Acórdão nº 1277/08.9TBCBR.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 25 de Março de 2010
Magistrado Responsável | SOUSA LEITE |
Data da Resolução | 25 de Março de 2010 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA Sumário : I - Por ser difícil, se não impossível, fazer a prova da posse em nome próprio, que não seja coincidente com a prova do direito aparente, o n.º 2 do art. 1252.º do CC, tal como o fazia o art. 481.º, § 1.º, do Código de Seabra, dispõe que ”em caso de dúvida, presume-se a posse naquele que exerce o poder de facto”.
II - Provada a prática, pelos embargantes, de actos que integram o corpus possessório correspondente à titularidade de um direito de propriedade sobre o bem relativamente ao qual são exercidos e, no que concerne ao animus possidendi, tendo recebido resposta negativa a pergunta, formulada na base instrutória, sobre se os embargantes, ao praticarem tais actos, se encontravam “convictos de que a garagem lhes pertencia”, atenta a presunção legal de que gozavam os embargantes, impendia sobre os embargados a prova de que a actuação daqueles se exercia no âmbito de uma situação de mera detenção ou posse precária do imóvel em causa, v.g.
como arrendatários, comodatários ou depositários – arts. 344.º, n.º 1, 350.º e 1253.º do CC –, o que, todavia, se não mostra provado, já que nem sequer foi alegado pela embargada/exequente, pelo que, perante tal estado de dúvida sobre o elemento psicológico da posse, terá de funcionar, na sua plenitude, a aludida presunção, cuja aplicação, por constituir matéria de direito, se não mostra vedada ao STJ – arts. 721.º, n.º 2, 1.ª parte, e 729.º, n.º 1, do CPC.
III - Não sendo titulada a posse dos embargantes sobre a garagem, uma vez que se não mostra fundada em qualquer negócio jurídico abstractamente idóneo para a transferência da propriedade ou de um qualquer direito real de fruição sobre a mesma – art. 1259.º do CC –, tal posse presume-se de má fé, o que, aliado à inexistência do respectivo registo, conduz a que a usucapião só se verifique após o termo do prazo de 20 anos – art. 1260.º, n.º 2, e 1296.º do CC.
Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I – AA e mulher BB vieram deduzir embargos de terceiro por apenso à execução para entrega de coisa certa em que é exequente CC e executados DD e marido EE, alegando, para tal, que tiveram conhecimento de que, no processo principal, foi ordenada a penhora da fracção designada pelas letras “AH” do prédio constituído em propriedade horizontal inscrito na matriz urbana da freguesia de Sé Nova, em Coimbra, sob o art. 2127º e descrito na respectiva conservatória sob o n.º 999/19830708, fracção essa, que, apesar de formalmente adquirida pelos executados, por escritura pública lavrada a 03/04/1985, desde 1983, data em que negociaram com a sociedade FF, Ldª a sua compra através do pagamento do respectivo preço, vem sendo utilizada como garagem pelos embargantes, que detêm a sua posse na convicção da mesma ser sua propriedade, à vista de toda a gente, em especial dos vizinhos, sem qualquer tipo de oposição, pelo que, até por usucapião a adquiriram, embora a escritura que formalizou a aquisição da mesma a tivesse identificado como fracção “AG”.
Alegam, também, que o título executivo que fundamenta a execução é um título inexequível perante as decisões proferidas em outros processos cuja identificação enumeram.
Perante tais factos vieram formular os seguintes pedidos: - Ser declarada extinta a execução e revogada a decisão que ordenou a entrega das fracções; caso assim se não entenda: - Serem os embargantes declarados únicos e exclusivos proprietários da garagem a que corresponde a fracção “AH”, por a terem efectivamente adquirido, pago o preço e, ainda, por se verificarem os pressupostos que lhes permite adquiri-la também por usucapião; - Ser condenada a exequente a reconhecer e a respeitar o direito de propriedade sobre a fracção “AH”, que os ora embargantes reclamam ser titulares; - Ser ordenado o cancelamento de todo e qualquer registo contraditório com o direito de propriedade reconhecido aos embargantes sobre a referida fracção “AH”.
Após audição das testemunhas arroladas pelos embargantes e de proferido despacho a receber os embargos, a exequente veio contestar, alegando que aqueles, por escritura pública de 20/09/1991, adquiriram a garagem a que corresponde a fracção “AG”, tendo, por lapso só detectado em 2002, sido entregue àqueles a garagem a que corresponde a fracção “AH”, pelo que nunca os mesmos tiveram a posse relativamente a esta, que foi vendida aos executados, por escritura pública de 03/04/1987, pela sociedade FF.
No despacho saneador foi declarada...
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