Acórdão nº 0105/10 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 18 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelADÉRITO SANTOS
Data da Resolução18 de Março de 2010
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, na Secção do Contencioso Administrativo, do Supremo Tribunal Administrativo: I.

A..., procuradora adjunta, com os sinais dos autos, vem requerer a suspensão de eficácia do acórdão do Plenário do Conselho Superior do Ministério Público (CSMP), de 22.1.2010, que, indeferindo reclamação do acórdão, de 16.11.2009, da Secção Disciplinar do mesmo CSMP, manteve a pena de inactividade, por dois anos, que à requerente foi aplicada, na sequência de processo disciplinar, por aquela Secção.

Alega, em síntese, que o referido acto punitivo enferma de diversos vícios, geradores da respectiva ilegalidade, e que a imediata execução desse mesmo acto, pela afectação da sua imagem pessoal e profissional, implicaria degradação das respectivas condições psicológicas, para além de deixar o respectivo agregado familiar dependente, apenas, do rendimento do trabalho do marido, pondo em risco a satisfação das necessidades elementares desse agregado, de modo que a recusa da pedida suspensão de eficácia lhe traria prejuízos irreparáveis, ao passo que o deferimento do pedido de suspensão não determina «o mais leve dano para o interesse público, muito pelo contrário», pois que, sendo beneficiado pela continuação do regular exercício funcional da requerente, o mesmo interesse público, em caso de não suspensão de eficácia da deliberação impugnada e de eventual anulação dessa deliberação, poderia vir a ser lesado, ante a obrigação de reposição das quantias deixadas de auferir pela requerente, sem contrapartida desta, através do exercício de funções.

O CSMP, na oposição que deduziu, defendeu que o acto punitivo é inteiramente legal, sendo manifesta a improcedência do pedido impugnatório, e que não ocorrem os pressupostos de cuja verificação a lei faz depender a possibilidade de ser determinada a respectiva suspensão de eficácia. Sustenta, ainda, que a lesão, invocada pela requerente, na respectiva imagem e prestígio profissional não é consequência da execução daquele acto, antes resulta da dimensão pública do comportamento ilícito da própria requerente, traduzido na prática de crime doloso, a cuja perseguição, estatutariamente, está vinculada. E acrescenta que, sendo previsível, desde a instauração do processo disciplinar, a aplicação de pena do tipo da que foi imposta por aquele mesmo acto, já decorreu, desde então, tempo bastante para que a requerente, com elementar prudência, tivesse acautelado as consequências decorrentes da temporária privação dos respectivos vencimentos. Para além disso, defende o mesmo CSMP que, tendo o acto punitivo sido determinado por comportamento da requerente que depreciou, profundamente, a imagem e prestígio da magistratura, dos serviços do Ministério Público e da administração da justiça, a suspensão da execução desse acto causaria grave lesão no interesse público, de alcance muito superior ao prejuízo que, para o interesse particular da requerente, poderá resultar do indeferimento do pedido por esta formulado.

Cumpre decidir.

II.

Com interesse para a decisão a proferir, consideramos assentes os seguintes factos: 1. A requerente é magistrada do Ministério Público, com a categoria de procurador adjunto, estando colocada, desde 1998, na comarca de ... .

  1. Com base em certidão remetida pela Procuradoria Geral Distrital do Porto ao Presidente do CSMP, foi determinada a instauração de inquérito com vista ao apuramento da responsabilidade disciplinar da requerente pelos factos que deram origem ao inquérito/crime nº.../2006, da Procuradoria Geral Distrital do Porto (NUIPC .../...), onde lhe era imputada a autoria de um crime de furto simples, previsto no artigo 204, nº 1, do Código Penal, e que terminou por desistência da queixa da sociedade ofendida.

  2. Por despacho de 22.2.2007, foi aquele inquérito convertido em processo disciplinar.

  3. Terminada a produção de prova, o Instrutor desse processo, em 16.5.2007, elaborou relatório final, no qual propôs a aplicação da pena de inactividade por um ano, suspensa na sua execução por dois anos, tendo dado como assentes os seguintes factos: a) No dia 13 de Outubro de 2006, pelas 13h e 40m, tendo a Exma. Procuradora-Adjunta Licenciada A..., colocada no Tribunal Judicial da comarca de ..., entrado como cliente no estabelecimento comercial de pronto a vestir, denominado B..., sito na Rua ..., nºs .../..., na cidade do Porto, retirou das montras de venda ao público uma gabardina da marca B..., de cor preta, no valor de 69,90 € e uma camisa daquela mesma marca multicolorida, no valor de 24,90 €, artigos estes de senhora e destinados à venda, colocando-os num braço e com eles se dirigiu, em seguida, para a saída, transpondo a linha dos dispositivos de alarme aí instalados sem efectuar o respectivo pagamento; b) Atingindo o exterior do estabelecimento e estando já a cerca de um metro para além daquela linha dos dispositivos de alarme, na posse daqueles mesmos artigos, que estavam desalarmados e transportava à vista num dos braços com manifesta intenção de os integrar no seu património, foi interpelada pela funcionária do estabelecimento, C..., que lhe pediu para a acompanhar para dentro das instalações, ao que ela aquiesceu, tendo, na dependência aonde foi conduzida, confessado a chorar àquela funcionária ter-se daqueles artigos, que lhe foram retirados, apoderado e dito que era a primeira vez; c) A referida...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT