Acórdão nº 07S2886 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Fevereiro de 2008

Magistrado ResponsávelVASQUES DINIS
Data da Resolução06 de Fevereiro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1. Na presente acção especial emergente de acidente de trabalho, instaurada no Tribunal do Trabalho de Barcelos contra "AA - Companhia de Seguros, S.A" e "BB - Construções, Lda.", foi, em 16 de Fevereiro de 2004, proferida sentença que condenou as demandadas a reparar os danos sofridos pelo Autor, CC, em consequência do sinistro laboral ocorrido, no dia 22 de Fevereiro de 2001, ao serviço da segunda Ré. Esta, como principal responsável, foi condenada no pagamento de uma pensão por incapacidade permanente, de indemnizações por incapacidade temporária, em prestações agravadas, e a seguradora, subsidiariamente, em prestações normais, em função da responsabilidade transferida.

Em recurso de apelação interposto pela Ré empregadora, o Tribunal da Relação do Porto, por acórdão de 14 de Fevereiro de 2005, decidiu anular o julgamento, ordenando a sua repetição, a fim de ser esclarecido «como é que o tribunal chegou aos valores "líquidos" de "80.000$00/mês" e "8 contos/dia", dado que nos recibos de vencimento constam outros montantes, incluindo o "subsídio de deslocação", e montantes esses ilíquidos», e ser apurado «quais as despesas reais, efectuadas pelo Autor, conexionadas directamente com os "8 contos/dia", isto é, quais as despesas efectivas que eram pagas com esse dinheiro»; «quem é que pagava ao senhorio a habitação do Autor e as refeições por ele tomadas em restaurante ou por ele confeccionadas»; e «se foi com a diferença de Esc. 56.069$00 [entre o valor de Esc.: 292.680$00, constante do "recibo de vencimento", e o valor de Esc.: 236.611$00, que o Autor alegou, como retribuição global] mais o equivalente ao subsídio de alimentação, que o Autor pagou as suas despesas de alimentação e de alojamento, no mês de Janeiro de 2001».

Impugnado o aresto da Relação, pela Ré seguradora, este Supremo Tribunal, por acórdão de 17 de Dezembro de 2005, resolveu não conhecer do objecto do respectivo recurso.

Regressado o processo ao tribunal de 1.ª instância e efectuado novo julgamento, de que não resultou qualquer alteração à matéria de facto anteriormente fixada, foi, em 13 de Junho de 2006, proferida sentença que, tal como a prolatada após o primeiro julgamento, condenou as demandadas nos seguintes termos:

  1. A empregadora, como principal responsável, no pagamento: - Da pensão anual e vitalícia no valor de € 5.427,44, devida desde 18 de Junho de 2002, com as actualizações operadas, a partir do dia 1 de Dezembro daquele ano e dos seguintes, respectivamente, para € 5.535,99 (2002), € 5.674,39 (2003), € 5.804,90 (2004) e € 5.938,41 (2005); - Das indemnizações, por incapacidade temporária absoluta, no valor de € 15.344,37, e por incapacidade temporária parcial, no valor de € 789,55; - De juros de mora sobre as respectivas prestações, desde o vencimento até integral pagamento.

  2. A seguradora, a título subsidiário, no pagamento: - Do capital de remição da pensão anual e vitalícia do valor de € 1.222,50, devida desde 18 de Junho de 2002; - Das indemnizações, por incapacidade temporária absoluta, no valor de € 3.456,23, e por incapacidade temporária parcial, no valor de € 214,52; - De juros de mora sobre as respectivas prestações, desde o vencimento até integral pagamento.

    Para assim decidir, no que respeita aos valores estabelecidos na condenação da empregadora, a sentença considerou, entre o mais, que, à data do acidente, o Autor auferia um salário anual de € 17.876,94 [(€ 399,04 X 14) + (€ 39,9 X 22 X 14)], dado que se provou que, naquela data, "auferia cerca de 80.000$00 líquidos mensais, acrescidos de uma importância diária de cerca de 8 contos líquidos que as partes denominaram ajudas de custo", sendo que, por um lado, o pagamento do último montante tinha carácter regular e periódico e, por outro lado, "a entidade patronal não logrou infirmar, como lhe competia, que tais quantias não integravam a retribuição".

    Inconformada, por não aceitar a inclusão da importância de Esc.: 8.000$00 no cálculo da pensão e das indemnizações, a Ré empregadora interpôs recurso de apelação, ao qual a Relação do Porto, por acórdão de 26 de Fevereiro de 2007, negou provimento, confirmando integralmente a sentença.

    1. De tal acórdão, vem a mesma Ré pedir revista, terminando a respectiva alegação com as conclusões assim redigidas: 1 - Não tendo sido obtidos, como efectivamente não foram, e é reconhecido, os esclarecimentos solicitados pelo douto Acórdão da Relação do Porto de 14/02/05, não poderia o Mmo. Juiz decidir como se todos os esclarecimentos tivessem sido obtidos.

      2 - Realmente, a douta sentença da 1.ª instância proferida após o segundo julgamento é rigorosamente igual à primeira.

      3 - O artigo 265.º do Código do Trabalho impondo e/ou permitindo o dever de fixar a retribuição do trabalhador, quando as partes o não fizerem, impõe condicionalismos para que tal aconteça; 4 - Concretamente, a fixação deve ter em conta a prática na empresa e uso no sector ou locais, o que in casu não aconteceu; 5 - De facto, em parte alguma do Doutro Acórdão recorrido, como, aliás, da douta sentença da 1.ª instância se faz a mais pequena referência à prática na empresa e/ou aos usos no sector ou locais.

      6 - Assim, a fixação da retribuição do recorrido encontra-se ferida de ilegalidade por não respeitar os critérios de que a lei faz depender tal processologia, quando as partes não fornecerem a retribuição, como aconteceu no caso dos Autos.

      7 - Não tendo o Mmo. Juiz obtido os esclarecimentos necessários para fixar a retribuição do recorrido, como foi ordenado pelo Acórdão da Relação do Porto, deveria ter relegado o apuramento daquela retribuição para execução da sentença, nos termos do disposto no art.º 661.º n.º 2 do Cód. Proc. Civil, aqui aplicável ex vi art.º 10.º, n.º 2, alínea a), do Cód. Proc. Trabalho; 8 - Realmente é este o processo próprio para definir o direito do recorrido, sem penalizar injusta e ilegalmente a recorrente, uma vez que nem um nem outra forneceram dados suficientes para o efeito; 9 - Sendo certo que a recorrente ilidiu a presunção impendente sobre si quando provou que os trabalhadores tomaram de arrendamento uma habitação e tomavam as refeições num restaurante ou confeccionavam-nas eles próprios; 10 - Porém, a douta sentença não teve em conta aquela matéria provada e decidiu como se não tivesse sido provada.

      11 - Sendo verdade que não logrou provar quanto os trabalhadores pagavam pelo alojamento e pelas refeições que tomavam no restaurante ou os próprios confeccionavam, também é certo que tal prova lhe não pertencia por lhe serem actos estranhos; 12 - Sendo ainda certo que o facto de o recorrido ter vindo dizer, quando solicitado para o segundo julgamento, contrariando anteriores afirmações, que realmente gastava diariamente a verba de € 10,00 em alimentação, ainda que não o lograsse provar, comprova que realmente eram os trabalhadores quem pagava, pelo menos, a sua alimentação, na qual gastavam aquela ou outra importância; 13 - Existe manifesta e flagrante incongruência entre o esclarecimento prestado pelo Mmo. Juiz da 1.ª Instância, após o segundo julgamento, de que a convicção sobre o vencimento do sinistrado resultou do depoimento das testemunhas Ângelo Vilas Boas Rodrigues e António Carlos Sousa Real que declararam, no primeiro julgamento, que os 80.000$00 correspondiam a remuneração base e os 8.000$00 diários ao facto de se encontrarem deslocados e a própria decisão.

      14 - De facto, apesar de aquelas testemunhas mencionarem verbas precisas, o Mmo. Juiz deu como provado que o vencimento do recorrido era de "cerca de" 80.000$00, acrescido de ajudas de custo diárias de "cerca de" 8.000$00 líquidos, como consta da alínea N) da matéria factual provada.

      15 - Assim, transformando uma fundamentação certa em verbas incertas para no final reconverter em importâncias certas, decidindo em contradição com a matéria provada.

      16 - Sendo certo...

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