Acórdão nº 113/06.5YRGMR.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Maio de 2010

Magistrado ResponsávelALBERTO SOBRINHO
Data da Resolução06 de Maio de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: CONCEDIDA REVISTA Sumário : 1. O direito pessoal de gozo apresenta-se inicialmente como direito a uma prestação, para depois a actividade do titular (o gozo) se centrar directamente sobre a coisa. Mas o poder de gozo mantém-se sempre intimamente conexionado com a relação pessoal ou obrigacional que lhe subjaz. Este direito de gozo há-de dimanar duma vinculação obrigacional daquele a quem competia o gozo da coisa.

  1. Contrariamente ao que acontece com os direitos reais, em que os particulares estão impedidos de criar figuras inominadas de natureza real (art. 1306º, nº 1 C.Civil), no campo dos direitos obrigacionais vigora o princípio da atipicidade, nenhuma restrição se colocando, em princípio, à constituição de qualquer obrigação, podendo as partes fixar livremente, dentro dos limites da lei, o conteúdo positivo ou negativo da prestação (art. 398º, nº 1 C.Civil).

  2. Quando o proprietário de um empreendimento de lazer se vincula a proporcionar aos condóminos das fracções integrantes de um edifício constituído em regime de propriedade horizontal o direito de uso e fruição dos equipamentos de um Clube de ..., que não é parte integrante do condomínio, é inquestionável que os condóminos passaram a ter direito ao uso dos bens de equipamento, mas não um direito sobre esses mesmos bens. Só que os sujeitos activos deste direito de uso e fruição não estão individualmente determinados. Os seus beneficiários são os condóminos e utilizadores das fracções do Edifício constituído em regime de propriedade horizontal. Os sujeitos desta relação jurídica apenas são determinados através da titularidade de um direito real: titular passivo, o proprietário do Clube de ...

    e titular activo, os condóminos e/ou utilizadores das fracções do Edifício M....

    Esta situação jurídica apresenta-se, relativamente aos titulares de ambos os lados, funcionalmente inerente à titularidade de direitos de propriedade, não podendo ser desligada desse direito e atribuída a quem lhe seja estranha, constituindo uma típica obrigação real inominada, com um conteúdo não legalmente reconhecido e, enquanto tal, não permitida.

    Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório - CONDOMÍNIO EDIFICIO M...; - AA; - BB e mulher CC; - DD; - EE e mulher FF; - GG; - HH e mulher II; - JJ e mulher KK; - LL; - MM; - NN e mulher OO; - PP e mulher QQ; - RR e mulher SS; - TT; - UU e mulher VV; - XX; - ZZ; - AAA e mulher BBB; - CCC; - DDD e mulher EEE; - FFF; - GGG e mulher III; - JJJ; - KKK e mulher LLL; - MMM e mulher NNN; - OOO; - PPP e mulher QQQ; - RRR e mulher SSS; - TTT; e acção com processo ordinário nº 498/2002, Tribunal Judicial da Comarca de Caminha - UUU e mulher VVV, intentaram, a 5 de Agosto de 2002, a presente acção declarativa, com processo ordinário, contra - EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS ..., LDA; - ... – CONSTRUÇÕES DE IMÓVEIS, LDA; e - XXX, 1. pedindo que se declare que: a- pertencem às partes comuns do Edifício M...

    , os equipamentos de lazer que constituem o denominado “Clube de ...” – constituído pelo edifício de apoio e casa do guarda, piscinas (crianças e adultos) e balneários de apoio, court de ténis e áreas de jardim e de lazer adjacentes – edificados nos prédios descritos na Conservatória do Registo Predial de Caminha sob os nºs …; … e …; b- o esbulho do “Clube de ...” praticado pelos réus ofende o direito de propriedade dos 2° a 30° autores e demais condóminos do Edifício M...

    .

  3. e os réus condenados: c- a reconhecer que os 2° a 30° autores e os demais condóminos do Edifício M...

    são donos e legítimos proprietários daquele Clube de ..., correspondente aos mencionados prédios e, em consequência, ordenado o cancelamento do registo predial destes prédios a favor da 1ª ré; d- a absterem-se de praticar qualquer acto que ofenda aquele direito de propriedade; e- a executar determinadas obras, que descrevem, no prazo de doze dias 5 ou, então, no pagamento do seu custo a apurar em liquidação de sentença; f- no pagamento ao condomínio da quantia que se venha a apurar em liquidação da sentença e relativa às despesas decorrentes da execução da sentença proferida no Procedimento Cautelar apenso; g- No pagamento a cada um dos 2º a 30° Autores da quantia de € 200,00, a título de indemnização pelos danos patrimoniais sofridos e de € 500,00, a título de danos não patrimoniais; 3. seja ainda declarado: h- parcialmente nulo, por violação do projecto e da lei, o negócio jurídico de constituição da propriedade horizontal, na parte em que este não incluiu como partes comuns do prédio o identificado “Clube de ...”, e que o mesmo prédio abrange as quatro descrições prediais – ….; …; … e …; i- nulo, por simulado e por desconformidade com o objecto, o negócio jurídico de compra e venda celebrado entre a 1ª e 2ª Rés relativamente aos três prrédios descritos na Conservatória do Registo Predial de Caminha sob os números …; … e 00213-SEIXAS e ordenado o cancelamento dos registos prediais a favor da 2ª ré, ou do seu titular inscrito e a quem ela ou os sucessivos transmitentes venham a transmitir o direito de propriedade dos mesmos prédios.

    subsidiariamente, para a hipótese de improcedência dos pedidos formulados sob as als. a), b) e c): j- declarar-se constituído a favor dos condóminos do Edifício M...

    o direito pessoal de gozo sobre o “Clube de ...”, traduzido no direito de usar e fruir todos os equipamentos que constituem esse Clube, proporcionando-lhes, de forma exclusiva e conforme a satisfação do seu interesse, o seu gozo directo e autónomo, sem limite de tempo, e, ainda, transmissível a quantos venham a ser proprietários – condóminos – de fracções autónomas do Edifício M...

    .

    Em fundamento da sua pretensão alegam, no essencial, que o Edifício M...

    corresponde a um complexo habitacional e de lazer, em regime de propriedade horizontal, constituído por 52 fracções autónomas, pertencentes a vários proprietários, entre os quais os 2°s a 30°s autores.

    Das partes comuns do condomínio fechado Edifício M...

    faz parte integrante o “Clube de ...” e nas acções de promoção e vendas dos apartamentos a ré M... Lda. sempre referiu aos potenciais compradores e aos adquirentes que aqueles equipamentos de lazer integravam as partes comuns do condomínio fechado, destinados a uso comum dos condóminos e famílias.

    Após a conclusão do empreendimento, a ré EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS ..., LDA, procedeu à sua entrega aos respectivos proprietários das fracções autónomas e condomínio, incluindo as partes comuns e “Clube de ...”, para quem transferiram a sua posse e detenção, os quais passaram usar, sem qualquer interrupção e até 7 de Maio do corrente ano, todos os equipamentos e partes comuns, sem qualquer restrição ou embaraço de outrem, suportando todas as despesas e encargos com a sua fruição, limpeza e conservação, convictos de exercerem um direito próprio.

    Invocam seguidamente a prática de factos por parte do 1º e 3º réus violadores destes seus direitos.

    E que a 1ª ré vendeu à 2º os primitivos prédios em cujo solo foi edificado o “Clube de ...”, não ignorando que estavam a proceder à venda de coisa alheia, e que os imóveis declarados vender e comprar já não existiam.

    Contestou apenas a ré ... começando por excepcionar a ilegitimidade dos autores por desacompanhados dos demais condóminos e impugnar seguidamente que o “Clube de ...” integrasse o condomínio Edifício M...

    . O que se dispôs foi construir um Clube privado de Lazer e Desporto, onde os autores, em condições de utilização a fixar, iriam ter acesso, em igualdade de circunstâncias com quaisquer outros sócios a admitir, independentemente de serem ou não proprietários de fracções autónomas.

    Nunca os autores estiveram na posse daquelas infra-estruturas, tendo apenas a 1ª ré autorizado a utilização, a título precário, da piscina e de campo de ténis.

    E afirma ter adquirido realmente o imóvel em questão.

    Replicaram ainda os autores para se pronunciarem pela improcedência da excepção de ilegitimidade e manter a posição inicialmente assumida.

    No despacho saneador julgou-se improcedente a excepção de ilegitimidade activa invocada pela ré contestante, após o que se procedeu à selecção da matéria de facto, com fixação dos factos considerados assentes e dos controvertidos.

    Prosseguiu o processo para julgamento e na sentença, subsequentemente proferida, foi a acção julgada parcialmente procedente, declarando: a-...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
1 temas prácticos
1 sentencias
  • Acórdão nº 1197/13.5TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Julho de 2019
    • Portugal
    • [object Object],Supreme Court of Justice (Portugal)
    • 4 Julio 2019
    ...1990, págs. 48-51. [13] Cf. acórdãos do STJ de 19 de Outubro de 2006 — processo n.º 06B2983 —, de 6 de Maio de 2010 — processo n.º 113/06.5YRGMR.S1 — e de de 31 de Maio de 2012 — processo n.º [14] Cf. acórdão do STJ de 19 de Outubro de 2006 — processo n.º 06B2983. [15] Cf. acórdãos do STJ d......

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT