Acórdão nº 1054/06.6TBALM.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Maio de 2010

Magistrado ResponsávelURBANO DIAS
Data da Resolução04 de Maio de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA Sumário : I – O facto de o R., em plena Escola onde a A. trabalha, a ter apelidado, perante outrem, de “mentirosa”, “bandalho”, “aberração para o ensino”, “incompetente”, causando-lhe, como consequência directa e necessária graves perturbações físicas e psíquicas, é motivo de sobra para legitimar a condenação daquele, por ofensa à honra desta, no pagamento da peticionada indemnização por danos não patrimoniais.

II – O direito à honra é uma das mais importantes concretizações da tutela e do direito da personalidade. A honra é a dignidade pessoal pertencente à pessoa enquanto tal, e reconhecida na comunidade em que se insere e em que coabita e convive com outras pessoas. O valor da honra, enquanto dignitas humana, é mais importante que qualquer outro e transige menos facilmente com os demais em sede de ponderação de interesses.

III – Perante a gravidade da situação, a condenação do R. no pagamento à A. de 10.000 € representa, atento o disposto no artigo 496º, nº 1 e 3, do Código Civil, aquele quid mínimo que poderá ajudar a minorar todo o extenso sofrimento a que a A./Recorrida, foi, injustamente, sujeita. É que a dor de alma é, sem receios de exageros, incomensurável.

Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I.

Relatório.

AA intentou, no Tribunal Cível da Comarca de Almada, acção ordinária contra BB, pedindo a sua condenação no pagamento total de 18.898,56 €, a título de indemnização por danos patrimoniais sofridos (danos emergentes e lucros cessantes) e de 15.000, como compensação dos danos não patrimoniais sofridos, com a alegação de que o R., pai de uma sua aluna, a atingiu na sua honra e consideração, durante uma reunião na Escola onde é professora.

O R. contestou, pugnando pela sua total absolvição, e, em reconvenção, pediu a condenação da A. no pagamento de 5.000 €, por danos não patrimoniais, e de 892,04 €, respeitante a despesas médicas motivadas por problemas de saúde derivadas do processo-crime que a A. lhe instaurou.

A A. replicou.

Em sede de saneador, o pedido reconvencional não foi admitido, o que motivou, por parte do R., recurso de agravo.

A acção seguiu, depois, a sua normal tramitação até julgamento e, findo este, foi proferida sentença a julgar a acção parcialmente procedente, com a condenação do R. no pagamento à A. de 10.000 €, a título de indemnização por danos não patrimoniais sofridos.

Em vão, apelou o R. para o Tribunal da Relação de Lisboa que, não só confirmou a sentença, como, também, negou provimento ao agravo, por ele, oportunamente, interposto.

Continuando irresignado, pede, ora, revista, a coberto da seguinte síntese conclusiva com que rematou a minuta apresentada: – Os factos apurados na presente acção não constituem fundamento para o pagamento de uma indemnização.

– Efectivamente a gravidade do dano deve medir-se por um padrão objectivo e não à luz de factores subjectivos.

– Devendo os mesmos danos constituir uma consequência normal, típica e provável dos actos praticados.

– Uma determinada acção deve ser considerada como causa de um prejuízo se a mesma se mostrar, face à experiência comum, como adequada à produção do prejuízo ou com fortes possibilidades de o causar.

– Tal análise deve ser feita da perspectiva do homem normal colocado na mesma posição.

– Entende o Recorrente que no caso sub-judice não era previsível que as suas palavras desencadeassem um processo contínuo de sofrimento, stress e tristeza além do sentimento de desvalorização pessoal e da dignidade e reputação da Recorrida.

– Aquelas palavras foram proferidas numa reunião com um pai de uma aluna preocupado e protector – o ora Recorrente.

– Devendo, assim, ser levadas à conta do nervosismo e tensão do Recorrente que, lembre-se, tinha pedido a reunião em virtude da sua preocupação com o desempenho da Recorrida, enquanto professora da sua filha.

– Igualmente a circunstância de as declarações terem sido proferidas na presença de colegas da Recorrida não constitui facto que agrave os danos da Recorrida já que aqueles não consideraram, com certeza, que aquelas declarações, proferidas em momento de tensão, manchavam a dignidade e reputação daquela.

– A Recorrida, aliás, colaborou com uma empresa de projectos e elaborou um estudo de avaliação para uma moradia o que, além do seu trabalho como professora, demonstra não estar assim tão afectada pelas declarações do Recorrente.

– Deve assim considerar-se que só pela introdução de factores subjectivos de sensibilidade requintada ou exacerbada se podem considerar como graves os eventos recorridos.

– As consequências de tais eventos, em boa verdade, devem mais ser consideradas como incómodos ou contrariedades do que verdadeiros danos não sendo, assim, indemnizáveis.

– E ainda que assim não se considere, deve, contudo, o montante indemnizatório fixado ser considerado como manifestamente exagerado.

– Com base em critérios de equidade, a que o Tribunal deve obedecer, a fixação de uma indemnização de € 10 000,00 é uma sanção demasiado gravosa e exige do ora Recorrente um esforço financeiro exagerado pelo que não deve ser aceite.

– O acórdão recorrido violou, assim, o artigo 496º, do Código Civil.

A Parte recorrida contra-alegou, em defesa da manutenção do acórdão recorrido.

II.

As instâncias deram como provados os seguintes factos: – O R. é pai de CC, a qual, enquanto aluna da A., frequentou o 12° ano, na Escola Secundária ..........., em Almada, durante o ano lectivo de 2000/2001.

– No dia 7 de Março de 2003, realizou-se uma reunião, na qual estiveram presentes a A., o R., a filha deste, CC, o Director de Turma, professor DD e a Vice-Presidente do Conselho Executivo, professora EE.

– A A. apresentou queixa crime contra o R., processo que correu termos no 2º Juízo Criminal, com o nº 440/01.8TAALM, e no qual o mesmo foi pronunciado como autor material de um crime de injúria agravada, p. e p., pelos artigos 181°, nº 1 e 184°, com referência ao artigo 132°, nº 2, alínea h), todos do Código Penal.

– Na reunião de 7 de Março de 2001, o R., pelo menos, fez referência ao mau desempenho da A., enquanto docente da disciplina de História da Arte.

– Por carta de 8 de Março de 2001, que o R. endereçou ao Presidente do Conselho Pedagógico da Escola Secundária Anselmo de Andrade, aquele chamava a atenção para a falta de profissionalismo da A. e para a forma como esta tratava a sua filha.

– Por sentença transitada em julgado, no dia 13.07.2004, o R. foi condenado no âmbito do processo referido, pela prática de um crime de injúrias agravadas, p. e p., pelos artigos 181 °, nº 1 e 184°, do Código Penal.

– A A. é professora, de História da Artes e Oficina de Artes, do quadro de nomeação definitiva da Escola Secundária Anselmo de Andrade, em Almada.

– No 1º trimestre do ano lectivo de 2000/2001, a A. faltou onze vezes por ter fracturado a perna.

– Na sequência das faltas da A., o R. solicitou à Escola a realização de uma reunião, a pretexto de obter esclarecimentos, designadamente sobre a assiduidade da A..

– Durante a reunião aludida, o R. declarou que a A. mandava “bocas nas aulas à aluna CC”.

– O R. disse que a A. terminava as aulas “dez minutos antes do toque”.

– E que pedia aos alunos para dizerem aos funcionários que estavam a sair de um teste.

– Nessa reunião o R. disse que a A., na véspera dos testes, informava...

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