigo 69º, nº 7 do CIRC fazia depender a formação do deferimento tácito”.

  10. Não pode assim ser aceite vir agora a Administração Fiscal exigir por outra via, qualificando algo como sendo benefício fiscal, outros documentos para além dos referidos no artigo 69º, nº 2, do CIRC e da Circular 6/2002, de 2 de Abril, da DSIRC.

  11. Constata-se que o facto da Administração Fiscal ter sentido necessidade de expressamente abarcar esta exigência numa nova Circular relativa ao artigo 69º do CIRC (a Circular 7/2005, de 16 de Maio) demonstra o quão forçado é a fundamentação de ser um benefício fiscal.

  12. Por outro lado, só em 29 de Junho de 2006, ou seja, mais de um ano e meio após a data em que a Recorrente apresentou o referido requerimento, a DSIRC solicitou à Recorrente o envio de comprovativos da inexistência de dívidas à Segurança Social.

  13. Pelo que esta solicitação da DSIRC não é susceptível de suspender a contagem do prazo de deferimento tácito, dado o facto principal de este já ter decorrido totalmente.

  14. Por esse motivo, da matéria de facto constante dos autos e da Legislação aplicável, verificou-se um deferimento tácito à utilização dos prejuízos das sociedades incorporadas.

  15. Este deferimento tácito consubstanciou um acto constitutivo de direitos para a Recorrente.

  16. Pelo que não poderia ser revogado, atendendo às limitações dos artigos 140º e 141º do Código do Procedimento Administrativo.

  17. Por esse facto, o Despacho do SEAF enferma de vício de violação de lei, não só por erro sobre os pressupostos de facto, mas também por violação dos artigos 140º e 141º do Código do Procedimento Administrativo.

  18. Nessa medida, deve ser declarada a possibilidade da Recorrente, com base no deferimento tácito em deduzir os prejuízos reconhecidos nas sociedades incorporadas.

  19. Concomitantemente deve-se anular o Despacho do Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais nº 131/2007, de 6 de Fevereiro de 2007.

  20. Conclui-se, deste modo, que o Acórdão recorrido incorre em erro de julgamento, pelo que não se poderá manter, devendo ser revogado de imediato, julgando-se procedente a acção, o que desde já se requer para todos os efeitos legais.

    Termina pedindo o provimento do recurso e a revogação da decisão recorrida.

    1.3. Contra-alegou o recorrido, rematando com a formulação das Conclusões seguintes: I. A transmissibilidade dos prejuízos fiscais, prevista no artigo 69º do CIRC, configura um benefício fiscal que carece de reconhecimento, estando como tal sujeita ao disposto no artigo 11º-A, nº 1 do EBF.

  21. Consistindo a transmissão de prejuízos fiscais numa consequente dedução na matéria colectável apurada, à luz dos artigos 2º e 3º do EBF, a mesma não pode deixar de ser considerada como um benefício fiscal, ainda que ao Requerente a pretenda designar por outra forma, mesmo que com idêntico sentido.

  22. A formação do acto tácito está sempre dependente do preenchimento - no caso, por parte do requerente - dos requisitos de deferimento tácito da pretensão, e se estes não estiverem reunidos, não pode haver formação do acto tácito.

  23. Estando a Administração Tributária adstrita ao estrito cumprimento da legalidade, nunca poderia vir a proferir uma decisão de mérito que se traduzisse no reconhecimento, ou não, de um verdadeiro benefício fiscal, sem que se mostrassem reunidos todos os requisitos formais e substanciais para que tal fosse possível.

  24. Não é por dar cumprimento ao mencionado na Circular nº 6/2002 - de 02.04.2002 - que a Recorrente fica desobrigada do cumprimento do disposto no artigo 11º-A do EBF.

  25. Não foi a Circular nº 7/2005 que veio determinar a obrigação legal de comprovação da regularidade da situação da Autora perante a Segurança Social - o que determina tal obrigação é próprio texto legal ínsito no artigo 11º-A do EBF (em vigor desde Novembro de 2002).

  26. Tendo a omissão do preenchimento dos requisitos formais origem numa lacuna da Autora, e não da Administração Tributária, não pode admitir-se que tenha ocorrido deferimento tácito (nem em 30 de Maio de 2005, nem em qualquer outro momento, uma vez que não foram juntas certidões relativas as todas as sociedades envolvidas no processo de fusão).

  27. Não ocorrendo o deferimento tácito, e tendo sido proferido decisão expressa de indeferimento por parte do Recorrido, que reconhecidamente resulta de um juízo discricionário do seu autor (apenas sindicável pelos Tribunais em caso de erro grosseiro ou manifesta desadequação ao fim legal, cf. Acórdãos do STA proferidos nos processos nº 142/06 e 1003/05, entre outros), deverá o mesmo ser mantido, pois que não merece qualquer censura.

    Termina com o pedido de confirmação do julgado.

    1.4. O MP emite Parecer no sentido do provimento do recurso, fundamentando-se no seguinte: «A questão suscitada no presente recurso consiste em saber se se formou deferimento tácito sobre o pedido de transmissibilidade dos prejuízos fiscais formulado pela autora.

    Alega a recorrente, que o regime previsto no artigo 69° do Código do IRC sobre a transmissibilidade dos prejuízos não configura um benefício fiscal, mas sim um desagravamento...

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