Acórdão nº 42/06.2TAMLG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 12 de Abril de 2010

Data12 Abril 2010

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães: * I- Relatório No processo comum colectivo n.º 42/06.2TAMLG do Tribunal Judicial de Melgaço, por acórdão de 30 de Junho de 2009, o arguido Augusto S..., com os demais sinais dos autos, foi condenado, pela prática, como autor, de um crime de abuso sexual de crianças, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 172.°, n.º1, 177.º, n.º1 alínea a) e 30°, todos do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos de prisão.

* Inconformado com tal decisão o arguido dela interpôs recurso, rematando a sua motivação com as seguintes conclusões que se transcrevem: «1. Com este recurso pretende o recorrente, obter a revogação da sentença recorrida, que condenou o arguido como autor de um crime de abuso sexual de crianças, na forma continuada, p.p. art. 172º, nº1, 177º, nº1 - a) e 30º C.P., na pena de dois anos de prisão efectiva e ao pagamento das custas do processo, e a sua substituição por outra que absolva o arguido e ora recorrente do crime de que vem acusado; 2. A sentença recorrida não realizou um adequado e imprescindível exame crítico da prova produzida em audiência de julgamento; 3. Existe um notório erro na apreciação da prova dada como provada (art. 410º, nº2, c) do CPP); 4. Verifica-se insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, nos termos da alínea b) do diploma legal supra referido, pois à factualidade vertida na decisão faltam os elementos necessários para se poder formular um juízo seguro de condenação.

5. Atendendo, essencialmente, ao depoimento do menor Paulo S..., pouco credível, tendencioso, orientado e sugerido, construído e apoiado em longos silêncios, e monossílabos de discordância e concordância, entrecortados por frases curtas, mas mesmo assim bem pouco esclarecedoras, em muitos aspectos contraditório ao depoimento das restantes testemunhas da acusação, impunha-se que se desse como não provados os factos constantes dos pontos 4 a 12 da matéria fáctica dada como provada devendo, ser a Douta Decisão de que se recorre alterada, considerando-se aqueles factos como não provados; 6. O Meritíssimo Juiz do Tribunal “a quo”, face às omissões, contradições, inseguranças verificadas nos depoimentos do menor e da sua mãe, Maria I..., bem como às discrepâncias entre ambos os depoimentos, não deveria ter dado como provado que, desde pelo menos o dia 12/03/1997 até finais de Agosto de 2004, o arguido, pelo menos uma vez por semana, à noite quando o Paulo se ia deitar ou à tarde quando fazia a sesta, sempre no interior da residência supra identificada, despia-se e deitava-se com o menor com o menor na cama, esfregando o seu pénis erecto nas nádegas do seu filho. Nessas ocasiões o arguido também acariciava as nádegas do menor e friccionava o seu próprio pénis com as mãos, masturbando-se e ejaculando no exterior do menor, nomeadamente contra o seu corpo (ponto 4 dos factos provados); 7. Pelas razões supra referidas também não deveria ter sido dado como provado, que, em dia não concretamente apurado, mas durante o mês de Agosto de 2004, durante a manhã/tarde, quando o Paulo estava deitado a descansar, o arguido entrou no quarto dele e deitou-se na cama onde o mesmo estava. Acto contínuo, abeirou-se dele e despiu-se, ficando apenas com a roupa interior vestida (cuecas). Nestas circunstâncias, o arguido retirou o seu pénis para fora das cuecas e esfregou o mesmo nas nádegas do menor inúmeras e repetidas vezes, ao mesmo tempo que acariciava as nádegas do menor e friccionava o seu pénis, até que ejaculou sobre a perna do menor, tendo ficado esperma na coxa deste (ponto 5 dos factos provados); 8. O Meritíssimo Juiz do tribunal “a quo”, também não deveria ter dado como provado, mas sim como não provado, que, quando assim procedia, o arguido foi surpreendido pela mulher, tendo esta de imediato abandonado a habitação, levando consigo o menor, pois, também relativamente a estes factos muitas dúvidas se colocam, sendo que a própria esposa do arguido ficou com dúvidas sobre o que tinha visto e também não se provou se foi de imediato que abandonou a habitação (ponto 6 dos factos provados).

9. Também não existe matéria fáctica nos autos que permitisse dar como provado o ponto 7, ou seja, que os comportamentos do arguido – ou seja, os abusos de que o Paulo foi vitima e dos quais sempre se deu conta – agravaram directa e necessariamente a desordem de desenvolvimento da personalidade do menor, nomeadamente: atraso na linguagem de que está afectado (sendo que só a partir dos 3 anos de idade passou a verbalizar as primeiras palavras), necessidade de acompanhamento psicológico e ortofónico a partir do infantário, capacidades intelectuais limitadas, dificuldades de aprendizagem (aos dez anos de idade ainda não sabia escrever o seu próprio nome). O único elemento de prova é o Relatório de Avaliação Psicológica do menor, constante de fls. 25 e seguintes e tal relatório não nos permite concluir, de modo algum, muito menos de forma segura e inequívoca, que a desordem no desenvolvimento da personalidade do menor esteja relacionada com o eventual abuso sexual, assim como também não nos permite concluir que os eventuais abusos sexuais, de que diz ter sido vitima, tenham agravado essa desordem. Além disso, o Ex.mo senhor perito nem sequer conseguiu determinar a “natureza” do alegado traumatismo psíquico, e, por essa razão, muito menos poderia ser determinada a respectiva causa, pelo que não pode, pois, o mencionado relatório ser fundamento para considerar provados os factos constantes do ponto 7, pelo que, também estes factos deverão ser considerados não provados.

10. Ao não serem considerados como provados os factos supra referidos, constantes dos pontos 4 a 7 dos factos dados como provados, também não poderá ser dada como provada a matéria fáctica constante dos pontos 8, 9, 10, 11 e 12, pelo que também deverá ser considerada como não provada.

11. Não se fazendo prova sobre se na verdade os factos ocorreram, a sentença recorrida violou o princípio in dubio pro reo, alicerçado no princípio da presunção da inocência do arguido até ao trânsito em julgado da sentença que o condene (art. 32º da CRP); 12. Como consequência do supra exposto, e porque o arguido sempre manifestou e continua a manifestar a sua inocência quanto ao crime por que foi condenado, deveria a decisão final ser de absolvição; 13. Contudo, mesmo que Vªs Exªs assim não considerem, que só por mera hipótese se admite, devem Vªs Exªs Decidir pela verificação dos pressupostos para que a pena de prisão seja suspensa na sua execução, atendendo à pena aplicada (in casu, dois anos) e ao juízo de prognose favorável de que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada as finalidades da punição geral e especial; 14. In casu, atendendo-se à personalidade do Arguido, às condições da sua vida (está socialmente bem integrado e com boas relações de vizinhança, ponto 18 dos factos provados) e à conduta anterior e posterior ao crime (não tem antecedentes criminais, ponto 19 dos factos provados), impunha-se a suspensão da execução da pena de prisão (cfr. art.o 50.° nº 1 Cód. Penal); A Douta Sentença recorrida violou as normas dos artigos 40.°, 70.° e 71.° todos, do Código Penal. Os Mm. Juizes "a quo" não consideraram aquando da aplicação da pena de prisão efectiva os pressupostos que deveriam ter sido atendidos para a sua suspensão, pois in casu o juízo de prognose é favorável ao Arguido, não se prevendo que o Arguido possa vir a cometer novos crimes, desta ou de outra natureza, se tiver pendente uma pena de prisão.

15. Não o entendendo assim, a douta decisão em recurso violou, além do mais, o disposto nos artigos, 172º, nº 1, 177º, nº 1, alínea a) e 50º, nº1 do Código Penal.» Termina pedindo que a revogação da decisão recorrida e a sua substituição “por outra que absolva o arguido e ora recorrente do crime de que vem acusado, ou, caso assim se não entende, o que só por mera hipótese e dever de patrocínio se admite, ser decretada a suspensão da pena de prisão que ao mesmo arguido foi aplicada, com todas as consequência legais.” * O Ministério Público respondeu ao recurso pugnando pela manutenção do julgado.

* O recurso foi admitido para este Tribunal da Relação de Guimarães, por despacho constante de fls. 604.

* Nesta Relação, o Mistério Público emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

* Foram colhidos os vistos e realizada a conferência, pelo que cumpre decidir.

* II- Fundamentação 1. É a seguinte a factualidade apurada no tribunal a quo: A) Factos provados (transcrição) «1. O arguido casou catolicamente no dia 15.08.1979 com Maria I... ; 2. Da referida união nasceram três filhos: Miguel S... que nasceu a 20.12.1981, Susana S... que nasceu a 20.07.1984, e Paulo S... que nasceu a 12.03.1994; 3. Este agregado familiar viveu junto até Agosto de 2004, altura em que a mulher do arguido, saiu de casa onde estes habitavam sita no lugar de C... , Melgaço, e foi viver para Nice, França, levando consigo o seu filho Paulo; 4. Desde pelo menos o dia 12.03.1997 até finais Agosto 2004, o arguido, pelo menos uma vez por semana, à noite quando o Paulo se ia deitar ou à tarde quando fazia a sesta, sempre no interior da residência supra identificada, despia-se e deitava-se com o menor na cama, esfregando o seu pénis erecto nas nádegas do seu filho. Nessas ocasiões o arguido também acariciava as nádegas do menor e friccionava o seu próprio pénis com as mãos, masturbando-se e ejaculando no exterior do menor, nomeadamente contra o seu corpo; 5. Assim, em dia não concretamente apurado, mas durante o mês de Agosto de 2004, durante a manhã/tarde, quando o Paulo estava deitado a descansar, o arguido entrou no quarto dele e deitou-se na cama onde o mesmo estava. Acto contínuo, abeirou-se dele e despiu-se, ficando apenas com a roupa interior vestida (cuecas). Nestas circunstâncias, o arguido retirou o seu pénis para fora das cuecas e esfregou o mesmo nas nádegas do menor inúmeras e repetidas vezes, ao...

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