Acórdão nº 865/05.0TMLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 11 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelMARIA DOS PRAZERES PIZARRO BELEZA
Data da Resolução11 de Março de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: AGRAVO Decisão: NEGADO PROVIMENTO Legislação Estrangeira: CÓDIGO CIVIL, ARTIGO 364º CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, ARTIGOS 194º, 498º, 499º, 663º, 675º, 690º-A, 712º, 729º, 1411º, Nº 2 LEI Nº 147/99, DE 1 DE SETEMBRO DECRETO-LEI Nº 39/95, DE 15 DE FEVEREIRO Jurisprudência Nacional: 8 DE DEZEMBRO DE 2008, WWW.DGSI.PT, PROC. 07B3434 – 21 DE MAIO DE 2009, WWW.DGSI.PT, PROC. Nº 08B1466 – 10 DE SETEMBRO DE 2009, WWW.DGSI.PT, PROC. Nº 374/09.8YFLSB – 20 DE JANEIRO DE 2010, WWW.DGSI.PT, PROC. Nº 09B195 Sumário : 1. É insindicável pelo Supremo Tribunal de Justiça o exercício dos poderes que os nºs 3 e 4 do artigo 712º conferem à 2ª Instância (renovação dos meios de prova e repetição do julgamento em 1ª Instância (nº 6 do artigo 712º).

  1. A forma como o Tribunal da Relação utiliza os poderes de reapreciação da decisão de facto da 1ª instância que lhe são conferidos pelos nºs 1 e 2 do artigo 712º do Código de Processo Civil é controlável no recurso de revista.

  2. A afirmação, pela Relação, de que determinados factos foram correctamente julgados não equivale a confirmar esse julgamento apenas porque a conclusão da 1ª Instância é suportada pelo confronto entre a decisão e as provas. Se essa afirmação é acompanhada da justificação retirada dos meios de prova, ela significa uma concordância de conclusão, naturalmente fruto de uma ponderação própria.

  3. O processo de promoção e protecção comporta desde o início a possibilidade de nele vir a ser decretada a medida de confiança com vista a futura adopção, prevista na al. g) do nº 1 do artigo 35º da Lei nº 147/99; tendo sido instaurado, posteriormente ao seu início, um processo de confiança judicial com vista à adopção, a questão da pendência simultânea dos dois processos não se coloca apenas desde o momento em que a 1ª Instância a decretou, mas desde a instauração do segundo processo.

  4. A excepção de litispendência não corresponde a um direito, que o réu citado para uma segunda acção tenha, de evitar o segundo julgamento de uma mesma causa. Tal como o caso julgado, a excepção de litispendência tem a função de evitar que um tribunal se veja colocado na situação de ter de repetir ou de contradizer uma decisão anterior; independentemente de mais considerações, sempre seria uma decisão inútil, por prevalecer a que primeiro transitasse (nº 1 do artigo 675º do Código de Processo Civil).

  5. Em regra, a litispendência deve ser declarada na acção em que o réu foi citado em segundo lugar porque a acção só é eficaz em relação ao réu após a citação.

  6. Os processos de promoção e protecção, previstos na Lei nº 147/99, e o processo tutelar cível de confiança judicial, regulado na OTM, não se podem tratar como processos de parte; são processos de jurisdição voluntária, nos quais está em causa o interesse do menor a que respeitem, subordinando-se a esse interesse principal os que eventualmente sejam encabeçados pelos outros intervenientes (os respectivos familiares, por exemplo).

  7. É assim a data da instauração de cada um que releva para o efeito de determinar a prioridade da pendência.

  8. Isso não significa que o contraditório não tenha de ser assegurado (artigo 104º da Lei nº 147/99).

    Decisão Texto Integral: Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça: 1. Por acórdão do Tribunal de Família e Menores de Lisboa de 3 de Novembro de 2008, de fls. 1277, proferido no âmbito de um processo judicial de promoção e protecção das crianças e jovens em perigo desencadeado por iniciativa do Ministério Público em 4 de Maio de 2005, foi decidido “aplicar a favor dos menores AA, nascida no dia 20/12/95, BB, nascido no dia 29/10/98, CC, nascido no dia 10/1/01 e DD, nascida no dia 28/9/02, a medida de promoção e protecção de confiança com vista a futura adopção, prevista no artº 35º, nº 1, alínea g) da L.P.C.J.P., mantendo-se os menores sob a guarda da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa” (na qual se encontravam na sequência de ter sido já decretada no mesmo processo, em 21 de Junho de 2005, a medida de acolhimento institucional).

    Foi ainda determinada a inibição do exercício do poder paternal, a cessação das visitas aos menores por parte da família natural, “em conformidade com o disposto nos artºs 1978º-A do Código Civil e 62º-A, nº 2 in fine da L.P.C.J.P.”, e nomeado curador o Provedor da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, de acordo com o disposto no nº 1 do artigo 167º do Decreto-Lei nº 314/78, de 27 de Outubro – Organização Tutelar de Menores – e no citado artigo 62º-A.

    A mãe, EE, e o tio, FF, recorreram para o Tribunal da Relação de Lisboa; e também recorreu GG, pai de DD e de BB. Todos requereram que fosse fixado efeito suspensivo ao recurso, o que foi deferido.

    Por acórdão de 25 de Junho de 2009, de fls. 1647, foi negado provimento a ambos os recursos.

  9. Novamente recorreram EE e FF, agora para o Supremo Tribunal da Justiça; o recurso foi admitido, com efeito suspensivo.

    Nas alegações que apresentaram, formularam as seguintes conclusões: 1. O presente recurso versa sobre matéria de direito, por violação da lei substantiva, por erro na interpretação e aplicação das normas jurídicas (art. 722°/1.b) do CPC) pelo que é admissível.

  10. O Acórdão do Tribunal da Relação é nulo porque não reapreciou as provas gravadas e indicadas pelas partes o que, no caso de gravação dos depoimentos, passa sempre pela atenta audição destes, o que manifestamente não sucedeu no caso em apreço conforme resulta do teor da decisão impugnada.

  11. O Tribunal da 2ª Instancia não podia ignorar, sob pena da nulidade do Acórdão, que expressamente se invoca, a existência dos 8 CD'S, com a gravação das sessões de julgamento identificados, nomeadamente a fls.944, 945,946, 981, 982, 994, 996,997,1012,1013,1014,1015,1016,1017,1018,1045, 1046, 1072 e 1112.

  12. Entendem os recorrentes que o Tribunal de 2ª Instância ficou aquém do que lhe é legalmente exigido enquanto Tribunal de instância garante de um efectivo segundo grau de jurisdição em matéria de facto.

  13. No Acórdão recorrido, interpretou-se restritivamente a função do Tribunal de Recurso prevista no Art° 690-A n° 5 do CPC, e não foi dado adequado cumprimento ao disposto no n.º 2, 3 e 4 do art. 712° do C.P.Civil.

  14. Tribunal da Relação tem o poder-dever legal de formar a sua própria convicção, no gozo pleno do princípio da livre apreciação das provas, tal como a 1ª instância, sem estar limitado pela convicção que serviu de base à decisão recorrida, o que não ocorreu.

  15. O mecanismo legal que permite a reapreciação da prova pela 2ª instância implica necessariamente que a Relação, a partir da análise crítica das provas, crie a sua própria convicção (que pode ou não ser coincidente com a formada pelo julgador da 1ª instância), sob pena de não se mostrar viável qualquer controle da decisão proferida sobre a matéria de facto, e de se converter o 2° grau de jurisdição sobre matéria de facto numa garantia meramente virtual; 8. O recorrente impugnou, na apelação, a decisão da 1ª instância, na parte em que considerou nºs 2, 3, 4, 6, 18, 19, 21, 23, 31, 33, 38, 39, 40, 41, 42, 43 e 44, provados, por entender que os depoimentos produzidos em audiência e gravados em CD, conjugados com os documentos disponíveis, imporiam respostas diferentes.

  16. O Tribunal da Relação de Lisboa entendeu não se justificar a pretendida alteração, mantendo intocada a decisão de facto, mas fê-lo com total omissão do mecanismo legal que permite a reapreciação da prova, reapreciando os factos apenas com base em documentos, sem ouvir as gravações, rejeitando desse modo a prova e o recurso previsto no Art° 690-A nº5 do CPC, em toda a sua amplitude.

  17. Compete ao Tribunal da Relação apurar da razoabilidade da convicção formada pelo julgador, face aos elementos que lhe são facultados; mas o acórdão recorrido limitou-se a concordar com a sentença da 1ª instância, interpretando restritivamente o duplo grau de jurisdição, desvalorizando ou desconsiderando todas as testemunhas arroladas pelos recorrentes e o registo da prova.

  18. O Acórdão recorrido não apreciou criticamente nem valorou todos os factos e provas disponíveis, limitando-se a concordar com a convicção do julgador da matéria de facto em 1ª instância nos termos do Art° 713 nº 5 do CPC, o qual por sua vez, aderiu aos factos alegados pelo Ministério Publico.

  19. Não tendo procedido à requerida reapreciação da prova gravada, o acórdão recorrido violou o disposto no art. 690o-A nº 5 do CPC, pelo que deverá ser revogado, ordenando-se a baixa do processo para que a Relação reaprecie a prova produzida em relação aos pontos de facto impugnados e julgue, de novo, nos termos do Art° 731 do CPC.

  20. O Art° 712 do C. P. Civil é Inconstitucional na medida em que permite ao julgador dar por assente matéria de facto sem ouvir os depoimentos produzidos na audiência de discussão e julgamento, fazendo apelo a factos e/ou documentos que não foram analisados em audiência de discussão e julgamento e cuja censura plena só poderia levar a uma repetição total do julgamento/debate judicial em 1ª Instância ou mesmo através de renovação na 2ª Instancia nos termos do Art° 712 n° 3 do CPC.

  21. O Acórdão recorrido procura contrariar o entendimento dominante na Jurisprudência de que quando, num processo de promoção e protecção, se altera qualquer medida para a de confiança a pessoa ou a instituição para futura adopção, opera-se uma modificação objectiva da instância, o que obriga a um chamamento ao processo dos pais e familiares como se fosse o primeiro, ou seja com todas as garantias da citação.

  22. Quando nos presentes autos de processo de promoção e protecção se visou a alteração da medida de institucionalização, para a confiança para futura adopção, operou-se uma modificação objectiva da instância e impõe-se consequentemente, ex novo, o princípio do contraditório consagrado na al. i) do art. 4° da LPCJP para os actos posteriores de tal facto advenientes o que implica uma verdadeira citação dos pais biológicos para se defenderem da eventualidade de ser tomada a medida (que veio...

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